Brunno Duprat
Dia desses de primavera quase verão, estava eu comentando com alguém que não me lembro quem, como se repetem atores nas escalações. Alguns até valem a pena ver de novo tão rápido. Outros nem tão cedo, mais precisamente nunca. No meio da conversa surgiram vários nomes de bons atores que não dão o ar da graça tão freqüentemente e outros tantos que por algum motivo, acabaram sumindo da telinha.
De todas essas ausências, um denominador comum: a atriz Joana Fomm, que tantas vezes nos presenteou com atuações memoráveis e personagens inesquecíveis. Embora seja uma atriz versátil, apta a viver qualquer papel com toda a competência que lhe é peculiar, foi com suas louváveis megeras que Joana viveu seus melhores momentos na TV. Segundo minha humilde opinião, é claro. E é por isso que este texto nasceu: relembrar essas megeras e acima de tudo homenagear uma das maiores atrizes de nosso Brasil.
“... Abram suas asas, soltem suas feras. Caia na gandaia, entre nesta festa...” - dizia a canção da abertura de ‘Dancing Days’. Era 1978 e Yolanda Pratini se impunha com toda a sua altivez Brasil afora às 20hs em nossas telinhas, rivalizando com Julia Matos neste estupendo folhetim. Uma personagem antológica dentro de uma novela que até hoje, após 33 anos de sua exibição, ainda é referência. Uma mulher da alta sociedade carioca casada por comodidade e que assume a criação de Marisa (Gloria Pires), após a prisão de sua irmã. Ambiciosa, manipula a sobrinha para que siga seus passos e case-se por interesse com seu namorado rico, após aplicar o bom e velho golpe da barriga. Não satisfeita, dificulta a já nada simples relação entre mãe e filha. Um triângulo afetivo complexo e muito bem estruturado pelo autor, pois havia de fato um sentimento real pela sobrinha, ainda que com valores questionáveis. Mas como nem tudo são flores, seu castelo desabou. Separou-se de Horácio (José Lewgoy) e viu seu alto padrão de vida despencar, os convites para bons drink’s desaparecerem e a sociedade lhe ignorar. Assim começa a pagar pelas maldades que fez. Joana passava com a força do olhar e a expressão facial toda a arrogância da personagem. Olhar esse que originou um fato no mínimo curioso. Segundo o autor Gilberto Braga sua empregada doméstica na época, bateu o telefone na cara da atriz:
“Ela me vê escrever a novela, dá uma olhadinha no final do capítulo às escondidas, conversa comigo. No entanto, quando tentei sugerir que a Joana não tinha nada a ver com a Yolanda, ela respondeu:
- ‘ Sei que o senhor é que escreve aquilo tudo, não sou burra. Bati o telefone outro dia por causa da cara de nojenta que ela fez quando a Júlia entrou no camburão da polícia. A cara não foi o senhor que escreveu, era dela mesmo. ’”
Dentre tantas belas cenas, destaco aquela onde Yolanda e Julia fazem as pazes após uma troca de farpas e tapas. Com atuação natural e direção acertada, é a típica que cena que não vemos mais hoje em dia, não com assiduidade, muito menos com atrizes deste naipe:
Uma mulher da aristocracia que vivia de um passado de glória e de um presente de decadência e falta de dinheiro. Assim surgira Lúcia Gouveia, em ‘Corpo a Corpo’ (1984). Qualquer semelhança com Yolanda Pratini não é mera coincidência. Ambas são filhas de Gilberto Braga, pai dos mais odiados antagonistas da teledramaturgia brasileira. No fundo poço e ávida por sair da lama, Lúcia não poupa nem a própria filha, Alice, oferecendo-a quase numa bandeja para Claudio (Marcos Paulo) se servir, a fim de garantir o retorno dos áureos tempos. É marcante a cena em que ela fere os joelhos de Alice (Luisa Tomé) propositalmente com uma pedra para que a mesma, com trajes curtos, possa ser ‘socorrida’ pelo Drº. Uma típica vilã ‘gilbertiana’, acreditando estar correta em todas as suas atitudes, por mais amorais que elas fossem.
Sônia (Zezé Motta) era uma pedra em seu scarpin de salto agulha, pois além de namorar Claudio, anulando assim as chances fisgá-lo como genro, era uma linda e bem sucedida arquiteta. E negra. Sim, não satisfeita em ser este amor de pessoa, a cretina ainda era racista. Não faltaram insultos, piadinhas infames, humilhações e coisas do gênero. Joana brilhou e chamou para si os holofotes da novela. E não é que dentro de uma megera, também bate um coração? – Lúcia era apaixonada por Amauri (Stênio Garcia) ex-presidiário, bem distante do que seria o seu ideal de bom partido. Mais tarde saberíamos que ele é o pai biológico de Alice.
O desempenho foi tão espetacular que o público por vezes fundiu atriz e personagem, gerando situações no mínimo inusitadas como o fato de um garçom se recusar a servi-la num clube, por considerá-la ‘muito má’.
Um pequeno aperitivo do arsenal deste veneno em forma de mulher:
Arrogante, fria e calculista. Foi em mais um papel neste mesmo perfil que Joana roubou a cena mais uma vez vivendo uma megera daquelas bem clássicas! É a vez de Tia Fausta, a antagonista de ‘Bambolê’(1987), novela do saudoso Daniel Más, exibida às 18 horas. Do mesmo modo que boa parte da sociedade brasileira dos charmosos anos 1950, Fausta era uma mulher que prezava pela ‘moral e bons costumes’ não só em sua vida, bem como na de seus familiares e amigos. Sempre discordou da postura libertária de seu cunhado Álvaro (Claudio Marzo) e do jeito que o mesmo criara suas sobrinhas após o falecimento de sua irmã. Amável e zelosa com as meninas, aparentemente uma tia solícita e generosa. Mas que ninguém se engane! Por trás de tanto carinho e afeto, escondia-se o desejo de garantir bons casamentos (entenda-se homens de posse da alta roda) para as mesmas, cavando assim um futuro confortável, uma velhice segura e sem trancos para si.
Os embates com Álvaro tornam-se ainda mais constantes quando ele se envolve com a nova vizinha, Marta (Susana Vieira) – desquitada, mãe de dois filhos de pais diferentes e que viveu ‘juntada’ por 12 anos mesmo sendo desquitada. Um prato cheio para a nossa falsa moralista de plantão, que fez sua vida em função de destruir e afastar esse mau exemplo para bem longe dos seus. Atormentou o quanto pôde o romance do casal. Embora não seja tão lembrada a trama teve uma boa média de audiência, acima do exigido pela emissora. E Joana mais uma vez não decepcionou!
Como não tê-la em nossas recordações mais gostosas sobre novelas?
Como segurar a gargalhada ao vê-la de olhos arregalados, apontando seu guarda-chuva (fiel escudeiro) para sua irmã e gritando a plenos pulmões:
- Queeengaaaaa! ?
Eu não consigo e creio não ser o único.
Uma interpretação arrebatadora, sucesso de público e crítica, coroando assim o inquestionável talento desta excepcional atriz. Perfeito trabalho de composição de personagem, encontrando o tom exato do exagero permitido no realismo fanático, sem cair na canastrice. Um show à parte, tomando de assalto mais uma vez o centro das atenções.
São inúmeras as cenas que eu poderia relembrar, mas tem duas que amo: quando é revelado o que a beata guardava com tanto zelo numa caixa: o pênis do falecido. E a outra é a cena mais lembrada da novela, onde Tieta revela para todos nós que sua irmã é careca em pleno altar da Igreja Matriz, na frente de Carmosina, Osnar, Tonha e cia, rs!
Menção honrosa à vingativa Eugenia Carlota, de ‘As Pupilas do Senhor Reitor’ (1994), no SBT. Um folhetim um pouco conturbado, que viu sua audiência subir e a trama emplacar, após algumas modificações, entre elas o um destaque maior para Joana.
Enfim, espero ter cumprido a missão de resgatar esses lindos trechos da espetacular trajetória televisiva de Joana Maria Fomm, que tem o seu lugar cativo no Panteão das Grandes Atrizes.
Execelente Post, Duprat!!! A Joana Fomm é diva, uma grande atriz que faz falta nas novelas de hj. Homenagem super merecida.
ResponderExcluirDAVI VALLERIO DISSE
ResponderExcluirfaltou so a Salustiana de Fera Ferida,a marcante participacao especial em Cambalacho como a mentora da terrivel Natalia do Valle e a unica vila pobre dessa lista...a prostituta Marli do Pagador de Promessas.
Bruno, que post retado de bom, moço!
ResponderExcluirConcordo com a Glauce, homenagem merecida... Ah! muito bom o registro da visita do David Oak por aqui e com algumas observações pertinentes. Valeu, bee. Até que não foi nenhum golpe baixo, como eu temia que pudesse ser. (risos)
Um abraço!
E olha que ela era pra ter sido a Marion Novaes de Paraiso Tropical hein!! Seria mais uma megera!
ResponderExcluirUma atriz que faz falta na tv!
Bom texto Bruno!
Brunno como sempre arrasando no texto!
ResponderExcluirE Joana Fomm dispensa comentários, é sem dúvida a melhor no quesito megera das nossas novelas!
Faz falta na TV! Em uma novela atual, com toda certeza seria o grande destaque!
Abraços
Acho que ela deveria ser a protagonista de uma novela nova, mas destaque, assim como foi Lília Cabral. Grande Atriz. Post Fenomenal.
ResponderExcluirAi, eu não só acho q o papel de vilã já virou estereótipo da lida de ser atriz da Joana, mas destaco uma q, para mim, SEMPRE será dela: Perpétua!!!
ResponderExcluirBelo texto.
Beijos.
Vc é um talento na literatura, Brunno!!!
ResponderExcluirParabéns!!!
Texto mto bem escrito!!! E a homenagem à Joana, mais q merecida!!! Ela é ótima!!!
E vc, continue produzindooo!!!
Execelente texto, Brunno Duprat!!! Parabens, lindinho!!! :))
ResponderExcluirA Joana Fomm é uma diva realmente, uma grande atriz!!
Amei Perpetua...demais!! kkkkk
Bonita Homenagem!!!
Bjs
Maura Zine
Agradecido pelos comentários e fazendo pequena observação, embora pensei que tivesse ficado clara a questão:
ResponderExcluirAs escolhas foram pessoais e acima de tudo baseado em novelas, nada de minisséries. Outro ponto é que peguei as personagens que tomaram a novela para si, o que não foi o caso de Salustiana. Uma personagem bem defendida, mas que não foi o destaque de Fera Ferida.
Quem ofuscou em Fera Ferida foi a dupla Jose Wilker e Susana Vieira, juntamente com Cassia Kiss e Paulo Gorgulho.
Em Cambalacho a personagem era mentora, e não a vilã. E quem reinou em Cambalacho foi Dona Fernanda Montenegro e sua trambiqueira Naná, assim como Regina Casé e sua impagável Tina Peper. Mas são questões de observações pessoais, cada um vê brilhar aquilo que prefere.
Mas enfim, só para registrar.
Abraços.
Pena que ela não pôde fazer "Paraíso tropical". E eu acho que ela poderia ter feito a Mariana de "Paraíso". Mas ficou com a Cássia Kiss, que fez um bom trabalho.
ResponderExcluirLucas - www.cascudeando.zip.net
Joana é uma das maiores atrizes do Brasil. É uma pena que tenha sido dispensada pela Globo depois de tantos anos de ótimos serviços prestados, no início dos anos 90, e que atualmente sua saúde a impeça de trabalhar plenamente. Que ela logo possa voltar e dar mais uma demonstração de como se interpreta uma personagem, ainda que não seja má e arrogante como nos acostumamos a vê-la na televisão.
ResponderExcluirTambém fiquei bem triste de ela não conseguir ter feito a Tia Neném...papel originalmente escrito pra ela pelo GB...meu papel preferido dela má é a Lucia Gouveia, detestável, preconceituosa, mesquinha e que ainda vivia de favor na casa de uma amiga...seu trabalho é uma força da natureza...
ResponderExcluirNão resta dúvida que esta aí marcou na TV brasileira.Foram trabalhos inesquecíveis. Excelente atriz, carismática,charmosa e de um talento extraodinário.Dona de um belo sorriso,Joana marcou presença como Yolanda Pratini em Dancys Days. Lamentamos sua ausência devido a problemas de saúde. Melhoras,Joana. Lucrecia Rocha - Salvador - Ba
ResponderExcluirMuito bem lembrado Brunno, a ausência de Joana nas novelas as tem tornado medianas, ela sabe dar o tom que o público gosta e espera de cada personagem, realmente a Joana Fomm é uma baita de uma atriz e sinceramente espero que o bom Deus ainda nos presenteie com a volta dela às telinhas.
ResponderExcluirDei uma olhada no Teledramaturgia para lembrar de uma personagem que me veio à mente: Olga, de Esplendor. Pelo pouco que me recordo, era uma mulher cadeirante, extremamente amarga, agora, não consigo ter certeza se era de fato uma vilã. Alguém refresca minha memória? Assistia a novela mas esqueci de maiores detalhes!
ResponderExcluirBrunno, ótimo seu texto! Valeu pela oportunidade de conhecer e lembrar sobre a carreira dessa atriz excepcional!
Um abraço!
A Betty Faria gravou como Porcina na versão censurada de Roque Santeiro. A Joana Foom só fez Iolanda após saída de Norma Bengell de Dancin Days, e Lídia Brondi preferiu o papel de Vera e Mariza foi para Glória Pires,após testes. Susana Vieira fez Cândida em Escalada mas era para Camila Amado. Capitu de Laços de Família seria Carolina Ferraz e não Giovana Antonelli. Dina Sfat recusou O Bem Amado que ficou para Sandra Bréa. E antes de Regina Duarte estrear na Globo, Véu de Noiva foi pensado para Tereza Amayo. Sérgio Cardoso recusou Tucão de Bandeira 2 e foi para o grande Paulo Gracindo. Coisas da vida.
ResponderExcluir