VOCÊ VAI TER TUDO O QUE SEMPRE MERECEU!

Por Denis Pessoa

Desde 2001, a busca incansável pela fama formou milhares de teses, opiniões, estudos e críticas. Grande parte da responsabilidade por esta nova discussão foi o programa Big Brother Brasil, que gerou fascínio, dilemas, curiosidade, e dificilmente, indiferença: ou amavam o reality show, ou detestavam, considerando-o uma grande inovação, ou uma besteira sem tamanho, que dava fama a diversos anônimos, que da noite para o dia, tornavam-se celebridades sem ao menos, supostamente, realizar esforço algum.

Em 2003, a discussão continuava, porém, não parecia chegar a lugar algum: o Big Brother continuava sendo denegrido Brasil afora, porém, seus participantes continuavam cada vez mais famosos, e o programa, com mais audiência. A curiosidade vencia a culpa da possibilidade de estarmos diante de um programa que não passava de um desperdício de tempo, ao vermos um grupo de anônimos disputar uma fortuna, confinados em uma casa, usando de intrigas cotidianas para passar o tempo e lutar pelo prêmio em dinheiro.



Malu Mader e Fábio Assunção: Clara e Renato



Então, veio a novela Celebridade, de Gilberto Braga, cuja estreia aconteceu em 13 de outubro. E a discussão sobre fama pareceu tomar um novo fôlego.

Analisada sob diversas óticas pelo autor, vimos o que significa ser famoso, o que significa ser célebre. As vantagens e desvantagens foram expostas, através de inúmeras citações, cenas, personagens e aparições ilustres, como Rita Lee, Lulu Santos, Zeca Pagodinho, os internacionais Simply Red e Alanis Morissette, que inclusive gravaram cenas com Malu Mader, que interpretou Maria Clara Diniz, produtora de shows de grande porte, tanto nacionais como internacionais.

Maria Clara, Fernando (Marcos Palmeira), Lineu Vasconcelos (Hugo Carvana) representavam a parte dos personagens que obtiveram o status de celebridade como fruto de seu trabalho duro: Clara como modelo e produtora, Fernando como cineasta e Lineu como dono de um grande grupo de comunicação. A fama dos holofotes, das fofocas, dos paparazzi para eles representava algo vulgar, e que eles rejeitavam. Conheciam o prestígio pelos seus feitos profissionais, não a fama vazia e gratuita.

Diferente das personagens de Deborah Secco e Juliana Paes, como Darlene e Jaqueline Joy, respectivamente, que buscavam fama a qualquer custo, sem razão, apenas em razão da beleza, do corpo, e demais futilidades. Personagens cômicas, ambas partilhavam do mesmo desejo, embora utilizassem de meios diferentes para tal. Darlene trapaceava, enquanto Jaqueline mantinha um limite para alcançar seu sonho.



Marcelo Faria e Deborah Secco: Vladmir e Darlene



Em uma terceira vertente, conhecemos a historia do bombeiro Vladmir, interpretado por Marcelo Faria. Bombeiro satisfeito com a profissão, que namora a deslumbrada Darlene, com objetivos opostos. Feliz em sua condição de vida, Vladmir repudia tudo que Darlene mais preza, porém, por forças do acaso e interferências nada honestas da namorada, Vladmir ganha a fama contra a vontade, o que também é corriqueiro em nosso dia-a-dia. Exemplos disso são as pessoas que tornam-se conhecidas devido a infortúnios como acidentes, crimes, e outras tragédias da vida humana. Elas despertam grande identificação com o público, e tornam-se, sem querer, heroínas ou vilãs da vida real, que tem sido tratada como entretenimento por diversos veículos há muito tempo.

Por outro lado, existe também a fama e influência como meio de poder, seja para alcançá-lo ou mantê-lo. Vimos isso através de Lineu, um magnata opressor, de Renato Mendes, um jornalista antiético e invejoso, editor de uma revista de fofocas, a prestigiada Fama, pertencente ao Grupo Vasconcelos, de propriedade de Lineu.



Laura e Renato: Vilões



Por último, temos a personagem de maior destaque da trama: Laura Prudente da Costa, interpretada pela carismática Cláudia Abreu. Pobre e batalhadora, Laura foi revelando ao longo da trama seus planos cruéis: conseguir prestígio para derrubar Maria Clara Diniz, por vingança. Devido a diversos mal entendidos, Clara apropriou-se de um bem que não era seu: os direitos da música Summer Spell, que acabou tornando-se uma grife, e rendendo à produtora uma fortuna, enquanto a mãe de Laura, dona da música por direito, sofria de formas miseráveis até morrer sozinha.  Seguiu-se então uma fantástica trama de vingança, algo que Gilberto Braga faz tão bem: Laura adquiriu poder, derrubou sua inimiga, e por um momento, o público chegou a sentir empatia por ela. O gancho tão esperado, onde Maria Clara, presa, vê, com surpresa, Laura, do outro lado da cela, oferecendo-lhe uma caneca e dizendo: “Quer café?” é inesquecível.

Celebridade teve outros momentos ótimos. Quando Clara decidiu se reerguer, presenteou a vilã com uma surra inesquecível, em uma grande cena. A vilã, entretanto, despertara também a fúria de Renato Mendes, que fora iludido e usado por ela. Ao final do mesmo capítulo, debilitada em um hospital, Renato chega, com seu charme irresistível, e olha para ela, sorrindo, com flores em suas mãos: “Pronta para outra, Laurinha?”

Um dos momentos mais divertidos da novela foi a “briga de gato e rato” dos vilões, que passaram a viver na mesma casa, em um jogo doentio. Renato fez Laura sua escrava, e passou a vigiá-la em todos os lugares aonde ia. Outro momento de sofrimento da vilã, que fora privada da presença do homem que amava, o michê Marcos, interpretado por Márcio Garcia. Em determinado momento, Laura vira o jogo, e faz de Renato seu refém, e passa a retribuir todas as humilhações que recebeu. E mais uma vez o público se divertiu, e até mesmo, torceu por Laura. Não desejavam mal à Clara, porém, compreendiam o ódio que Laura sentia.

Que ela merecia um castigo era inegável, pois seus crimes tornavam-se cada vez mais cruéis. A revelação de que ela tinha sido a assassina de Lineu Vasconcelos foi chocante para muita gente, pois, como vila absoluta da novela, estava acima de qualquer suspeita. No final, Laura, Marcos e Renato tiveram um fim aquém dos grandes personagens que foram, mas mostraram que nenhuma fama perdura sem prestigio e através de crimes e trapaças.



Deborah Evelyn foi Beatriz



Outros personagens que não podem ser ignorados são Beatriz, de Deborah Evelyn, mulher tresloucada e ingênua, que foi usada por Laura, e chantageada por diversos personagens da trama. Eliete, de Isabela Garcia, Inácio, de Bruno Gagliasso, Cristiano e Noêmia, interpretados por Alexandre Borges e Julia Lemmertz, e tantos outros, que se dividiam entre os éticos e os não tão éticos. Celebridade tinha ainda uma ótima trilha sonora, texto leve e divertido, e personagens carismáticos, que mantiveram a novela com fôlego em seus 221 capítulos.

Talvez o aspecto da fama que tenha ficado de fora em Celebridade, foi vivido por Deborah Secco em Insensato Coração, anos depois, através da personagem Natalie Lamour: o pós-fama, que não se sustenta por sua superficialidade, fazendo com que a celebridade perceba que tudo o que conquistou é passageiro – claro, a não ser que perceba que o que a tornou famosa não é um fim, e sim um meio. O mercado fabrica celebridades em velocidade e quantidade delirantes, e as de hoje serão esquecidas amanhã. Os verdadeiros famosos são aqueles que, por seus feitos, sejam estes bons ou ruins, jamais são esquecidos, e esta fama sim, é, se não eterna, muito mais duradoura.

Fica a esperança de ver outra vez esta novela inesquecível, que fala por si mesma!