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quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Entrevista com Julia Laks, uma das pesquisadoras de "Salve Jorge".

Todo mundo sabe que uma das características principais das telenovelas da autora Glória Perez é a discussão de um tema social. 

Talvez pela própria trajetória de vida da novelista, esse aspecto esteve presente em tramas como "América" e "Caminho das Índias". Na primeira, o foco foi a imigração ilegal para os EUA. Na segunda, a discussão girou em torno da psicopatia e da esquizofrenia.

Uma nova novela está a caminho. Em "Salve Jorge", o objetivo de Perez é conscientizar sobre um tipo de crime que, muitas vezes, parece ser uma grande lenda ou ainda está distante dos olhos de uma parte da população: o Tráfico Humano.

"Salve Jorge", a  nova novela de Glória Perez. Foto: Divulgação TV Globo
Glória Perez escreve sozinha, mas sempre conta com uma equipe de pesquisadores que são os responsáveis   pelo fornecimento de informações essenciais para a construção da trama, da caracterização, dos cenários, da composição de personagens.

Uma delas é a pesquisadora Julia Laks que ficou encarregada de desvendar os interesses e consequências do Tráfico Humano e também trazer para a autora o universo do Complexo do Alemão e do Exército que participou do trabalho de pacificação da comunidade carioca.

E foi com ela que o Posso Contar Contigo conversou para saber mais detalhes sobre o trabalho e como as informações serão trabalhadas na novela. Confira!

Por Paula Teixeira

Por que o Complexo do Alemão foi escolhido como um dos núcleos da telenovela "Salve Jorge"?

Todos nós nos emocionamos muito com a tomada do Complexo do Alemão pelo Exército, tão marcante para o processo de pacificação do Rio de Janeiro e fundamental para o país. Como a Glória Perez diz, e eu concordo plenamente, a reconquista do território nos permitiu conhecer talentos da região que antes não tínhamos acesso por causa da violência imposta. A autora quis dar visibilidade justamente a eles e falar destes guerreiros anônimos que enfrentam diariamente seus “dragões”. Por isso, ela situou a protagonista Morena, a trama central de Salve Jorge, no local.

Como pesquisadora, como foi conhecer a realidade de uma grande comunidade do Rio de Janeiro? Você conhecia outras comunidades cariocas ou de outras cidades?

Já tinha visitado o morro Dona Marta e a Rocinha, duas comunidades do Rio de Janeiro, mas esta foi a primeira vez que mergulhei na realidade de uma região, que conversei com pessoas de diferentes idades e pontos de vista. Conhecer o Alemão foi maravilhoso! Como carioca, me senti descobrindo um pedaço da minha cidade.

Quais foram os focos da pesquisa no Complexo: as residências, o estilo de vestir, andar, o cotidiano. Como ela foi feita?

Trabalho na equipe da Glória Perez e nosso foco está no texto. Busco histórias, situações e expressões que possam ajudá-la a construir a trama. As residências e o estilo de vestir fazem parte de uma realidade, mas são assuntos aprofundados depois pelas equipes de cenografia, produção de arte e figurino.

No caso do Complexo do Alemão, a autora vai convidar pessoas da região para participar da novela também e me esforcei para conhecer talentos como o Otávio Jr, que tem uma biblioteca itinerante e estimula a leitura na região, a Rita Serpa, que dá aula de dança, a Adriana da empadinha, entre outros.

Qual a importância da pesquisa in loco para estrutura da narrativa, para a preparação dos atores? Essa pesquisa mais intensa traz mais segurança para o autor?

Acredito que cada autor trabalhe de um jeito. A Glória valoriza bastante esta pesquisa in loco e, também por isso, admiro-a tanto. A autora acredita que não há ninguém melhor do que quem passou por determinadas experiências para contá-las e é incrível ver como ela se envolve com os assuntos que aborda. Suas histórias são sempre muito embasadas e isso certamente reflete na narrativa. Para mim, não há nada mais rico do que ouvir o outro.

Sobre o Exército, foi feita uma pesquisa sobre a relação dessa instituição com os projetos de pacificação dos morros cariocas?

A novela se passa na época da tomada do Complexo do Alemão pelo Exército e o Theo, protagonista da história, é um Capitão da Cavalaria. A Sandra Regina, também pesquisadora da equipe, e eu fomos diversas vezes ao Regimento Andrade Neves, no Rio de Janeiro, e à base dos militares no Complexo do Alemão para entender o que pensavam e como atuavam. Este foi outro universo bastante rico que tivemos a oportunidade de desvendar.

Sobre o Tráfico Humano, a pesquisa foi realizada com a colaboração de órgãos governamentais, como o Ministério da Justiça? Na pesquisa foi difícil encontrar dados, informações ou já existem estudos sistematizados sobre o tema?

Começamos esta pesquisa mergulhando em livros e filmes sobre o tema. Depois, conversamos com advogados, pessoas do Ministério da Justiça, da Polícia Federal, de ONGs e, principalmente, com vítimas de tráfico humano. Há alguns estudos, mas a Glória queria entender como se sentem esses indivíduos que passam por situações inimagináveis de abuso, quais seus sonhos e angústias. E este processo foi extremamente enriquecedor. É impressionante como um crime que escraviza tanta gente e gera um lucro de 32 bilhões de dólares ao ano pode ser invisível, considerado por muitos uma “lenda urbana”.

Como o Tráfico Humano será discutido na trama? Mais em relação à prostituição?

A novela abordará o tráfico internacional de pessoas para três fins: sexo, trabalho doméstico e adoção ilegal.

"Salve Jorge" terá um blog especial sobre as "descobertas" da pesquisa como teve a telenovela "Caminho das Índias"?

Por enquanto, não.

Finalizando, como você enxerga a discussão sobre outras culturas, crimes (tráfico humano) e comunidades carentes dentro do contexto das telenovelas? Qual o nível de pertinência dessa discussão e como participar de um projeto assim modifica o seu olhar sobre o mundo?

A Glória sempre viu a televisão como um instrumento de mobilização social. E esta é mais uma característica dela que admiro. Não acho que essas discussões devam ser obrigatórias e acredito que os autores precisam estar livres para criar. Afinal, novela é entretenimento. No entanto, me emociono quando vejo que ela consegue colocar em foco assuntos tão relevantes como o tráfico humano e o processo de pacificação do Alemão. Depois, cabe à sociedade cobrar e se organizar para que as campanhas tragam resultado.

Também gosto muito de conhecer outras culturas e concordo com a Glória que olhando para os outros nos entendemos melhor. A oportunidade que este projeto me dá de conversar com pessoas de tantos universos diferentes é fantástica.

O Blog "Posso Contar Contigo" agradece a colaboração da pesquisadora Julia Laks. A estréia de "Salve Jorge" será nesta segunda, na TV Globo!

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