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sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Uma história de rainha, fada e Mara Maravilha

Por Adilson Oliveira

Era uma vez, num tempo em que i-pods, i-peds, tablets, notebooks, celulares e outras ferramentas essenciais de comunicação não existiam, as pessoas comunicavam-se, quase sempre, face a face. Eram tempos difíceis! Como não havia internet residencial, as TVs reinavam absolutas na sala de estar e as famílias reuniam-se diante delas no horário nobre para assistirem às novelas e aos telejornais. De dia, as crianças, quando não estavam na escola, tinham um encontro com rainhas, fadas e bruxas. Eram tempos de conto de fadas. Na TV, os papéis já estavam pré-determinados: Xuxa era a rainha absoluta das manhãs da Globo e Angélica,  a fada loira da Manchete. 
No SBT, Mara Maravilha assumia o papel de vilã, pois não tinha a aparência destinada pela mídia às heroínas das histórias maravilhosas. As crianças não podiam torcer pela bruxa e era papel das mães zelarem pelos bons costumes dos seus filhos, afastando-os das más influências. A mídia cumpria autoritária e religiosamente o seu papel, destacando nas revistas e jornais as benemerências das heroínas televisivas. Quanto à outra? Xiiiiii! - advertiam as mães - cuidado, ela é uma feiticeira malvada, que vive sempre ao lado de uma mãe maquiavélica.
Não sei bem o porquê,  mas, contrariando a ordem institucionalizada,  eu me identificava com aquela moça de cabelos negros (como a asa da graúna), de olhos negros e de fala nordestina. Era uma espécie de Iracema do tão-tão distante século XX. Mas ela é tão perigosamente brasileira? As crianças não podem gostar dela! Eu gosto. Respondia aos porquês incrédulos de todos. Gosto e ponto final. Não preciso dizer os motivos pelos quais eu torço por aquela que é representada como a arqui-inimiga das princesas blondies.
Essa criança precisa ser castigada, diziam - face a face - os adultos. Como pode romper com o senso comum? Veja as provas:
- "A guerra pelos baixinhos da Xuxa" (Contigo!).
- "Nunca fiz feitiçaria" (Contigo!).
- "Mara acusada de ter feito magia negra" (Contigo!).
- "Mara e Angélica caem nas teias da magia negra" (Contigo!).
- "Angélica em risco de vida - Mara acusada de ter feito magia negra" (Contigo!)
- "Globo recusa a voz de Mara para cantar tema de Salomé (Amiga).
- "Macumba de Mara complica vida de mãe-de-santo (Amiga).
- "A baianinha Mara declara guerra à Xuxa" (Folha da Tarde).
- "Angélica acusa Mara de plágio" (Amiga).
- "Arrogância de Mara e sua mãe tirou baianinha do SBT" (Diário popular).
- "Mara Maravilha volta a xingar e agredir jovens" (Diário popular).
- "Mara é acusada de agressão" (Folha da Tarde).
- "Mara pode pegar até um ano de prisão" (Contigo!).
- "Mara é acusada de roubar amigo cego" (Notícias Populares).
- "Mara ameaçada de sequestro" (Amiga).
- "Mara Maravilha ameaçada de morte" (Contigo!).

Não havia, naquele tempo, i-pads, i-pods, celulares, tablets, notebooks, mas havia a interação face a face. Pena que os mais fracos (como crianças) nem sempre eram ouvidos, pois havia uma bruxa má de boca grande - chamada Mídia - que engolia aqueles de quem ela não gostava.
Eram tempos difíceis, mas, pelo menos, eram tempos de rainhas, fadas e de Mara Maravilha. Eram tempos de criança.


Adilson Oliveira é professor universitário, roteirista, poeta e apaixonado por corujas.


terça-feira, 24 de setembro de 2013

A dramaturgia da Record em retrospecto

Prestes a completar dez anos, investida em novelas reúne vitórias e derrotas.


Por Duh Secco, blogueiro convidado.

Prestes a completar sessenta anos de história, a Record vive um momento de intensa euforia e demasiada apreensão. A boa repercussão de Pecado Mortal, estreia de Carlos Lombardi na emissora, parece ser fundamental para determinar a continuidade de seu núcleo de dramaturgia. Uma saga que se iniciou há praticamente dez anos e que, por ocasião do aniversário da emissora, e do convite que me fora feito pela equipe do Posso Contar Contigo?, rememoro nesse texto.

No final dos anos 90, a Record recorreu à produtoras independentes para inaugurar sua faixa de dramaturgia, às 20h15. Surgiram boas novelas, como Estrela de Fogo, Louca Paixão e Tiro e Queda. O fraco desempenho desta última, no entanto, motivou a emissora a investir em produções próprias. No entanto, após Marcas da Paixão, Vidas Cruzadas e Roda da Vida, o departamento teve suas atividades suspensas, por conta da escassez de autores e da baixa audiência. (Leia meu texto “Os Outros Tempos da Record” , publicado em meu blog Agora é Que São Eles).

Em 2004, um novo tropeço vindo de produtoras independentes, a mal fadada Metamorphoses, e a obstinação em se aproximar (e até tomar a liderança) da Globo, motivou uma nova investida nas produções caseiras, marcada por altos e baixos.


Para arrebatar o público, tão logo deu início ao seu núcleo de dramaturgia, a Record foi buscar inspiração na Globo. Tão logo contratou o diretor Herval Rossano, tratou de providenciar a nova versão de um clássico já dirigido por ele nos anos 70, para a faixa das 18h da emissora carioca: A Escrava Isaura. Tiago Santiago e Ana Maria Nunes assinaram a adaptação, que trouxe em seu elenco nomes como Rubens de Falco e Norma Blum, que participaram da novela em 1976. Apesar do texto piegas, A Escrava Isaura se consagrou em um grande êxito de audiência, talvez por conta de sua produção esmerada, do elenco competente, onde se sobressaíram Patrícia França (Rosa) e Ewerton de Castro (Belchior), e da concorrência da insossa Começar de Novo, cartaz da Globo às 19h. Chamou a atenção as cenas de nudez de Leopoldo Pacheco (excelente como o vilão Leôncio) e Gabriel Gracindo (Henrique), por serem exibidas em um horário relativamente cedo e em uma emissora comandada por uma igreja evangélica. O sucesso foi tanto que menos de sete meses após o término da novela, a Record passou a reprisa-la, em horário nobre.


Para substituir A Escrava Isaura, a Record foi buscar outro texto já adaptado pela Globo: Senhora, de José de Alencar. Unida às tramas Lucíola e Diva, do mesmo autor, através da sinopse desenvolvida por Marcílio Moraes e Rosane Lima, Essas Mulheres nos trouxe uma produção esmerada, texto inspirado e elenco soberbo, se consagrando em uma das melhores produções da Record nesta nova fase. O desenrolar dos acontecimentos sempre colocava as protagonistas Aurélia (Christine Fernandes), Mila (Míriam Freeland) e Lúcia (Carla Regina, agora Cabral) nas mesmas situações. As sequências se convertiam em cenas belíssimas, como quando tivemos as três senhoras enclausuradas: Aurélia em um convento, Mila no manicômio e Lúcia na prisão. Nem tudo, entretanto, foram flores: Herval Rossano, que estava encarregado da direção, se desentendeu com a emissora e migrou para a Band, deixando sua tarefa nas mãos de Flávio Colatrello Jr., antes mesmo do início da trama.


A novela seguinte abandonaria os cenários de época para ambientar sua ação no Rio de Janeiro contemporâneo. Prova de Amor, adaptação de Tiago Santiago para um texto de Teixeira Filho, começou interessante, com um elenco de fazer inveja à algumas produções globais. Nomes como Lavínia Vlasak, Marcelo Serrado e Leonardo Vieira encabeçavam a produção. Marcou também o início das atividades do Recnov, complexo de estúdios da emissora, hoje sob a ameaça de ser desativado. A audiência explodiu, roubando preciosos pontos de Bang-Bang, com quem disputava na faixa das 19h, e do então imbatível Jornal Nacional. Os sucessivos espichamentos, no entanto, desgastaram a trama, cuja fórmula nortearia outras novelas do canal.


Satisfeita com o sucesso de audiência de suas produções, a Record lançou mão do seu segundo horário de novelas. Lauro César Muniz retornava à emissora, onde trabalhou nos anos 70, com Cidadão Brasileiro, que se iniciava às 20h15, tão logo Prova de Amor chegava ao fim. Era a história de Antônio Maciel (Gabriel Braga Nunes) ao longo de 30 anos de sua vida. Apaixonado por Luiza (Paloma Duarte), acaba se casando com Carolina (Carla Regina), enquanto sofre a influência nefasta da misteriosa Fausta (Lucélia Santos). A produção fora tumultuada, devido à saída de Flávio Colatrello Jr. (o mesmo que apagara o incêndio em Essas Mulheres) da direção. Mesmo assim, Cidadão Brasileiro se revelou uma grata surpresa. Adorava o envolvimento da professora Tereza (Luiza Tomé) com o jovem Marcelo (Bruno Ferrari), alvo do amor de sua filha Eleni (Maitê Pyragibe), jovem idealista que ingressaria na luta contra a ditadura; o romance do jornalista Homero Salles (Tuca Andrada) com Laís (Fernanda Muniz), esposa do todo-poderoso Atílio Salles Jordão (Floriano Peixoto); e a riquinha Renée (Danni Carlos), apaixonada por um perseguido político. Cenas marcantes ficaram na minha memória: Carolina tirando a calcinha e a jogando para Antônio, Celso (Leonardo Brício) e Emílio (Rubens Caribé) brigando em cima de uma canoa, o que resultou na morte do segundo; Lívia (Luiza Curvo) seduzindo o prefeito Laércio (Kito Junqueira) em um local ermo; o suicídio de Júlio (Cecil Thiré); e Manuela (Françoise Forton) matando o marido Otávio (Luiz Carlos Miéle) a pedido do próprio.


Ao lado de Cidadão Brasileiro, Bicho do Mato, substituta de Prova de Amor, formou uma dobradinha que me prendeu na tela da Record. Ao menos durante os primeiros meses da trama, quando o texto ainda estava sob o comando de Cristianne Fridman e Bosco Brasil. Trazendo as belezas do Pantanal, Bicho do Mato nos brindava com imagens belíssimas que adornavam o romance de Juba (André Bankoff) e Cecília (Renata Dominguez). Angelina Muniz, Beatriz Segall, Denise Del Vecchio, Regina Dourado, Ana Rosa, Jonas Bloch e Ana Beatriz Nogueira também figuravam no grande elenco que encabeçava a produção. Mas os números de audiência não responderam como previsto e Tiago Santiago fora chamado para intervir no texto, o que transformou a novela numa sucessão de cenas de ação e sofrimento, fazendo com que eu abandonasse a trama em seu terço final.


Alterações policialescas também comprometeriam de Alta Estação, única produção das 18h exibida na Record, em um tempo em que honraram a promessa de ter três horários de novelas, tal e qual a líder Globo. Com uma aura que lembrava Friends, Alta Estação nos trouxe o divertido casal Caio (Guilherme Boury) e Renata (Andréa Horta), responsáveis por eu me manter fiel à novela até o fim, já que as mudanças que trouxeram mais ação para a trama (seguindo a cartilha de Tiago Santiago) deturparam completamente a sinopse desenvolvida por Margareth Boury.

A violência serviria como chamariz de audiência para Vidas Opostas, de Marcílio Moraes, novela que substituiu Cidadão Brasileiro às 22h (último horário no qual a trama figurou). Dessa vez, contudo, diferentemente do que acontecera nas novelas anteriores, a violência estava inserida dentro de um contexto, já que a trama se passara numa favela e trazia em seu enredo a guerra entre traficantes, policiais e a sociedade. Vidas Opostas pode ser considerada com a mais trama de maior êxito da Record neste período, tamanha foi a sua repercussão, audiência e os prêmios que conquistara.


Ao contrário de Vidas Opostas, Luz do Sol, única novela de Ana Maria Moretzsohn na Record, passaria em brancas nuvens. A trama, demasiadamente lenta e insossa, não empolgou. O acerto foi a direção de Ivan Zettel, que nos brindou com belas sequências no início, quando a menina Drica (posteriormente vivida por Luma Costa) fora sequestrada. Luz do Sol ainda disputou audiência com o sucesso Paraíso Tropical, numa época em que a novela das 19h da Record, tamanha foram as suas mudanças de horário, era exibida às 21h.


As tramas posteriores das 21h e 22h trocariam de horário, confundindo e afugentando o público da Record. Caminhos do Coração, primeira trama de Tiago Santiago às 22h, fora um sucesso. Tornou-se febre entre o público infanto-juvenil, com sua história repleta de seres extraordinários, os mutantes. Os efeitos especiais dominavam a cena e comprometeriam seriamente o desenvolvimento da novela. Ainda assim, a audiência se manteve fiel e a Record usou a novela como arma para limar a estreia de A Favorita, na Globo.


No dia da tal estreia, Caminhos do Coração exibia seu último capítulo, em um horário diferente do que fora exibida e no qual suas próximas temporadas seriam veiculadas. Na vaga de Caminhos do Coração, às 22h, a Record encaixou Amor e Intrigas, então cartaz das 21h. A sinopse de Gisele Joras fora vencedora de um concurso que a Record promoveu na busca por novos roteiristas. Não emplacou logo de cara, mas arrebatou a audiência em seu terço final. A trama, no geral, apesar dos inúmeros clichês, se mostrou agradável. Destaque para Esther Góes, com a vilã Dorotéia, personagem à altura de seu talento. E para Jonas Bloch, o Camilo, que vivia a dor da perda de sua mulher, Marília, um sensível trabalho de Sylvia Bandeira.


Os Mutantes, que usava Caminhos do Coração como subtítulo, não teve a mesma sorte de Amor e Intrigas. Em novo horário, Tiago Santiago continuava dando amostras de sua fantasia desmedida. Os mutantes se proliferavam, a trama se arrastava diante de poucos apelos, e audiência começou a degringolar, se distanciando dos números que assustaram a Globo, que viu A Favorita capengar em seu início. Para apagar o incêndio, Os Mutantes daria lugar à Promessas de Amor, derradeira temporada da saga fantasiosa, que preteria os seres geneticamente modificados a favor do romantismo do casal vivido por Renata Dominguez e Luciano Szafir. Não vi absolutamente nada desta novela. Para mim, tratava-se da pá de terra definitiva sobre um produto que já havia chegado ao fim com o último capítulo de Caminhos do Coração. Nada mais havia a ser mostrado e a insistência da Record na trama provou que eu, e grande parte do público, estávamos certos. A novela provocou a saída de Tiago Santiago da emissora. E o início da parceria com a mexicana Televisa.


Textos mexicanos adaptados para a realidade brasileira não eram novidade na nossa TV. O SBT havia utilizado esse expediente por anos, tendo como parceira a mesma Televisa. Na Record, os produtos eram melhor acabados. Mas ainda assim, não passaram impassíveis de comparações com o original. Principalmente Bela, A Feia, cuja versão mexicana havia sido exibida recentemente no SBT, e a colombiana, que deu início a todas as outras, fez muito sucesso na Rede TV!. A bela que era feia, nesta versão, foi muito bem interpretada por Gisele Itiê. Mas quem se sobressaiu mesmo foi Bárbara Borges, como Elvira, a irmã brega de Bela, cujo bordão “Patê com pão” fora repetido tantas vezes que chegou a cansar. Assim como a novela, submetida a constantes espichamentos; dentre eles, o que a colocou como tapa-buraco ente o final de Poder Paralelo e o início de Ribeirão do Tempo, levando a Record a manter apenas um único horário de novelas.

Antes de Poder Paralelo, no entanto, pudemos conferir Chamas da Vida. Ótimo trabalho de Cristianne Fridman, a novela que focava no universo dos bombeiros usou de um dos signos da teledramaturgia da Record à exaustão: os capítulos de quarta, que costumam registrar maior audiência por competirem com o futebol, sempre eram preenchidos com atos heroicos dos bombeiros. Incêndios não faltaram nesta novela que trouxe a sanguinária Vilma como vilã, em um fantástico trabalho de criação de Lucinha Lins, tanto na fase em que ela atuava como incendiária, como quando fora descoberta a existência de um segundo incendiário, que a assombrava.


Chamas da Vida fora substituída por Poder Paralelo, segundo trabalho de Lauro César Muniz na emissora. Voltada para o mundo do narcotráfico, a novela seguiu a cartilha da Record e nos trouxe cenas de ação e violência. Mas Lauro sabe conduzir suas tramas com a maestria e impediu que as repetições levassem o público à exaustão. Um misterioso assassino executou diversos personagens na fase final, brindando o público com sequências de suspense e mistério. O único fator que jogou contra a trama: a insistência da Record em privilegiar a faixa de shows (e nos últimos tempos, a de jornalismo) em detrimento à teledramaturgia. Poder Paralelo chegou a entrar no ar próximo da meia-noite, o que impede o público de se fidelizar a uma novela.


Após o término desta e a tomada do horário por Bela, A Feia, a Record estrearia Ribeirão do Tempo, de Marcílio Moraes. O autor voltava a calcar sua história em uma crítica social, desta vez usando a cidade que dava título à novela como uma espécie de microcosmo do Brasil. Lá, políticos corruptos eram perseguidos por organizações cujo intento, embora parecesse honesto à princípio, era tomar o poder para continuar a manter tudo como está, ou até mesmo deixar as coisas ainda piores. O Professor Flores (Antônio Grassi) e o senador Nicolau (Heitor Martinez), que assumira o cargo após matar o próprio pai, de quem era suplente, dominaram a ação. Destaque também para Caio Junqueira, como o atrapalhado detetive Joca, e Taumaturgo Ferreira, o Querêncio, que, de bêbado, passa a prefeito da cidade após enriquecer.


A Record tornaria a investir em um segundo horário de novelas, enquanto Ribeirão do Tempo estava no ar. Às 19h30, no mesmo dia em que a Globo estreava Morde & Assopra, a emissora levava ao ar a sua segunda adaptação mexicana, Rebelde. O título já conhecido pelo público chegou a empolgar no início. Mas as repetitivas situações do texto de Margareth Boury, como os encontros sempre similares do professor Vicente (Eduardo Pires) e Becky (Lana Rhodes) acabaram afugentando o público (eu, inclusive). Ainda que sem história para contar, a Record decidiu dar sobrevida à novela, em uma segunda temporada. A situação se agravou e a derrota para Carrossel, do SBT, serviu para que o segundo horário fosse abandonado mais uma vez.


Mas a crise chegaria ao horário remanescente. Após Vidas em Jogo, substituta de Ribeirão do Tempo, a emissora não veria mais as suas novelas atingirem os dois dígitos. A novela de Cristianne Fridman se saiu bem na audiência, embora já demonstrasse o desgaste da fórmula marcada por perseguições e tiroteios e do excessivo número de capítulos (quase todas as tramas, a partir de Prova de Amor, passaram a terminar com mais de 200 capítulos).


Máscaras, a substituta, foi mal concebida por Lauro César Muniz. Esforços para salvar a trama não faltaram, incluindo até mesmo a substituição do diretor, Ignácio Coqueiro. Mas havia pouco a ser feito. A produção conturbada levou o elenco a se posicionar contra uma possível perseguição da imprensa. Com a trama em declínio, a Record apressou a produção de sua substituta, Balacobaco.


Embora tenha elevado ligeiramente os índices, Balacobaco foi um desperdício de tempo. Gisele Joras enveredou por um caminho perigoso: o da repetição. Todas as tramas e personagens vistos em sua novela já haviam figurado em seus dois trabalhos anteriores. Um colorido excessivo, que buscava lembrar os sucessos globais Cheias de Charme e Avenida Brasil, tornou a novela ainda mais desinteressante. Como solução, o número reduzido de capítulos, que seriam ainda mais reduzidos na produção seguinte.


Dona Xepa estreou com a missão de durar pouco mais de três meses. Sai do ar nesta terça, para dar lugar a Pecado Mortal. No tempo em que ficou no ar, não apresentou grandes feitos, mas também não fez feio. Gustavo Reiz soube conduzir os textos, embora todas as situações criadas para a novela ficassem melhor em um projeto levado ao ar mais cedo. Ângela Leal segurou muito bem sua Xepa e conquistou grandes momentos ao lado de seus dois filhos, Arthur Aguiar (Edson) e Thaís Fersoza (Rosália). Angelina Muniz também foi um destaque à parte como Pérola. A direção de Ivan Zettel, no entanto, continuou abusando de efeitos já vistos em Rebelde, que tornavam os capítulos engraçadinhos demais.



Quanto à Pecado Mortal, resta torcer pelo seu sucesso. O elenco é bom, o autor melhor ainda, e a direção de Alexandre Avancini promete boas sequências. Que tudo sejam flores nesta nova produção. A dramaturgia da Record e o mercado de trabalho para autores, diretores, técnicos e atores agradecem. O público, mais ainda!


Duh, muito obrigado pela solicitude. Texto excelente!
Duh Secco é fisioterapeuta. Atua na área, mas tem paixão mesmo é pelos roteiros. É colunista do blog Agora é Que São Eles, em parceria com Guilherme Staush. Sobre as novelas da Record, escreveu análises em seu blog, que você pode conferir logo abaixo.

Sobre Máscaras.
Sobre Rebelde.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Saudade daquela Alta Estação de 2006

Murilo Pitombo, um amigo apaixonado pela novela Alta Estação, é o nosso blogueiro convidado. Desde já o agradeço. Vamos relembrá-la?!  


No dia 17 de abril de 2006, um pouco depois das seis da tarde, estreava na tela da TV Record, a primeira novela solo da roteirista Margareth Boury. A primeira produção da emissora, voltada para os jovens. Alta Estação (que seria “E aí?”) estreou cheia de expectativa, com a missão de levar o público jovem para a Record, e também com a função de revelar novos nomes para a dramaturgia do canal.


Margareth chegava ao canal, para reforçar o banco de autores, depois de anos na TV Globo e com vários trabalhos colaborando com o rei das sete, Carlos Lombardi. Dona de um diálogo sagaz e com uma forte pegada de humor, Margareth soube mostrar para o que veio, com essa novela feita para um público, o qual ela conhece muito bem.


Alta Estação foi uma novela divertida, com gente bonita e que falava a mesma língua dos jovens. Estrelada por Ariela Massoti, Lana Rodes, Andréia Horta, Daniel Aguiar, Vergniaud Mendes e Guilherme Boury, a novela trazia as dúvidas, intrigas e situações rotineiras comuns na vida dos seis jovens, que acabam se tornando amigos inseparáveis. O humor permeava toda a trama. Impossível não ri com as trapalhadas do Caio e seu bordão “meu querido”; As loucuras da Flávia, que quase sempre aparecia com um novo namorado/ficante; As paranoias da Renata e a difícil relação entre Eduardo, Bárbara e Ricardo. O elenco contava também com Cláudia Alencar, André Mattos, Eliete Cigarini, Roberto Pirilo, Cassia Linhares, Fábio Lago, Nathália Rodrigues, Rocco Pitanga, Jorge Pontual, Norma Bengell, João Vitti, Lucas Cotrim. Participações de André Bankoff, Bruno Gissoni, entre outros.


Recordo que muitos amigos meus, que nunca tinham assistido novela em outro canal, acabaram mudando para ver Alta Estação. Até hoje me lembro de várias cenas, entre elas, uma em que Renata, interpretada pela brilhante Andréa Horta, está bêbada por conta de uma desilusão amorosa e começa a chorar e cantar, sentada em uma escada. Dona Regina, síndica do prédio onde moravam as garotas, foi uma das inúmeras personagens que ganharam destaque no decorrer na trama. As cenas entre ela e William, foram brilhantes e recheadas de humor.


Alta Estação estreou com a previsão de ficar quatro anos no ar, porém foi exibida por apenas nove meses. A baixa audiência foi um fator que ajudou no precoce cancelamento da novela. Mas há que se dizer, as constantes mudanças de horário e a intervenção da direção da emissora, nos rumos de algumas tramas, contribuíram para afastar os espectadores que acompanhavam a trama. Quando os diretores do canal resolveram deixar a autora trabalhar como ela realmente havia planejado, já era tarde. A novela não conseguiu reconquistar o público perdido e foi bruscamente encurtada.
Vários dos protagonistas da novela seguem como atores bem sucedidos, tanto na Record quanto em outros canais.
Mesmo com o “fracasso” de audiência de Alta Estação, Margareth Boury não perdeu prestigio junto à emissora e anos depois escreveu a adaptação de Rebelde, que obteve maior êxito em faturamento e audiência. Porém, também sofreu com as constantes mudanças de horário. De 14 pontos no ibope, caiu para 3.
É muito bom poder relembrar aquela novela solar, vibrante, jovem... Alta Estação! 



Murilo Pitombo é estudante de Comunicação Social – Rádio e TV, na UESC. Ator e escritor. Fã dos autores Lauro César Muniz, Margareth Boury e Manoel Carlos. 

domingo, 15 de setembro de 2013

Joia Rara - Uma nova revolução estética na história da telenovela brasileira

Pedi ao querido Bruno Fracchia que evidenciasse as suas impressões sobre o capítulo de estréia de Joia Rara. Ele topou. Desde já o agradeço. Confiram!


Não bastasse contar no elenco com as musas da minha vida (Cláudia Ohana, Letícia Spiller e Mariana Ximenes), as lindas e envolventes chamadas de “Joia Rara” me levaram a me programar para estar em casa em condições de assistir ao primeiro capítulo da novela. Não me arrependi. 


Quem estuda a telenovela brasileira, sabe que há alguns “marcos zeros”: 24599 Ocupado” , “Beto Rockfeller”, “Guerra dos Sexos”, “Pantanal” são alguns exemplos. Sem receio do equívoco, tenho convicção de que “Joia Rara” entra para esta seleta lista.
“Marcos zeros” evidentemente são conceitos didáticos para facilitar estudos e que, em geral, são o ápice de uma construção que já se desenhava: antes de “Beto Rockfeller”, por exemplo, a novela “Antônio Maria” já apresentava personagens populares em papel de destaque e linguagem cotidiana. Mas o que se desenhava explodiu na mítica novela da TV Tupi. Logo, “Marcos zeros” são mais do que necessários e contém seus méritos únicos.

Da mesma forma, em “Avenida Brasil” e “Cordel Encantado” a imagem televisiva próxima da estética audiovisual, com primoroso trabalho de luz e enquadramentos fora do habitual já foram utilizados. No entanto, este primeiro capítulo de “Joia Rara” (não por acaso obra com direção geral da diretora de “Avenida Brasil e “Cordel Encantado” e escrita pela dupla de autoras da segunda trama) potencializou demais este recurso, dando condições para que esta obra seja considerada um novo marco zero! 
O que vimos no primeiro capítulo de “Joia Rara” foi o maior exemplo já visto na televisão brasileira de hibridização de linguagens (É cinema? É vídeo?), ficando firmemente “terreno na desterritorialização” de linguagens.


Os estudos acadêmicos e críticas bem fundamentadas sobre telenovelas felizmente vem aumentando. No entanto, desconheço algum que trate da evolução da imagem na telenovela e da análise do trabalho da direção. Que alguém num futuro breve se atreva a esta tarefa!
Através de enquadramentos já existentes em “Avenida Brasil” e também apresentados no capítulo de hoje, Amora Mautner se afirma como uma diretora da linhagem de um Walter Avancini: ambos trabalham num produto “fabricado em série”, mas nem por isso deixam de imprimir marcas autorais!


Os anos 80 testemunharam o retorno da telenovela aos estúdios, deixando pouco espaço para a linguagem imagética. Já os anos 2000 viram a quase total exclusão dos temas políticos. “Joia Rara” em seu primeiro capítulo aponta com força e esperanças para esta saída da camisa de força dos estúdios, a revitalização da linguagem plástica do produto televisivo e a volta dos temas políticos (através da existência de personagens inseridos no Movimento Operário do início do século).


Gênero não se reinventa  Gênero se renova. Na televisão, assim como no cinema e no teatro, tentativas pretensiosas de reinventar os gêneros sempre fracassam quando partem para a ignorante negação de tudo o que já foi feito. Nega-se uma estética anterior a um dado período, por exemplo, mas retornando a conceitos de períodos ainda mais antigos para se propor algo novo (no sentido de revitalização). Desta dialética necessária é que poderá surgir uma síntese a apontar para o futuro: a fotografia e a direção de pouco valeriam se não houvesse no ar uma trama com elementos clássicos de telenovela (tanto que os olhos deste escriba lacrimejaram quando o casal protagonista – Bianca Bin e Bruno Gagliasso (nosso Al Pacino brasileiro – pelo tamanho e pelo talento) se encontraram.


Falando em hibridizações, a última novela das 18h com potencial para às 21h foi “Força de um Desejo” (há 13 anos). “Joia Rara” rasga também esta divisão, necessária comercialmente, mas do ponto de vista estético empobrecedor. Um elenco de horário nobre (Marcos Caruso, Nelson Xavier, Reginaldo Faria, José de Abreu, Nicete Bruno e Ana Lúcia Torre, entre outros, estão entre os melhores intérpretes do país) numa trama com história e imagem para ocupar o posto do produto mais visto da televisão brasileira.


Por fim, saindo do formalismo das análises críticas, “Joia Rara” me lembra aquelas novelas que me fizeram ter vontade de ser ator e sonhar em estar no casting. Falando em casting, Letícia Spiller como uma verdadeira “Ingrid Bergman” dos trópicos é para hipnotizar qualquer um. Não quero nem ver quando Mariana Ximenes entrar no ar. Ou melhor, quero ver sim! Vida longa a “Joia Rara” (que, desde já, aposto que será estendida). E a todas as novelas que trilharem o caminho inaugurado com competência por esta preciosidade.



Bruno Fracchia é ator, dramaturgo, produtor, mas antes de tudo isso, noveleiro. Formado em Artes Cênicas pela Universidade de São Paulo, estudou com Aguinaldo Silva, sendo um dos criadores da sinopse da telenovela "Fina Estampa". Atualmente, Fracchia está em cartaz com o espetáculo "Algumas Histórias", obra-homenagem ao ator Paulo José, escrita, produzida e interpretada por ele.

*Postado hoje (16/09, às 22:58), mas com data retroativa, por questões de programação.

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Paixões Proibidas – aposta ousada na emissora errada

Há muitas pessoas ignorantes, preconceituosas contra toda e qualquer teledramaturgia fora da Rede Globo. Fato lamentável. No entanto, com felizes exceções. 
Pedi ao querido Pedro Arthur que relembrasse a novela Paixões Proibidas. Ele prontamente aceitou o convite. Desde já o agradeço pela solicitude. Confira!


A teledramaturgia não é o ponto forte da Band. Uma prova disso é ver que, atualmente, a emissora não disponibiliza nenhum horário para produções de novelas, minisséries ou seriados próprios. No entanto, houve uma época em que a emissora produziu várias novelas de qualidade, principalmente na década de 80, como “A Deusa Vencida”, “Meu Pé de Laranja Lima”, “Os Imigrantes” e “Ninho da Serpente”. Em 1983, todavia, a emissora abandonou esse filão após estrear duas novelas no mesmo dia – Braço de Ferro e Maçã do Amor – e ambas apresentarem baixa audiência.


A Band iria retornar na década seguinte com “A Idade da Loba”, uma co-produção com a TV Plus, com Betty Faria no elenco. O projeto também não deu certo e outras dos anos 90 como “O Campeão” e uma novela versão de “Meu Pé de Laranja Lima” também ficaram aquém do esperado. Nessa época a emissora era considerada o canal do esporte, então as novelas destoavam do restante da grade de programação.


Na década de 2000, o canal de Saad resolveu voltar a apostar em teledramaturgia e com uma parceria com a RGB produziu com relativo sucesso a novelinha teen “Floribella”, em 2005. No ano seguinte, a emissora surpreendeu ao exibir chamadas da reprise de “Mandacaru”, uma novela da extinta rede Manchete. A emissora pretendia, nitidamente, alcançar o mesmo êxito que o SBT obteve com a reprise de “Xica da Silva” - também da Manchete – e conseguiu. Mandacaru era uma novela forte e com cenas ousadas de sexo, por isso a Band resolveu resgatar um projeto engavetado e investir em uma trama adulta para substituí-la.


O projeto era uma adaptação do livro Amor de Perdição, escrito pelo autor português Camilo Castelo Branco. O diretor Herval Rossano havia sido contratado em 2005 e ele deu início a este trabalho, mas não foi adiante por causa de um desentendimento com a roteirista da adaptação, Ana Maria Moretzsohn. Foi em 2007 que a Band retomou o projeto, dessa vez com o diretor Ignácio Coqueiro e com o autor Aimar Labaki.  Além de Amor de Perdição, Aimar resolveu incluir mais duas obras de Castelo Branco para sustentar a história: Mistérios de Lisboa e O Livro Negro de Padre Diniz. Então nasceu “Paixões Proibidas”.


Antes da estreia oficial, numa terça-feira, a Band apresentou uma pré-estreia, com os bastidores da novela, uma bela amostra de que seria uma produção pomposa. E realmente foi. A estreia foi marcada com um capítulo ágil, direção segura, cenografia realista e atores que mesclavam novos talentos com veteranos consagrados.


Merece um parágrafo à parte para o texto, afiadíssimo e muito bem amarrado, resultado de um bom trabalho de Aimar Labaki e dos seus colaboradores Mário Viana e Fabio Torres. Como pequena demonstração, logo no primeiro capítulo, por exemplo, o mocinho da história, Simão, foi apresentado em uma caliente cena de sexo com uma espanhola,  e após ser flagrado por Mateus, seu melhor amigo, ele falou: Isso são horas?! Não pode mais um homem gozar... de um pouco de privacidade? E quando o Mateus contou-lhe que veio para contar que o poeta Bocage havia falecido, Simão soltou: Tão pouca gente de valor nesta terra, e morre logo um poeta!

Isso era só o começo! Não poderia deixar de destacar, também, as cenas incríveis que envolviam a duquesa de Ponthieu (São José Correia) e Alberto/Leopoldo (Felipe Camargo). Eu considero a cena em que um desmascara o outro na frente de toda a corte portuguesa uma das melhores da teledramaturgia brasileira. “Este homem, senhoressss, é um pãrata!". E que baita atriz portuguesa, hein? Ao lado dela, Felipe Camargo teve a chance de fazer o seu melhor papel nas novelas. A propósito, a mistura de sotaques de portugueses e brasileiros dava um charme delicioso à trama.


Apesar dos elogios apresentados aqui, Paixões Proibidas fracassou. A escolha para o dia da estreia, por exemplo, só comprovou que a Bandeirantes, apesar de ser uma das mais emissoras mais antigas da TV brasileira, entendia pouco de estratégia de programação. A novela foi ao ar às 22h e, neste mesmo horário, a Record apresentava os últimos capítulos de Cidadão Brasileiro. O resultado do primeiro capítulo, então, foi decepcionante: 3 pontos de média, ante os 7 pontos esperados. Uma pena porque o texto era muito bom e alguns atores deram um show à parte (casos de Virgílio Castelo, Suzy Rego, Flávio Galvão, Antonio Grassi, Julianne Trevisol, Erom Cordeiro). E o que dizer do personagem de Marcos Breda, Baltazar? Até hoje ainda não vi um personagem sarcástico em telenovela tão bem escrito e interpretado de forma espetacular.


Com isso, após a decepção com o resultado da estreia, a BAND, misteriosamente, largou mão da novela. Não existiam chamadas na grade, os atores não participavam dos programas da casa como forma de divulgação e o pior de tudo: a trama não era exibida às quartas-feiras por conta do futebol! Devido à baixa audiência, mais uma estratégia mirabolante foi lançada pela emissora: a novela foi remanejada para o horário das 17h30. Isso mesmo! Uma trama forte e com potencial, teve que ter seu texto adaptado para o novo horário, sem cenas de sexo e violência.


Contudo, mesmo com tantos erros de estratégia de programação, “Paixões Proibidas” conseguiu ser uma excelente novela, provando que pode ser feito um trabalho de qualidade fora da Rede Globo. É sempre bom lembrar que audiência e qualidade nem sempre caminham juntos.  Apesar da novela não ter sido sucesso aqui no Brasil, obteve uma boa aceitação em Portugal e já foi vendida para diversos países. No You Tube, para quem se interessar, a novela está na íntegra com áudio em espanhol e também está disponível no canal NOW da NET. Vale a pena conferir! 

* Pedro Arthur é formado em Ciência da Computação pela UESC.
Fã de carteirinha do SBT, o moço é um dos responsáveis pela manutenção do site SBTpédia.
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