Páginas

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O FUNDAMENTAL EM UMA NOVELA

Por Denis Pessoa

No Brasil, novelas sempre tiveram espaço entre as conversas do dia-a-dia, fosse com parentes, amigos, ou colegas de trabalho. Anos atrás, elas moviam grande parte do público, que, em massa, não conseguia falar sobre outra coisa, como as maldades de Maria de Fátima, a identidade do assassino de Odete Roitman, ou sobre como terminaria o embate entre Clara e Ana em Barriga de Aluguel, ou a luta do bem contra o mal encarnado pelas gêmeas Rute e Raquel, de Mulheres de Areia. A novela parecia um formato sólido a ponto de ser seguro e eterno, que emocionava e divertia  todas as camadas da população, em todas as suas classes sociais e faixas etárias.
Elenco de A Vida da Gente em cena
           

Porém, com o passar dos anos, muita coisa mudou. A novela tornou-se um produto muito mais comercial, o público, mais exigente, – ou menos, de acordo com algumas opiniões – e a absorção de cultura mais ágil. Tudo passou a ser descartável, e com a entrada permanente internet na vida das pessoas, e das novas possibilidades que vieram com ela, como downloads de filmes e seriados, a novela, de repente pareceu perder sua força, e seu público, de certa forma, ficou disperso entre tantas opções de entretenimento. Ao menos, aparentemente. Tornou-se difícil por um momento encontrar pessoas dispostas a conversar sobre o assunto. Não somente para discorrer sobre o que acontecera no capítulo anterior, mas para falar seriamente a respeito, avaliar a obra como um todo, e não somente em sua unidade. Novela, de uma hora pra outra, passou de popular à popularesca, e não parecia digno de qualquer pessoa que se considerasse razoavelmente culta falar sobre este assunto com outras pessoas. O mesmo preconceito que acompanha a novela, desde o seu surgimento. Pela primeira vez em muito tempo, a estrutura da telenovela chegou a ser ameaçada, e muitos cogitaram, em um futuro próximo, o fim do formato.

João Emanuel Carneiro, novelista

            Então, essas pessoas, então, de repente espalhadas pelo Brasil, que costumavam se reunir em qualquer lugar para falar sobre este assunto, ainda tão apaixonante, migraram para as recém-lançadas redes sociais, na época, o Orkut, que pouco dinâmico para nossa cultura atual, era, então, a melhor opção para grandes discussões, onde era possível dar opiniões, emitir julgamentos, discutir com grande embasamento, ou não, a respeito do tema. Nos dias atuais, algumas comunidades ainda resistem à migração em massa do Orkut para o Facebook e Twitter, onde o fórum não é uma opção, e todas as opiniões precisam ser sintéticas. Qualquer coisa que possua mais de 140 caracteres, dificilmente será lido. Temos pressa, sempre.
            Porém, uma destas redes em especial, o Twitter, as pessoas parecem reviver aquela época onde era possível ver qualquer pessoa falando de novela a qualquer momento, em qualquer lugar. Hoje, em tempo real, podemos fazer comentários sobre o figurino de um personagem, sobre a música chata da abertura, sobre o gancho surpreendente, ou sobre o ator canastrão. Tudo em tempo real. E com isso, voltaram também os “especialistas” em novelas, aqueles que, de mera opinião, passam a exprimir, sem perceber, ultimatos e pensamentos arbitrários.
É como falar sobre futebol. Existe sempre ator melhor para determinado papel, existe sempre gancho melhor, existe sempre direção melhor. Isso não é condenável, pois todos somos assim. Gostamos não apenas de opinar, mas sim de impor, de nos provar corretos. Mas em se tratando de novela (ou de futebol), será que existe mesmo o certo?
            Uma novela é um mecanismo complexo demais para ser separado em pequenas partes. Ou seja, depende muito da parte em voga para podermos avaliar se esta prejudica o todo ou não. Um ator com mau desempenho dificilmente prejudicará os colegas, porém, um texto mal escrito, ou uma direção relapsa provavelmente afastarão a audiência rapidamente. Mas até isto é questão de opinião.
            E entre uma opinião e outra, surgem pequenas indiretas, calorosas discussões, quando os pensamentos divergentes não fazem com que as pessoas partam para as vias de fato, trocando agressões sem sentido em função de algo que serve para nos entreter, e nos divertir. De todos os “noveleiros” que conheci, pude perceber inúmeras diferenças no que estes consideram relevante ou irrelevante.

Aqui, peço licença para me usar como exemplo. Em uma novela, o mais importante para mim é o texto. Quando me refiro a texto, digo que pode ser uma novela que conte uma história aquém de minhas expectativas, porém, se ela possui um bom texto, eu passo a encará-la com outros olhos. Um exemplo disso é a novela Tempos Modernos. Era estranha, para dizer o mínimo, no entanto, possuía diálogos, e alguns personagens tão interessantes, que eu não podia deixar de acompanhar. Mas ainda assim, não considerava a novela boa. Por quê? Porque mesmo com um bom texto, faltavam inúmeras coisas para mim: um enredo que fizesse sentido, bons cenários, bons figurinos, personagens agradáveis. A proposta futurista da trama não combinava com o aspecto antiquado do Centro de São Paulo que a novela retratava.
            Quando eu assisto a um capítulo de novela, não presto muita atenção em determinado ator. Costumo olhar através dele, e enxergar o texto que foi escrito para ele, portanto, independente do intérprete, ou da novela que estou assistindo, gosto de ver o que foi escrito por seu autor, imaginar as razões disso, e também imaginar como seria a novela, caso tivesse sido escrito por mim.
            Um outro detalhe primordial para mim: gosto de novelas longas, assim como livros longos. Novelas (as que eu gosto, claro), quanto mais longas, para mim, melhor. Já, sei de muitas pessoas que preferem as tramas mais curtas.
            Muita gente não pensa como eu, o que é ótimo. Converso com muitas pessoas que priorizam os romances nas novelas. Outras dão grande importância ao que eu considero detalhe, como abertura, índices de audiência, ganchos, publicidade, trilha sonora, e uma infinidade de outras coisas, que chamam completamente a atenção de alguns, e são sumariamente ignoradas por outras.
            Porém, todas são fundamentais. Se dão certo em conjunto, tanto melhor. Porém, existe um consenso – pelo menos nisso – em que isso tem estado cada vez mais difícil. Agradar a todos, então, é impossível.
            No fim das contas, todos estes elementos devem ser levados em conta. Novela precisa ser boa de se ver, e boa de se ouvir. Não pode existir dissonância entre todos estes fatores. Fatores estes, que dão às novelas as suas características únicas.

Trilhas sonoras: indispensáveis

            Uma boa história, seja ela uma comédia, ação, drama ou suspense, tem de ser bem contada, dentro de suas características e limitações. Precisa de uma boa direção, que mantenha o elenco em sintonia. Não precisamos apenas de rostos conhecidos, mas também de bons atores, em sua essência, sem ignorar a necessidade da beleza. Ou seja, condenar artistas jovens por serem bonitos e pouco talentosos soa um despropósito. Ninguém começa experiente. Alguns melhoram com o tempo, outros não. Como em qualquer trabalho. Precisamos sim, de ganchos, que nos motivem a assistir a novela no dia seguinte. Precisamos de audiência, não necessariamente como um norte, que determine se a novela é boa ou ruim, mas para saber se nosso investimento de tempo está sendo válido, para sentir a temperatura da novela. Os números não necessariamente ditam se a novela é boa ou ruim, mas alerta ao público sobre os problemas existentes na obra. O texto dita o ritmo e os diálogos que iremos escutar durante meses. E todo corpo precisa de seus órgãos trabalhando em conjunto.
            Novela perfeita não existe, mas, com muito trabalho em equipe, muitas foram e são tão boas, que os erros tornam-se perdoáveis.
            Encerro este pedindo a vocês que contem o que consideram fundamental em uma novela. Pergunto, também, qual novela, para vocês, chegou o mais perto possível de ser a sua novela perfeita.
            Até a próxima!

12 comentários:

  1. "Vale Tudo" e "Cambalacho", pra mim, são as mais perfeitas. Temáticas bem propícias para a época em que foram ao ar. Em Vale Tudo tudo deu certo: elenco, tramas, figurinos, trilhas, personagens fortes. A figura de Odete Roitman é imbatível.
    E Cambalacho tem a coisa do politicamente incorreto. Uma grande inovação e subversão: uma novela onde os 4 protagonistas sao cambalacheiros, incluindo um advogado mau caráter. Sem falar em Tina Pepper e Lili Bolero, as figuras cômicas mais interessantes da teledramaturgia. Enfim, poderia falar sobre essas duas novelas páginas e páginas...rs

    Abraço!

    ResponderExcluir
  2. Vale Tudo

    - ótima história (as trajetórias de Raquel e Fátima são apaixonantes, uma para o bem, outra para o mal);

    - ótimo desenvolvimento da narrativa; a história não parava nunca;

    - crítica e merchandising social bem inseridos, não eram gratuitos;

    - ganchos;

    - personagens fortes, carismáticos, humanos;

    - narrativa moderna, com cenas e diálogos rápidos (bem entremeados com cenas mais densas e longas);

    - duas trilhas sonoras de boas pra cima;

    ResponderExcluir
  3. Bom eu não vi novelas dos anos 80, então as minhas favoritas são:
    Anos 90: A Próxima Vítima
    Anos 2000: Laços de Família, Senhora do Destinho e A Favorita

    A Próxima Vítima, perfeita, tudo funcionou.

    Laços é uma trama redondinha, ótimos diálogos, poucos personagens, todos com função e grandes cenas. Trama que pega pela emoção!

    Senhora do Destinho foi maravilhosa, apesar de bem popular a novela encantou e teve cenas antológicas.

    A Favorita, foi a última ótima novela, mas não foi perfeita, alguns núcleos deixaram a desejar. Mas o central imperou, assim como Lília Cabral.

    Gosto de novelas ágeis, com grandes acontecimentos, ou no mínimo emocionantes. Com ganchos sempre, não só no fim do capítulo,mas também nos intervalos.

    Detesto novelas paradas como as do Benedito.

    Destaco também Cobras e Lagartos!

    Denis, que excelente texto!!! PARABÉNS!

    ResponderExcluir
  4. Pra mim, a novela que eu mais amei assistir e que não perdia um só capítulo ( aliás, eu tenho ela toda gravada) foi "A VIAGEM". Nossa, eu lembro que sentava diante da TV e esquecia do mundo cá fora. Isto nunca havia acontecido comigo antes. Amo a Torloni até hoje pela maravilhosa Diná que ela criou!...De lá pra cá houve, sim, outras novelas qeu eu gostei bastante: Anjo-Mal; Laços de Família; Mulheres Apaixonadas, Senhora do Destino e a Favorita, essa última,pra mim, foi a melhor, tirando A VIAGEM. Tenho certeza de qeu se naquele ano em que ela foi ao ar já existisse o premio "EMMY", ela teria vencio. Infelizmente, este prêmio só foi instituído no ano seguinte!...Atualmente, eu acho que a melhor novela que está no ar é A VIDA DA GENTE! Esta, sim, uma novela que beira a perfeição. É um poema em forma de folhetim! Maravilhosa....Parabéns à autora e a todos da produção! Há tempos eu não sentava pra assitir uma novela do início ao fim! Linda!

    ResponderExcluir
  5. O que eu gosto numa novela, mesmo não gostando da novela em si é como o autor consegue lidar ainda com o folhetim, ora estampado como em Mulheres de Areia, Selva de Pedra ou escondidos como agora em A Vida da gente ou nas novelas cotidianas do Maneco ou até nas mais modernas como A Favorita, em que tinha o filho perdido, a rivalidade das amigas.Ainda isso é o que me liga às histórias, por isso é difícil eu não gostar de pelo menos alguma coisa em uma novela, por mais que eu as critique.
    Boa ideia pra texto, Dênis.

    ResponderExcluir
  6. Oi, pessoal!

    Realmente, concordo que muitas novelas citadas atingiram essa "quase" perfeição, como Vale Tudo, e A Viagem. As demais eu não acompanhei. Assisto A Vida da Gente, e gosto muito. A única coisa que não me anima muito é a trilha sonora.

    Obrigado pelos comentários e por responderem as perguntas, pessoal!

    Abração a todos!

    ResponderExcluir
  7. Texto maravilhoso! Tem coisa melhor que twittar comentando a novela? hehehe... Uma boa história, bem contada e bem amarrada sempre irá chamar a atenção. Não tem jeito!
    Lucas - www.cascudeando.zip.net

    ResponderExcluir
  8. Novela boa tem que ter romance, texto inteligente, bons ganchos, elenco e direção afinados, imagem primorosa, áudio agradável, belos cenários, trilha musical apaixonante, enfim, são poucas as que preenchem todos esses requisitos, mas estas, como vocês já citaram a cima, são memoráveis.

    Ótimo post, Denis... você sempre escreve com paixão e técnica. Adoro!

    ResponderExcluir
  9. Acho que o melhor produto produzido no Brasil é novela, temos as melhores do mundo e isso para mim é indiscutível! Teria pelo menos 20 novelas perfeitas a citar e mais umas 100 que no mínimo foram novelas muito boas... Isso com uma visão crítica, com uma visão pessoal eu tenho minhas 5 novelas favoritas:

    5º Lugar - O Cravo e a Rosa

    Veio surpreender o horário das 6 com uma comédia, característica comum às novelas da 7. E o que mais surpreendeu, a audiência e a inovação, era a estréia do Walcyr Carrasco na Globo. A simplicidade no texto, a comédia escrachada, a mocinha rebelde e cômica, o mocinho rustico e extremamente engraçado e uma montanha de atores coadjuvantes que roubavam a cena fizeram de O Cravo e a Rosa uma das melhores novelas de todos os tempos.

    4º Lugar - Por Amor

    O que você seria capaz por amor? Com essa pergunta Manoel Carlos fazia uma coisa que poucos autores se preocupam em fazer, levar o público a pensar e refletir sobre suas próprias escolhas, geralmente os autores criam personagens e situações que levam o público a tecer uma crítica sobre aquilo que está envolvendo a trama, em Por Amor o público se via em cena, não eram grandes políticos corruptos, prostitutas, mocinhas sonhadoras, princípes ricos ou vilãs caricatas. Eram mães, filhos, pais, gente do cotidiano, o que aproximava demais os personagens com o público. O texto era poético, as interpretações em sua maioria fortes e quentes, muitos atores brilharam e o tema central da novela predominou do início ao fim.

    ResponderExcluir
  10. 3º Lugar - Xica da Silva

    Uma novela produzida fora da toda poderosa Rede Globo, a extinta Rede Manchete apostou alto e se deu bem, Xica da Silva foi um sucesso de público e crítica, revelou grandes atores da novela geração, trouxe um texto altamente rico e original, tecendo uma crítica à sociedade da época em que a trama se passa e fazendo referência a hipocrisia em que vivemos ainda em nossa época. Walcyr Carrasco, que assinou a novela com um outro nome, mostrou sua alta capacidade criativa em entrelaçar tramas e não deixar o clima da novela cair nunca.

    2º Lugar - Laços de Família

    Uma bomba dos anos 90, extremamente polêmica com sua proximidade da realidade, Manoel Carlos reafirmou sua identidade de trazer às telas uma trama baseada na vida real, onde ele mesmo dizia "Sua vida também poderia ser uma novela!". Laços de Família discutia os temas da sociedade na tv, trazia uma trilha sonora que se encaixava com cada um dos personagens, coisa rara nas novelas, já que a maioria das novelas escolhe as músicas do momento e entregam aos seus personagens. Forte e perfeita, assim descrevo Laços de Família.

    1º Lugar - História de Amor

    Meu xodô! Existe aqui no site um post muito legal sobre História de Amor, que pelo descobri não é apenas a minha novela preferida... Mais do que perfeita, História de Amor é sublime, me encanta. Sou apaixonada pela trama, pelo texto, pela trilha sonora e acima de tudo por Helena Soares, a melhor das protagonistas de todas as novelas já feitas, peito quem vier e quiser dizer o contrário. Regina Duarte, Manoel Carlos e Ricardo Waddington construíram a personagem perfeitamente humana, que todos os autores buscam hoje em dia, a mulher batalhadora, simples, apaixonada, nenhuma tão bem feita como Helena Soares. Os textos apaixonados de Helena são lindos, falando sobre o dia a dia, sobre o trabalho, sobre coisas da infância, sobre vontades, sobre amores, sobre a família, sobre amizade, não importava o assunto, ela sempre tinha paixão, força, tesão em dizer cada palavra, era lindo, me lembro de uma cena em que ela conversa com sua amiga Marta sobre como era o natal quando ela era criança, ela explica cada detalhe com um sorriso no rosto, degustando com prazer aquele texto, claro que sem o talento de Regina Duarte nada seria possível, mas acho lindo. Como se tudo isso já não fosse muito, outros personagens acontecerem fortemente na trama como Paula, Scheila, Assunção e Joyce, foram realmente grandiosos, com toda a beleza do texto de Maneco, além da incrível atuação e entrega de cada um dos atores. Um personagem pequeno e que também me encanta é a Neusa, defendido muito bem por Mônica Carvalho, que só tinha seu nome creditado no encerramento da novela. Hoje eu vejo e aplaudo também a densidade em que José Mayer defendeu seu personagem, que é tão difícil de ser interpretado. Olga também foi um personagem encantador. As histórias todas ótimas e entre elas uma que me chamou muito atenção pela verdade que foi da Joyce e do Caio, onde, como na vida real, a menina gosta do bad boy e nunca do bonzinho... História de Amor é mais do que uma novela, assisto e re-assisto como um presente da teledramaturgia. AMO AMO AMO

    ResponderExcluir
  11. Oi! Infelizmente você não deixou seu nome no comentário, mas digo que concordo com sua postagem, especialmente a respeito de História de Amor! Eu sonho todos os dias com uma boa reprise no canal Viva!

    Obrigado por colocar suas novelas favoritas e comentá-las!

    ResponderExcluir
  12. Olá, Denis
    Concordo com quase tudo que você falou. No tocante ao fato de uma novela ter boa ou péssima audiência, isso não mudaria em nada minha opinião sobre ela. Desde que eu goste, que a novela me satisfaça, não me preocuparia com o que dizem os críticos a respeito dela, muito menos com os números apresentados pelos medidores. Minha novela preferida e marcante é "Que Rei sou Eu?"
    Abraço,
    Carlos José dos Santos
    www.novelaparaler.blogspot.com

    ResponderExcluir