Por Leonardo Mello
de Oliveira
Chegamos a mais um final de ano, momento para recapitularmos o que aconteceu neste 2014 e analisarmos as promessas para
2015. Nesta postagem especial em duas partes, faremos um balanço das novelas
deste ano e as expectativas para as que nos aguardam ano que vem. Como não
assisti a novelas de outras emissoras que não da Globo, não vou me ater a estas, de modo a evitar críticas e comentários rasos e sem uma boa
base. Lembrando que iremos desconsiderar novelas que tenham iniciado em 2013,
que são Amor à Vida, Joia Rara, Além do Horizonte e a temporada anterior de
Malhação.
Depois de um 2013 difícil, tanto em
termos de qualidade quanto de audiência, a Globo iniciou 2014 com a missão de
se reerguer. A emissora tinha planos ousados, entre eles novelas pretensiosas e
diferentes. Apesar da mesma não ter conseguido chegar nem perto do auge que
conseguiu em 2012, pode-se dizer que o ano que passou foi mediano para a
teledramaturgia global. Em termos técnicos, não temos muito que reclamar. A
“Vênus Platinada” conseguiu recuperar alguns pontos sim, mas ainda está em
sinal de alerta.
A
primeira estréia do ano foi a de Em Família, em fevereiro. Anunciada como sendo
a última novela de Manoel Carlos, a trama prometia trazer novamente o estilo de
Maneco, que marcou tanto a nossa teledramaturgia, principalmente nos anos 90 e
início dos 2000. Infelizmente, o “bom velhinho do Leblon” não conseguiu fechar
sua carreira com chave de ouro. Em Família penou para conseguir alguns índices,
e apesar de contar com histórias supostamente envolventes e dramas polêmicos, a
novela não conseguiu agradar nem público, nem crítica. Maneco trazia de volta
personagens de difícil aceitação, tais como a mimada Luiza (Bruna Marquezine);
a apática Helena (Júlia Lemmertz); o egoísta e perturbado Laerte (Gabriel Braga
Nunes); e o “banana” Virgílio (Humberto Martins). Nota-se que houve diversos
problemas, principalmente na condução e desenvolvimento dos personagens, além
de uma direção mediana de Jayme Monjardim, que já fez bem melhor do que mostrou
aqui. Apesar de tudo, a novela teve seus êxitos: os diálogos de Maneco são uma atração
à parte em qualquer novela, e o elenco estava afiadíssimo, pode-se dizer que
eram os atores que faziam da novela uma atração “assistível”. As primeiras
fases foram também um acerto, o que só piorou a sensação de decepção ao criar
tanta expectativa para o que viria depois.
Substituindo
a meia-boca (porém bem produzida) Joia Rara, Meu Pedacinho de Chão estreou em
abril trazendo novos ares (novos até demais) para o horário das 18h. Longe de
ser uma novela convencional, a fábula de Benedito Ruy Barbosa e Luiz Fernando
Carvalho continha personagens exagerados, com hábitos esquisitos, roupas
extravagantes, feitas de papel, plástico e sucata, e uma história linda com um
bonito toque infantil. Foi uma das poucas vezes em que se viu uma obra em que
tudo se encaixou perfeitamente: direção, texto, elenco e produção, todos
juntos, trabalhavam em harmonia para fazer uma das melhores novelas dos últimos
anos. Analisando, se vê que, caso um desses fatores não estivesse bem, toda a
novela se comprometia. Infelizmente, não obteve números de audiência muito
significativos, mantendo, mais ou menos, o que sua antecessora havia
conseguido. Também vale elogiar a Globo, que se arriscou ao apostar em um tipo
de produção extremamente diferente de tudo o que já se produziu no meio.
A
estréia de Geração Brasil foi anunciada com pompa e circunstância pela
emissora, deixando claro que a novela era dos mesmos autores de Cheias de
Charme, Filipe Miguez e Izabel de Oliveira. As chamadas traziam boas
expectativas, tudo indicava que a Globo conseguiria restaurar o decadente
horário das sete. Tudo não passou da expectativa. O que se recebeu foi uma
trama bagunçada, cheia de personagens sem utilidade e mal-desenvolvidos, com
uma direção convencional e abordagem de temas que nada combinam com o estilo
folhetinesco. Além disso, a novela passou as dificuldades de não ser exibida no
período da Copa do Mundo, o que criou esperanças de que voltasse melhor do que
antes. Porém, não se conseguiu notar praticamente nada de diferente. O elenco
tinha seus ganhos, como a presença de Leandro Hassum e Luís Miranda em bons
personagens. Mas todos pareciam perdidos em uma produção que tentava se provar
novela. Obviamente, houve muitos equívocos, ao meu entender, principalmente
por parte dos autores. Uma pena, pois, de certa forma, a ideia original de
Geração Brasil era boa, simplesmente foi mal-desenvolvida.
Novamente,
a Globo voltava a apostar em Malhação nos finais de tarde. A nova temporada
trouxe mais uma vez a equipe da bem aceita temporada de 2012: Rosane Svartman e
Paulo Halm como autores titulares, Glória Barreto, desta vez, na supervisão de
texto, e Luiz Henrique Rios e José Alvarenga na direção. O resultado é satisfatório: tentando fugir dos clichês óbvios de Malhação e se aprofundando
mais em dramas do universo jovem (diferentemente da temporada anterior, que
mostrava jovens em dramas adultos), a atual temporada tem conseguido manter a
audiência do horário e vem sendo comentada pelo seu público alvo. Focando em
temas já até explorados pela “soap opera”, como a música e as artes marciais,
porém com abordagem diferenciada, a novelinha mostra que, nas mãos certas,
ainda consegue manter seu espaço na grade. Vale ressaltar o bom elenco, tanto
de jovens quanto de veteranos, contando com nomes como Eriberto Leão, Odilon
Wagner, Marcelo Faria, Felipe Camargo e Patrícia França, voltando a Globo
depois de praticamente 10 anos fora da emissora.
Mais
um remake marcava presença no horário das 23h. Desta vez, a atualização de O
Rebu, novela inovadora de Bráulio Pedroso dos anos 70, tentava a sorte no
horário alternativo de teledramaturgia. A bela produção também trazia uma
equipe já prestigiada da casa: George Moura e Sérgio Goldenberg, que já haviam
feito um sucesso tremendo com Amores Roubados no início do ano, no texto e
direção com Walter Carvalho e José Luiz Villamarim. A novela tinha ares
cinematográficos, tanto no tema do qual tratava quanto na direção. Além disso,
os diálogos e situações não cronológicas muito bem estruturadas pelos autores
enchiam os olhos dos apreciadores do gênero. Grandes destaques no elenco, com
pesos pesados interpretando personagens fortes e enigmáticos. Se O Rebu teve
defeitos, apenas a confusão que poderia causar no telespectador menos atento.
Pode-se dizer que foi uma das mais caprichadas produções da Globo dos últimos
tempos.
Aguinaldo
Silva retornava ao horário nobre com a promessa de um novelão clássico: sua
Império teria que fazer com que os telespectadores que haviam abandonado a TV
durante Em Família voltassem para a emissora. Porém, mais uma vez, Aguinaldo
entregou bem menos do que prometeu (como já comentou diversas vezes o crítico
de telenovelas Nilson Xavier). A começar pela sua tão aguardada vilã Cora
(Drica Moraes), que demorou capítulos e mais capítulos para mostrar alguma
característica genuína de vilã. No entanto, o autor conhece as manhas de se
escrever para as 21h, e conseguiu criar uma trama até certo ponto envolvente e
popular, que fisgou o público o suficiente para se manter estável na audiência
e na repercussão. Vale ressaltar a grande evolução do núcleo de Rogério Gomes
na direção, mostrando uma grande maturidade em relação às demais novelas às
quais ficou responsável anteriormente, dando novos ares às obras de Aguinaldo
Silva, que vinham contando com a direção mais “tradicional” de Wolf Maya há 10
anos. O elenco é equilibrado, visto que não há um número considerável de
personagens fortes para os atores se aprofundarem. Uma notável surpresa foi o
casal formado por Zezé Polessa e Tato Gabus Mendes, concebido para ser um mero
alívio cômico, mas que ganhou destaque pela excelente performance dos atores.
A
segunda novela das 18h do ano, Boogie Oogie criou expectativa nos saudosistas
de plantão. Trazendo os anos 70 como pano de fundo, a novela do autor iniciante
Rui Vilhena (já experiente em Portugal, onde morou por muitos anos) divide opiniões.
Entre os adoradores de teledramaturgia, faz um considerável sucesso e é frequentemente
elogiada pela crítica. Porém, não segura audiência, apresentando número
instáveis. Também não gera tanta repercussão quanto sua antecessora cheia de
atrativos. O autor português utiliza diversos clichês já manjados do grande
público, e escolhe seguir uma linha de texto mais exagerado, cheio de
comparações estranhas e forçando um ar irônico. Apesar de tudo, deve-se elogiar
a agilidade da trama. Rui consegue intercalar bem as cenas e conduzir bem os
dramas, de modo que a novela poucas vezes se torne cansativa. Discordo daquilo
que muitos especialistas já declararam: não há a sensação de confusão caso você
perca um capítulo. Isso porque pouco da história principal foi resolvido até
agora. A direção é neutra: ao mesmo tempo em que mostra inovações, segue uma
linha tradicional, talvez para lembrar novelas mais antigas. Também pode-se
responsabilizá-la por algumas incoerências de cenário, figurino e penteado, que
não condizem totalmente com a época retratada. Aliás, Boogie Oogie transmite
isso: tirando a discoteca e os hábitos das crianças, a história poderia se
passar em qualquer época. Não há um laço muito grande com os anos 70.
Alto
Astral é a mais nova aposta para reerguer o horário das 19h. A
Globo foi esperta, e decidiu seguir uma linha extremamente despretensiosa,
apresentando uma novela tradicionalíssima. Também do estreante Daniel Ortiz,
com base em uma sinopse escrita por Andrea Maltarolli, a comédia romântica tem
tudo o que uma novela das sete clássica tem: um mocinho corajoso, uma mocinha
ingênua (até demais para uma jornalista), um vilão inescrupuloso que conta com
a ajuda da secretária (também inescrupulosa) e diversos alívios cômicos, entre
eles uma vilã atrapalhada. Depois de 3 novelas supostamente revolucionárias
(duas grandes fracassos de audiência), a emissora via no convencional uma
chance de voltar aos tempos áureos. Alto Astral cumpre razoavelmente sua
missão. Mas o direcionamento, que utiliza clichês e situações já desgastadas,
tira a identidade da obra. O elenco é enxuto e bem escalado. Destaque para
Sérgio Guizé, Christiane Torloni e Claudia Raia (apesar de seu desempenho
dividir opiniões, a atriz cumpre o que sua personagem pede). A direção, outrora
inovadora, de Jorge Fernando, dá ainda mais o clima de tradicionalismo à
novela: tudo nela já foi visto diversas e diversas vezes, desde a fotografia
até o encadeamento da trilha sonora. Apesar de tudo, a novela está há pouco
tempo no ar, então ainda tem muito a mostrar.
2014 foi um ano de produções que se
neutralizam: ao mesmo tempo em que tivemos novelas inovadoras nas mais diversas
áreas, também vimos obras que seguem o estilo clássico de se fazer
teledramaturgia. Vale ressaltar e elogiar a Globo pelo seu esforço na iniciação
de novos autores, necessários à nossa TV. Sem grandes sucessos, o ano acaba com
o clima de dúvida: quais caminhos a Globo vai seguir a partir de agora? O que
fará para não cometer os mesmos erros e manter a fórmula dos sucessos? Com os 50
anos da emissora em 2015, espera-se ver cada vez mais produções caprichadas e
surpreendentes. Mas falaremos mais disso na segunda parte desta postagem, com
as expectativas na área de teledramaturgia para o ano que vem.