quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Gabriela: um clássico em progresso...


Por Eduardo Vieira

Certo, não é um remake da novela, mas sim outra leitura do livro de Jorge Amado, Gabriela Cravo e Canela. Li o livro bem depois de assistir à obra prima de Walter George Durst, no horário das 22h00min na Rede Globo. A obra escrita é mesmo um mosaico de relações entre o coronelismo e outros estratos sociais como a igreja, o bar, o cabaré, a imprensa e a família, lugares os quais notamos as diferentes atuações dos personagens de acordo com o espaço.


Na novela, a personagem título aparece aos poucos, paralelamente à trama já em andamento, enquanto no livro a personagem surge mais abruptamente, sem uma apresentação minuciosa. Na verdade, o título parece mais um símbolo, uma metonímia das chamadas “mantéudas” daquela classe eminentemente masculina. Tanto na novela como no livro, um caso é um pretexto para que a ação se desenvolva: um coronel assassina sua esposa a sangue frio, uma mulher acima de qualquer suspeita, por legítima defesa da honra, o que acarreta uma discussão sobre os velhos costumes. Ao mesmo tempo, surge um engenheiro em Ilhéus, vindo de Salvador, que enfrenta o poderio de Ramiro Bastos, o líder dos coronéis, uma espécie de padrinho e benfeitor de todos, conquanto sua vontade seja feita, obviamente.

Mundinho Falcão (José Wilker), o engenheiro, vem se opor ao modo retrógrado como o líder lida com a economia do cacau, sugerindo mudanças um tanto radicais, tornando-se o líder da oposição.


Há na novela uma clara divisão, uma primeira parte em que antes da chegada de Gabriela, quem lidera o principal papel feminino da novela é Dina Sfat com sua inesquecível Zarolha, prostituta que deseja sair na procissão junto com as chamadas senhoras de família, o que causa uma estranheza, mexendo com o falso moralismo das pessoas na cidade. Ela também é o interesse romântico de Nacib (Armando Bogus), turco, dono do bar Vesúvio. Terminado esse início, a personagem de Dina, mesmo amada pelo público, despede-se tendo o seu destino cumprido.


Quem viu várias vezes a novela, como eu:  a primeira vez, os compactos, tem aquele medo “reginesco” do que pode vir de uma nova adaptação, ainda mais sendo de um autor que vem fazendo trabalhos bem mais ingênuos, o que já se pode afirmar ser uma característica dele. Falamos de Walcyr Carrasco.

Entretanto, a seu favor, há uma brilhante adaptação do livro ”Xica que manda” de Agripa Vasconcelos, transformado em uma novela que é um clássico da Rede Manchete, Xica da Silva, o que lhe confere uma certa credibilidade em tocar em temas mais sérios.

Importante dizer também que no romance, a personagem Jerusa (Nívea Maria), neta de Ramiro Bastos, um estupendo Paulo Gracindo, em um trabalho de composição, tem tanta ou mais importância que a rebelde Malvina, por se relacionar com o principal oponente de seu avô; porém, na novela, esta última, feita com perfeição pela jovem Elizabeth Savalla conquistou todos que vibravam a cada atitude voluntariosa da personagem contra o pai, o coronel Melque Tavares, como o primeiro ato que choca a cidade: Malvina comparece ao enterro de Sinhazinha, a mulher adúltera do início da história  e joga uma flor no caixão.


O que eu acho muito difícil de transpor, será além do elenco perfeito da novela que contava com nomes como Armando Bogus, Paulo Gracindo, Gilberto Martinho, Eloisa Mafalda, Dina Sfat, além da perfeita Sônia Braga, atriz que se confundia com a personagem, o clima que se traduzia pela excelente trilha sonora, uma das mais belas que já se ouviu em telenovelas, com temas cantados e instrumentais.


Acredito que por ser uma trama compactada, a tal novela das onze, o autor irá centrar-se mais no romance Nacib e Gabriela, com cenas um tanto ousadas, já que à época da novela vivíamos ainda uma censura, mesmo assim com cenas bem corajosas como as do casal central, outra cena de nu com os atores Pedro Paulo Rangel e Cidinha Milan, muito bem feita por sinal, em que apenas se entrevê e imagina-se a nudez dos dois e ainda as cenas da personagem Sinhazinha com o dentista Osmundo Pimentel, respectivamente, a grande Maria Fernanda e o ator João Paulo Adour, habituée nas novelas da época, em uma das cenas-chaves da história.


Penso que o autor não vai ser o mesmo Walcyr das novelas de época, com parentesco com as comédias de costume como as do brazuca Martins Pena e do francês Moliére, de quem ele fez uma adaptação excelente de “O Doente Imaginário”, mas deve trazer um pouco daquilo que aprendeu com Walter  Avancini, diretor da novela, com quem trabalhou em Xica da Silva, ou seja terá que ter uma mão mais pesada para fazer uma obra que não seja covardemente comparada à obra prima original. Quem ganha com isso, além dele, são os espectadores que têm vontade de saber um pouco desse universo de Jorge Amado. Torçamos, pois!


A Equipe de Gabriela se "inspirando"!
Imagens: Portal Globo.com
Google Imagens
Vídeos: Canal Mofo TV (You Tube)
Canal Baú da TV (You Tube)

21 comentários:

  1. Muita expectativa para conferir se Walcyr vai abandonar seu tom farsesco (também presente em "Xica da Silva") para apresentar uma trama mais sóbria. Confio plenamente na condução do Talma, que idealizou brilhantemente a nova versão de "O astro". Mais um ótimo texto do Edu recheado de lembranças autênticas. Parabéns!

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  2. Ótimo texto!!! Coisa de quem entende da novela. Parabéns! Mas, afinal, quem fará a personagem-título?
    Robério

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  3. Parabenizo o "Posso contar contigo" pelos brilhantes textos apresentados. Conheci o Blog através do Isaac Abda e tornei-me figura assídua por aqui. Parabéns a todos os colaboradores. Quanto a "Gabriela" estou doido para brindar o sucesso real e já esperado. O post acima já aguça a vontade de assistir ao folhetim. Grande abraço a equipe da página.

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  4. Adorei. Incrível ver que as relações sociais de mais de 30 anos (algumas se perpetuam) continuam, com outras máscaras, com ou sem disfarces. Parabéns Edu.

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  5. Ansioso pela adaptação de Walcyr, espero que tudo ocorra da melhor forma. Eu li o livro, maravilhoso por sinal, mas pelo o que entendi Gabriela é menina recém saída da adolescência e Juliana Paes já está na casa dos 30.
    Mas enfim, novela é uma obra aberta tudo pode acontecer, rs!"

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  6. Gabriela de 1975 é um grande clássico da teledramaturgia; recentemente fiz download da novela, pretendo vê-la antes que comece a nova adptação do livro de Jorge Amado pelo Walcyr Carrasco.
    Acho que o estilo que o novelista tem apresentado nada combina com o universo politizado e baiano do Jorge Amado, mormente a cultura cacaueira de Ilhéus retratada no livro Gabriela, Cravo e Canela. Mas torço para que deixe de lado o seu estilo cômico pastelão que o consagrou e faça algo realmente compatível com a obra do escritor: que o seu lado mais arrojado, como o de Xica da Silva da extinta Manchete se faça presente na sua Gabriela às 23 horas na Globo.
    Parabéns pelo belo texto e pela análise da obra, Eduardo, especialmente por compartilhar conosco suas lembranças da época.

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  7. Muito bom o texto. Realmente se vê um grande conhecimento de sua parte na área. Gostei demais, principalmente os detalhes. Parabéns!

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  8. Parabéns pelo texto, Edu!
    Estou vendo a novela pela primeira vez. Falta o último DVD.Estranho mesmo como a Gabriela do título tem pouca função na trama. A personagem por si só é simplória, desprovida de inteligência, tem pouco a oferecer. Bem mais ativas são Jerusa e Malvina.
    Adorei essa versão, embora eu ache que ela não daria certo hoje em dia. É extramamente parada para os moldes das novelas atuais, focando mais nas intrigas entre os coronéis e a "oposição". Precisa de uma grande mexida, uma adaptação com mais ação. Nao vai ser difícil, já que na época muita coisa nao pôde ser exibida mesmo. Só precisa de um elenco a altura do dessa primeira versão, como você mencionou.

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  9. Belo texto Edu!
    Bem curioso com essa nova adaptação!!

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  10. Não assisti a essa novela, vi apenas algumas cenas e também estou curioso pelo que vem por aí, mas tenho expectativas boas com relação ao que possa estar preparando o Walcyr e sua equipe.

    Edu, como sempre você fez um texto primoroso... parabéns, querido!

    Obrigado a todos vocês que sempre prestigiam o Posso Contar!

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  11. Belo texto, Edu.
    Vi a versão compacta que passou em 89 e a novela é cheia de cenas icônicas como chegada de gabriela e a chuva, a cena do telelhado etc. Minha maior preocupação tb é com a trilha sonora. Naquela época foi feita com canções escritas especialmente pra novela e até hoje eu considero uma das melhores.
    Fiquei curiosa com a personagem da Nívea Maria que vc citou.

    bjs

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  12. flavia alessandra deveria ser a gabriela mto mais bonita e talentosa que a juliana paes e merecia uma protagogonista

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  13. Gostei do texto, Edu. Realmente quando falamos em adaptações de livros, não podemos esquecer que Walcyr Carrasco é o autor de Xica da Silva. Mas é muito sensível em seus trabalhos a ausência de Walter Avancini e com isso eu vejo que ele pode sim pender para a originalidade. A mim o que mais me dá medo é o elenco.

    Pelo seu texto dá a maior vontade de assistir a primeira versão de Gabriela que, pelo que entendi, foi um clássico que tratou de regionalismo e coronelismo temas que até o fim dos anos 90 eram sucesso garantido em novelas.

    Bjão!!!

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  14. Quis dizer pender para a ingenuidade. hehehe

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  15. obrigado a todos que postaram...é importante pra quem escreve ver que as pessoas não estão indiferentes...acho que aqui e espaço pra falar bem, pra retificar...mas, snceramente, a gente espera mesmo e um elogio... kkkkkk porém, puxões de orelha bem fundamentados tb fazem parte. Muito obrigado a quem veio aqui colocar sua opinião sobre o texto ou a novela,ou os dois. Abços Edu

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  16. Infelizmente, o que acho que pode pegar na adaptação atual é exatamente a falta da censura! O Astro virou sexo do começo ao fim, sem limites... e sem levar a nada (ou quase). A edição da mesma foi tão rápida que faltava essência, clima. Voltando à Gabriela original, quanto ao elenco, bem... foram poucas as novelas em que o elenco esteve tão entrosado... praticamente todos os personagens fizeram sucesso, pois Walter George Durst soube escrever e Avancini orquestrou tudo de forma brilhante. Até o Zé Wilker, contrariando toda sua preguiça habitual, atuou! Mas também... com todos aqueles monstros ao lado, não dava para dar moleza.

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  17. Edu, parabéns pelo texto! Muito bom!

    Quanto à obra em si, confesso que não me interessa tanto, mas lendo uma descrição rica como essa, como sempre, minha curiosidade foi aguçada.

    A respeito do comentário do Flávio, concordo que a nudez na TV, em minha opinião, deve ter uma finalidade clara para ser utilizada como recurso. Agora, o que deve existir nesses casos não é censura, e sim bom senso dos envolvidos na obra.

    Mas enfim, de qualquer forma, O Astro foi o primeiro investimento em um novo jeito de se fazer novela. Muito será corrigido e aperfeiçoado daqui em diante, como sempre.

    Vamos aguardar!

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  18. Dênis, a novela antiga vale a pena ser baixada e se possível ler o livro depois...ou ao contrário...a novela é uma obra prima..o Walter George Durst foi um dos grandes autores que fez Nina e Tocaia Grande, na Manchete, tb uma grande novela.

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  19. Edu
    Maravilhoso texto!!! Embrora viva brincando e te chamando de Televino, sei que vc tem uma veia excelente para a crítica literária, através de novelas.NOVELA É UMA BELA FORMA DE CULTURA NESSE PAÍS!!!E vc, traduziu muito bem isso no seu belo texto. Parabéns!Simplesmente o MÁXIMO!!!!

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  20. Parabéns pelo texto Dudu!!!!
    abraços
    Mimi

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