E. Felipe
Sol, mar, surf, trilha sonora de verão, modelos,
passarelas e referências à cultura pop: com essa agradável mistura, Antônio
Calmon e Walther Negrão assinaram uma dos maiores sucessos das 19 horas, a carismática Top Model. Reprisada com êxito no Vale a Pena Ver de Novo em 1991, ganhou uma segunda reexibição, na íntegra, 20 anos depois, no Canal Viva, tendo sido concluída em 18 de setembro de 2012,coincidentemente quando completa 23 anos da estreia.
Top Model,
uma novela sobre jovens para jovens, não foi a primeira produção do gênero: nos anos 70, a
Rede Globo produziu o seriado Ciranda Cirandinha e, nos anos 80, a Band exibiu Os
Adolescentes. Tais experiências, contudo não tiveram o mesmo alcance de Top Model, haja vista estarem impregnadas de ideologias ou questões sociológicas em sua maior parte, além de prejudicadas pela censura. Ciranda Cirandinha
passava tarde demais para o público mais jovem – 22 horas - e tinha parte de seu conteúdo vetado. Os Adolescentes era uma
novela sobre jovens voltada para adultos, com abordagem de
assuntos pesados como drogas e polêmicos como orientação sexual.
Antônio Calmon e Walther
Negrão escreveram o folhetim que melhor retratou o universo da adolescência: Top Model foi um verdadeiro porta-voz da juventude de sua época. Gaspar Kundera (Nuno Leal
Maia) e seus filhos, Elvis Presley (Marcelo Faria), Jane Fonda (Carol Machado), Olivia (Gabriela Duarte) e Ringo Starr (Henrique Farias), de
mães diferentes, viviam os reais dilemas típicos da faixa etária. Temas como
masturbação, maturação sexual, menstruação, primeiro namoro e primeira
transa foram tratados abertamente, com
leveza, e sem didatismos ou moralismos. E ainda havia o filho caçula John
Lennon (Igor Lage), tentando lidar com o traumático evento da separação dos pais. Tudo
isso na companhia de um lindo cãozinho que também ficou na memória dos fãs, o
sheepdog Maradona.
Os jovens em Top Model
eram valorizados em primeiro plano, e não coadjuvantes dos dramas do núcleo adulto: cada um tinha sua particularidade e trama
desenvolvida a contento, gerando a imediata identificação com o
telespectador. Havia o jovem Elvis, de boa índole mas pouco
intelecto para os estudos, vivendo a questão da
primeira transa com a namorada Tininha (Adriana Esteves); as confusões causadas pelo primeiro
amor, que estremeceram a fraternidade e amizade entre a delicada Olivia e
a forte Jane, quando esta se apaixona pelo namorado da irmã; e as divertidas passagens
do intelectual Ringo Starr, em processo natural de maturação sexual, na posse frequente de revistas eróticas e desejando uma mulher mais velha. Além do drama do jovem Alex Junior (Rodrigo Penna), sobrinho de Gaspar, cercado de
dinheiro e conforto, mas órfão de mãe e carente do amor do pai,
mais voltado para os negócios do que para o próprio filho. Um grande acerto esse elenco juvenil: poucas vezes conseguiu se reunir em uma produção jovens tão talentosos como os intérpretes dos filhos – e sobrinho
- do Gaspar
Mas o público adulto
também tinha motivos de para acompanhar a novela, pois o texto contemplava o drama tradicional
e folhetinesco. Tais elementos foram retratados na rivalidade entre os
irmãos Kundera; no problemático núcleo familiar do jovem Artur (Jonas Torres); e nos encontros e desencontros da trama central amorosa da
protagonista, a modelo Duda (Malu Mader), com Lucas (Taumaturgo Ferreira).
Os pais de Artur, Lia (Denise Del Vecchio) e Jacques (Jonas Bloch), representaram o lado mais denso de Top Model, o
casal em crise pela infidelidade do marido, que tenta se reconciliar em prol
do bem-estar do filho, portador de uma grave doença. Além de enfrentar os
problemas de saúde do garoto, precisam lidar com a perseguição da perigosa
ex-amante de Jacques, Rose (Cissa Guimarães em ótima atuação). Grande momento o de Lia, quando decide dizer um não
definitivo às infidelidades de Jacques e o deixa, no penúltimo capítulo.
Aliás, enquanto
teledramaturgia, percebe-se que a trama
inicialmente proposta como carro-chefe de Top Model, o amor de Lucas e Duda
ameaçado vilão Alex Kundera (Cecil Thiré), enfraqueceu ao longo do tempo. A mocinha Duda, embora vivida pela estrela do momento, Malu Mader,
foi aos poucos perdendo espaço e carisma (parte em razão da desmedida empáfia
da personagem), formando um casal apático com o pouco expressivo Taumaturgo
Ferreira. E a falta de química se acentua na metade da novela, quando chega a personagem Giulia (Alexandra Marzo), moça simples que conquista com sua simpatia e sinceridade o coração de Lucas, ganhando boa parte da torcida do público.
A rivalidade entre o
irmão surfista super de bem com a vida, Gaspar, e o irmão sisudo, vingativo e louco
Alex Kundera também sobrepujou o romance principal de Top Model. O grandioso Cecil
Thiré deu vida de forma magistral a um complexo Alex Kundera, que padecia de uma exagerada inveja do irmão, rendendo
momentos de tensão impensáveis para uma novela das 19 horas
atualmente. O personagem foi capaz das maiores barbaridades, como homicídios e
golpes financeiros contra membros da própria família, cárcere privado e tortura
psicológica, mas também sofria uma forte dor interna e enorme peso na consciência. Nos momentos finais, externou ainda mais o seu lado mais brando, ao salvar o filho e um sobrinho das mãos de um perigoso bandido (Grilo, vivido
magistralmente pelo saudoso Chiquinho Brandão) e, à beira da morte, pedir sincero perdão a Gaspar.
Houve, ainda, uma ótima
galeria de coadjuvantes. A família do Gaspar não teria funcionado tão bem sem a
presença da “faz tudo” Naná, vivida com muito carisma por uma
então estreante chamada Zezé Polessa, uma das maiores sensações de Top Model. A divertida empregada doméstica Cida (primeiro
papel de Drica Morais), que sonhava em ser cantora (e conseguiu!), rendeu
hilários momentos. A esfuziante e charmosa Carla (Suzy Rêgo), rival de Duda nas passarelas, chamou a atenção e ganhou a capa do LP da trilha nacional. A bela e sensual Mariza (que na verdade de coadjuvante nada tinha), foi um show à parte de Maria Zilda,
que conduziu muito bem a virada da personagem: da ambiciosa e detestável
carreirista a uma mulher mais leve, compreensiva e até divertida. E a dama Eva
Todor encantou com a adorável e alto astral Morgana, formando um gracioso
par com o saudoso Luiz Carlos Arutin. Esses e outros personagens foram imortalizados também em razão das inesquecíveis trilhas sonoras: canções como “Hey Jude”, "À Francesa", “Fica Comigo”, "Essa Noite Não", "Stay", "Right Here Waiting"e “Stairway to Heaven” remetem imediatamente ao clima da novela.
Top Model marcou a
estreia de muitos astros e estrelas que hoje são figuras notáveis na TV, como Adriana
Esteves, Flávia Alessandra e Gabriela Duarte. E nos remete a um clima
nostálgico de um Rio de Janeiro do começo dos anos 90 e sua praia da Macumba
então quase virgem e pouco habitada, com extensa faixa de areia e vegetação (hoje, em razão
da especulação imobiliária na zona oeste carioca, boa parte da areia foi tomada por avenidas, prédios
e ciclovias, onde nem a simbólica casa do Gaspar existe mais).
A
união fez a força em
Top Model: o estilo folhetinesco e mais dramático de Negrão mesclado à linha mais "descolada" e moderna de Calmon resultou numa agradável história. Mesmo com alguns momentos de marasmo em que a trama não evoluía e um texto por vezes raso e ingênuo, Top Model, no geral, revelou-se uma obra interessante ao lidar com o universo do jovem. Ao retratar de maneira
fiel as dores e as delícias da adolescência, num clima leve e colorido de verão, Top Model merecidamente marcou época e deixou saudades na geração que a acompanhou nos anos 80. E quem a conheceu em 2012, por
intermédio do Canal Viva, pôde finalmente atestar com os próprios olhos as
razões que fizeram de Top Model a febre juvenil da época.
Sabe que com esse texto me deu até um arrependimento por não ter acompanhado a trama.
ResponderExcluirPorém o tempo é mega complicado pra mim.
Acho que Top Model foi a melhor novela de Calmon.
Abraço Lipe
Ai, as primeiras novelas assistidas, a gente nunca esquece! Até hoje tenho uma birra do Celso Thiré, por causa do Alex Kundera! Bom adolescer naqueles tempos...
ResponderExcluirAcompanhei praticamente inteira e gostei muito. Vai me deixar saudades...
ResponderExcluirPerfeito! Quem não conhece "Top Model" vai saber tudo ao ler esse texto que não se resume apenas a passar informações sobre a trama, mas comentar sobre todas elas com assertividade e clareza sem deixar de imprimir sua visão pessoal e afetiva. E em quem conhece e acompanhou "Top Model", seu texto provoca uma deliciosa nostalgia e a exata sensação do que a novela representou. Parabéns, querido! Adorei meeesmo! Abs.
ResponderExcluirJá com saudades (pela segunda vez) dessa trama que tanto me marcou, nada melhor do que ler textos tão bem escritos como esse. Deliciosa leitura!
ResponderExcluirParabéns pelo texto! ;)
Essa novela foi muito marcante na minha adolescência! AMAVA! Não perdia um capítulo, nem quando tava doente. risos... Bem q podiam vender novela em dvd pra gente matar as saudades de algumas (mas SÓ ALGUMAS!risos). Essa é um delas!
ResponderExcluirBeijos.
Ótimo texto Felipe!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
ResponderExcluirFoi muito bom ler a sua análise precisa sobre esta novela!!!!! Uma análise de quem realmente assistiu a tudo com vontade e com curiosidade de conhecer uma novela do passado, sempreconceitos, sem desmerecimento!!!!
Eu confesso que vi TOP MODEL pela terceira vez, originalmente lá em 89/90, na reprise e agora no VIVA, e realmente esta novela era uma febre, uma novidade, pois pela primeira vez estavam dando voz aos jovens numa época em que MALHAÇÃO não era nem projeto.
P
Só posso te dar o parabéns, o texto ficou muito gostoso de ler!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Adorei seu texto Felipe!
ResponderExcluirCaptou toda a essência da novela em poucas palavras!
Parabéns!
E muito obrigado pela colaboração que me prestou durante o tempo em que ela foi ao ar!
Abraço!
Parabéns por mais um texto bem recebido pelo público, aliás, quanta gente bacana por aqui. Muito bom quando comentam. Voltem outras vezes!
ResponderExcluirLip, muito contente por tê-lo novamente conosco... Sinta-se bem, querido!
oi, Felipe.... nunca tinha notado essa veia da novela como um condutor de problemas da adolescência...e olha que vi duas vezes....confesso que vi apenas alguns capítulos no Viva...pra matar a saudade do Alex Jr. personagem que eu adoro. Também acho que o romance Duda e Lucas fica meio chato mas concordo que não tinham que mudar o final não....apesar de a Giulia ter feito mesmo a diferença.Excelente texto e principalmente ponto de vista!!!
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