Era uma vez, num tempo
em que i-pods, i-peds, tablets, notebooks, celulares e outras ferramentas
essenciais de comunicação não existiam, as pessoas comunicavam-se, quase
sempre, face a face. Eram tempos difíceis! Como não havia internet residencial,
as TVs reinavam absolutas na sala de estar e as famílias reuniam-se diante
delas no horário nobre para assistirem às novelas e aos telejornais. De dia, as
crianças, quando não estavam na escola, tinham um encontro com rainhas, fadas e
bruxas. Eram tempos de conto de fadas. Na TV, os papéis já estavam
pré-determinados: Xuxa era a rainha absoluta das manhãs da Globo e
Angélica, a fada loira da Manchete.
No
SBT, Mara Maravilha assumia o papel de vilã, pois não tinha a aparência
destinada pela mídia às heroínas das histórias maravilhosas. As crianças não
podiam torcer pela bruxa e era papel das mães zelarem pelos bons costumes dos
seus filhos, afastando-os das más influências. A mídia cumpria autoritária e
religiosamente o seu papel, destacando nas revistas e jornais as benemerências
das heroínas televisivas. Quanto à outra? Xiiiiii! - advertiam as mães -
cuidado, ela é uma feiticeira malvada, que vive sempre ao lado de uma mãe
maquiavélica.
Não sei bem o
porquê, mas, contrariando a ordem
institucionalizada, eu me identificava
com aquela moça de cabelos negros (como a asa da graúna), de olhos negros e de
fala nordestina. Era uma espécie de Iracema do tão-tão distante século XX. Mas
ela é tão perigosamente brasileira? As crianças não podem gostar dela! Eu
gosto. Respondia aos porquês incrédulos de todos. Gosto e ponto final. Não
preciso dizer os motivos pelos quais eu torço por aquela que é representada
como a arqui-inimiga das princesas blondies.
Essa criança precisa ser
castigada, diziam - face a face - os adultos. Como pode romper com o senso
comum? Veja as provas:
- "A guerra pelos
baixinhos da Xuxa" (Contigo!).
- "Nunca fiz
feitiçaria" (Contigo!).
- "Mara acusada de
ter feito magia negra" (Contigo!).
- "Mara e Angélica
caem nas teias da magia negra" (Contigo!).
- "Angélica em
risco de vida - Mara acusada de ter feito magia negra" (Contigo!)
- "Globo recusa a
voz de Mara para cantar tema de Salomé (Amiga).
- "Macumba de Mara
complica vida de mãe-de-santo (Amiga).
- "A baianinha Mara
declara guerra à Xuxa" (Folha da Tarde).
- "Angélica acusa
Mara de plágio" (Amiga).
- "Arrogância de
Mara e sua mãe tirou baianinha do SBT" (Diário popular).
- "Mara Maravilha
volta a xingar e agredir jovens" (Diário popular).
- "Mara é acusada
de agressão" (Folha da Tarde).
- "Mara pode pegar
até um ano de prisão" (Contigo!).
- "Mara é acusada
de roubar amigo cego" (Notícias Populares).
- "Mara ameaçada de
sequestro" (Amiga).
- "Mara Maravilha
ameaçada de morte" (Contigo!).
Não havia, naquele
tempo, i-pads, i-pods, celulares, tablets, notebooks, mas havia a interação
face a face. Pena que os mais fracos (como crianças) nem sempre eram ouvidos,
pois havia uma bruxa má de boca grande - chamada Mídia - que engolia aqueles de
quem ela não gostava.
Eram tempos difíceis, mas,
pelo menos, eram tempos de rainhas, fadas e de Mara Maravilha. Eram tempos de
criança.
Adilson Oliveira é professor universitário, roteirista, poeta e apaixonado por corujas.
Prestes a completar dez anos, investida
em novelas reúne vitórias e derrotas.
Por Duh Secco, blogueiro convidado.
Prestes
a completar sessenta anos de história, a Record vive um momento de intensa
euforia e demasiada apreensão. A boa repercussão de Pecado Mortal, estreia de Carlos Lombardi na emissora, parece ser
fundamental para determinar a continuidade de seu núcleo de dramaturgia. Uma
saga que se iniciou há praticamente dez anos e que, por ocasião do aniversário
da emissora, e do convite que me fora feito pela equipe do Posso Contar Contigo?, rememoro nesse texto.
No
final dos anos 90, a Record recorreu à produtoras independentes para inaugurar
sua faixa de dramaturgia, às 20h15. Surgiram boas novelas, como Estrela de Fogo, Louca Paixão e Tiro e Queda.
O fraco desempenho desta última, no entanto, motivou a emissora a investir em
produções próprias. No entanto, após Marcas
da Paixão, Vidas Cruzadas e Roda da Vida, o departamento teve suas
atividades suspensas, por conta da escassez de autores e da baixa audiência.
(Leia meu texto “Os Outros Tempos da
Record” ,
publicado em meu blog Agora é Que São
Eles).
Em
2004, um novo tropeço vindo de produtoras independentes, a mal fadada Metamorphoses, e a obstinação em se
aproximar (e até tomar a liderança) da Globo, motivou uma nova investida nas
produções caseiras, marcada por altos e baixos.
Para
arrebatar o público, tão logo deu início ao seu núcleo de dramaturgia, a Record
foi buscar inspiração na Globo. Tão logo contratou o diretor Herval Rossano,
tratou de providenciar a nova versão de um clássico já dirigido por ele nos
anos 70, para a faixa das 18h da emissora carioca: A Escrava Isaura. Tiago Santiago e Ana Maria Nunes assinaram a
adaptação, que trouxe em seu elenco nomes como Rubens de Falco e Norma Blum,
que participaram da novela em 1976. Apesar do texto piegas, A Escrava Isaura se
consagrou em um grande êxito de audiência, talvez por conta de sua produção
esmerada, do elenco competente, onde se sobressaíram Patrícia França (Rosa) e
Ewerton de Castro (Belchior), e da concorrência da insossa Começar de Novo, cartaz da Globo às 19h. Chamou a atenção as cenas
de nudez de Leopoldo Pacheco (excelente como o vilão Leôncio) e Gabriel
Gracindo (Henrique), por serem exibidas em um horário relativamente cedo e em
uma emissora comandada por uma igreja evangélica. O sucesso foi tanto que menos
de sete meses após o término da novela, a Record passou a reprisa-la, em
horário nobre.
Para
substituir A Escrava Isaura, a Record
foi buscar outro texto já adaptado pela Globo: Senhora, de José de Alencar. Unida às tramas Lucíola e Diva, do mesmo
autor, através da sinopse desenvolvida por Marcílio Moraes e Rosane Lima, Essas Mulheres nos trouxe uma produção
esmerada, texto inspirado e elenco soberbo, se consagrando em uma das melhores
produções da Record nesta nova fase. O desenrolar dos acontecimentos sempre
colocava as protagonistas Aurélia (Christine Fernandes), Mila (Míriam
Freeland) e Lúcia (Carla Regina, agora Cabral) nas mesmas situações. As
sequências se convertiam em cenas belíssimas, como quando tivemos as três
senhoras enclausuradas: Aurélia em um convento, Mila no manicômio e Lúcia na
prisão. Nem tudo, entretanto, foram flores: Herval Rossano, que estava
encarregado da direção, se desentendeu com a emissora e migrou para a Band,
deixando sua tarefa nas mãos de Flávio Colatrello Jr., antes mesmo do início da
trama.
A
novela seguinte abandonaria os cenários de época para ambientar sua ação no Rio
de Janeiro contemporâneo.Prova de Amor,
adaptação de Tiago Santiago para um texto de Teixeira Filho, começou
interessante, com um elenco de fazer inveja à algumas produções globais. Nomes
como Lavínia Vlasak, Marcelo Serrado e Leonardo Vieira encabeçavam a produção. Marcou
também o início das atividades do Recnov, complexo de estúdios da emissora,
hoje sob a ameaça de ser desativado. A audiência explodiu, roubando preciosos
pontos de Bang-Bang, com quem
disputava na faixa das 19h, e do então imbatível Jornal Nacional. Os sucessivos espichamentos, no entanto,
desgastaram a trama, cuja fórmula nortearia outras novelas do canal.
Satisfeita
com o sucesso de audiência de suas produções, a Record lançou mão do seu
segundo horário de novelas. Lauro César Muniz retornava à emissora, onde
trabalhou nos anos 70, com Cidadão
Brasileiro, que se iniciava às 20h15, tão logo Prova de Amor chegava ao fim. Era a história de Antônio Maciel
(Gabriel Braga Nunes) ao longo de 30 anos de sua vida. Apaixonado por Luiza
(Paloma Duarte), acaba se casando com Carolina (Carla Regina), enquanto sofre a
influência nefasta da misteriosa Fausta (Lucélia Santos). A produção fora
tumultuada, devido à saída de Flávio Colatrello Jr. (o mesmo que apagara o
incêndio em Essas Mulheres) da
direção. Mesmo assim, Cidadão Brasileiro
se revelou uma grata surpresa. Adorava o envolvimento da professora Tereza
(Luiza Tomé) com o jovem Marcelo (Bruno Ferrari), alvo do amor de sua filha
Eleni (Maitê Pyragibe), jovem idealista que ingressaria na luta contra a
ditadura; o romance do jornalista Homero Salles (Tuca Andrada) com Laís
(Fernanda Muniz), esposa do todo-poderoso Atílio Salles Jordão (Floriano Peixoto);
e a riquinha Renée (Danni Carlos), apaixonada por um perseguido político. Cenas
marcantes ficaram na minha memória: Carolina tirando a calcinha e a jogando
para Antônio, Celso (Leonardo Brício) e Emílio (Rubens Caribé) brigando em cima
de uma canoa, o que resultou na morte do segundo; Lívia (Luiza Curvo) seduzindo
o prefeito Laércio (Kito Junqueira) em um local ermo; o suicídio de Júlio
(Cecil Thiré); e Manuela (Françoise Forton) matando o marido Otávio (Luiz
Carlos Miéle) a pedido do próprio.
Ao
lado de Cidadão Brasileiro, Bicho do Mato, substituta de Prova de Amor, formou uma dobradinha que
me prendeu na tela da Record. Ao menos durante os primeiros meses da trama,
quando o texto ainda estava sob o comando de Cristianne Fridman e Bosco Brasil.
Trazendo as belezas do Pantanal, Bicho do
Mato nos brindava com imagens belíssimas que adornavam o romance de Juba
(André Bankoff) e Cecília (Renata Dominguez). Angelina Muniz, Beatriz Segall,
Denise Del Vecchio, Regina Dourado, Ana Rosa, Jonas Bloch e Ana Beatriz
Nogueira também figuravam no grande elenco que encabeçava a produção. Mas os
números de audiência não responderam como previsto e Tiago Santiago fora
chamado para intervir no texto, o que transformou a novela numa sucessão de
cenas de ação e sofrimento, fazendo com que eu abandonasse a trama em seu terço
final.
Alterações
policialescas também comprometeriam de Alta
Estação, única produção das 18h exibida na Record, em um tempo em que
honraram a promessa de ter três horários de novelas, tal e qual a líder Globo.
Com uma aura que lembrava Friends, Alta
Estação nos trouxe o divertido casal Caio (Guilherme Boury) e Renata
(Andréa Horta), responsáveis por eu me manter fiel à novela até o fim, já que
as mudanças que trouxeram mais ação para a trama (seguindo a cartilha de Tiago
Santiago) deturparam completamente a sinopse desenvolvida por Margareth Boury.
A
violência serviria como chamariz de audiência para Vidas Opostas, de Marcílio Moraes, novela que substituiu Cidadão Brasileiro às 22h (último
horário no qual a trama figurou). Dessa vez, contudo, diferentemente do que
acontecera nas novelas anteriores, a violência estava inserida dentro de um
contexto, já que a trama se passara numa favela e trazia em seu enredo a guerra
entre traficantes, policiais e a sociedade. Vidas
Opostas pode ser considerada com a mais trama de maior êxito da Record
neste período, tamanha foi a sua repercussão, audiência e os prêmios que
conquistara.
Ao
contrário de Vidas Opostas, Luz do Sol, única novela de Ana Maria Moretzsohn
na Record, passaria em brancas nuvens. A trama, demasiadamente lenta e insossa,
não empolgou. O acerto foi a direção de Ivan Zettel, que nos brindou com belas
sequências no início, quando a menina Drica (posteriormente vivida por Luma
Costa) fora sequestrada. Luz do Sol
ainda disputou audiência com o sucesso Paraíso
Tropical, numa época em que a novela das 19h da Record, tamanha foram as
suas mudanças de horário, era exibida às 21h.
As
tramas posteriores das 21h e 22h trocariam de horário, confundindo e afugentando
o público da Record. Caminhos do Coração,
primeira trama de Tiago Santiago às 22h, fora um sucesso. Tornou-se febre entre
o público infanto-juvenil, com sua história repleta de seres extraordinários,
os mutantes. Os efeitos especiais dominavam a cena e comprometeriam seriamente
o desenvolvimento da novela. Ainda assim, a audiência se manteve fiel e a
Record usou a novela como arma para limar a estreia de A Favorita, na Globo.
No
dia da tal estreia, Caminhos do Coração
exibia seu último capítulo, em um horário diferente do que fora exibida e no
qual suas próximas temporadas seriam veiculadas. Na vaga de Caminhos do Coração, às 22h, a Record
encaixou Amor e Intrigas, então
cartaz das 21h. A sinopse de Gisele Joras fora vencedora de um concurso que a
Record promoveu na busca por novos roteiristas. Não emplacou logo de cara, mas
arrebatou a audiência em seu terço final. A trama, no geral, apesar dos
inúmeros clichês, se mostrou agradável. Destaque para Esther Góes, com a vilã
Dorotéia, personagem à altura de seu talento. E para Jonas Bloch, o Camilo, que
vivia a dor da perda de sua mulher, Marília, um sensível trabalho de Sylvia
Bandeira.
Os Mutantes,
que usava Caminhos do Coração como
subtítulo, não teve a mesma sorte de Amor
e Intrigas. Em novo horário, Tiago Santiago continuava dando amostras de
sua fantasia desmedida. Os mutantes se proliferavam, a trama
se arrastava diante de poucos apelos, e audiência começou a degringolar, se
distanciando dos números que assustaram a Globo, que viu A Favorita capengar em seu início. Para apagar o incêndio, Os Mutantes daria lugar à Promessas de Amor, derradeira temporada
da saga fantasiosa, que preteria os seres geneticamente modificados a favor do
romantismo do casal vivido por Renata Dominguez e Luciano Szafir. Não vi
absolutamente nada desta novela. Para mim, tratava-se da pá de terra definitiva
sobre um produto que já havia chegado ao fim com o último capítulo de Caminhos do Coração. Nada mais havia a
ser mostrado e a insistência da Record na trama provou que eu, e grande parte
do público, estávamos certos. A novela provocou a saída de Tiago Santiago da
emissora. E o início da parceria com a mexicana Televisa.
Textos
mexicanos adaptados para a realidade brasileira não eram novidade na nossa TV.
O SBT havia utilizado esse expediente por anos, tendo como parceira a mesma
Televisa. Na Record, os produtos eram melhor acabados. Mas ainda assim, não
passaram impassíveis de comparações com o original. Principalmente Bela, A Feia, cuja versão mexicana havia
sido exibida recentemente no SBT, e a colombiana, que deu início a todas as
outras, fez muito sucesso na Rede TV!. A bela que era feia, nesta versão, foi
muito bem interpretada por Gisele Itiê. Mas quem se sobressaiu mesmo foi
Bárbara Borges, como Elvira, a irmã brega de Bela, cujo bordão “Patê com pão”
fora repetido tantas vezes que chegou a cansar. Assim como a novela, submetida
a constantes espichamentos; dentre eles, o que a colocou como tapa-buraco ente
o final de Poder Paralelo e o início
de Ribeirão do Tempo, levando a
Record a manter apenas um único horário de novelas.
Antes
de Poder Paralelo, no entanto,
pudemos conferir Chamas da Vida.
Ótimo trabalho de Cristianne Fridman, a novela que focava no universo dos bombeiros
usou de um dos signos da teledramaturgia da Record à exaustão: os capítulos de
quarta, que costumam registrar maior audiência por competirem com o futebol,
sempre eram preenchidos com atos heroicos dos bombeiros. Incêndios não faltaram
nesta novela que trouxe a sanguinária Vilma como vilã, em um fantástico
trabalho de criação de Lucinha Lins, tanto na fase em que ela atuava como
incendiária, como quando fora descoberta a existência de um segundo
incendiário, que a assombrava.
Chamas da Vida
fora substituída por Poder Paralelo,
segundo trabalho de Lauro César Muniz na emissora. Voltada para o mundo do
narcotráfico, a novela seguiu a cartilha da Record e nos trouxe cenas de ação e
violência. Mas Lauro sabe conduzir suas tramas com a maestria e impediu que as
repetições levassem o público à exaustão. Um misterioso assassino executou
diversos personagens na fase final, brindando o público com sequências de
suspense e mistério. O único fator que jogou contra a trama: a insistência da
Record em privilegiar a faixa de shows (e nos últimos tempos, a de jornalismo)
em detrimento à teledramaturgia. Poder
Paralelo chegou a entrar no ar próximo da meia-noite, o que impede o
público de se fidelizar a uma novela.
Após
o término desta e a tomada do horário por Bela,
A Feia, a Record estrearia Ribeirão
do Tempo, de Marcílio Moraes. O autor voltava a calcar sua história em uma
crítica social, desta vez usando a cidade que dava título à novela como uma
espécie de microcosmo do Brasil. Lá, políticos corruptos eram perseguidos por
organizações cujo intento, embora parecesse honesto à princípio, era tomar o
poder para continuar a manter tudo como está, ou até mesmo deixar as coisas
ainda piores. O Professor Flores (Antônio Grassi) e o senador Nicolau (Heitor
Martinez), que assumira o cargo após matar o próprio pai, de quem era suplente,
dominaram a ação. Destaque também para Caio Junqueira, como o atrapalhado
detetive Joca, e Taumaturgo Ferreira, o Querêncio, que, de bêbado, passa a
prefeito da cidade após enriquecer.
A
Record tornaria a investir em um segundo horário de novelas, enquanto Ribeirão do Tempo estava no ar. Às
19h30, no mesmo dia em que a Globo estreava Morde
& Assopra, a emissora levava ao ar a sua segunda adaptação mexicana, Rebelde. O título já conhecido pelo
público chegou a empolgar no início. Mas as repetitivas situações do texto de
Margareth Boury, como os encontros sempre similares do professor Vicente
(Eduardo Pires) e Becky (Lana Rhodes) acabaram afugentando o público (eu,
inclusive). Ainda que sem história para contar, a Record decidiu dar sobrevida
à novela, em uma segunda temporada. A situação se agravou e a derrota para Carrossel, do SBT, serviu para que o
segundo horário fosse abandonado mais uma vez.
Mas
a crise chegaria ao horário remanescente. Após Vidas em Jogo, substituta de Ribeirão
do Tempo, a emissora não veria mais as suas novelas atingirem os dois
dígitos. A novela de Cristianne Fridman se saiu bem na audiência, embora já
demonstrasse o desgaste da fórmula marcada por perseguições e tiroteios e do
excessivo número de capítulos (quase todas as tramas, a partir de Prova de Amor, passaram a terminar com
mais de 200 capítulos).
Máscaras, a
substituta, foi mal concebida por Lauro César Muniz. Esforços para salvar a
trama não faltaram, incluindo até mesmo a substituição do diretor, Ignácio
Coqueiro. Mas havia pouco a ser feito. A produção conturbada levou o elenco a
se posicionar contra uma possível perseguição da imprensa. Com a trama em
declínio, a Record apressou a produção de sua substituta, Balacobaco.
Embora
tenha elevado ligeiramente os índices, Balacobaco
foi um desperdício de tempo. Gisele Joras enveredou por um caminho perigoso: o
da repetição. Todas as tramas e personagens vistos em sua novela já haviam
figurado em seus dois trabalhos anteriores. Um colorido excessivo, que buscava
lembrar os sucessos globais Cheias de
Charme e Avenida Brasil, tornou a
novela ainda mais desinteressante. Como solução, o número reduzido de
capítulos, que seriam ainda mais reduzidos na produção seguinte.
Dona Xepa
estreou com a missão de durar pouco mais de três meses. Sai do ar nesta terça,
para dar lugar a Pecado Mortal. No
tempo em que ficou no ar, não apresentou grandes feitos, mas também não fez
feio. Gustavo Reiz soube conduzir os textos, embora todas as situações criadas
para a novela ficassem melhor em um projeto levado ao ar mais cedo. Ângela Leal
segurou muito bem sua Xepa e conquistou grandes momentos ao lado de seus dois
filhos, Arthur Aguiar (Edson) e Thaís Fersoza (Rosália). Angelina Muniz também
foi um destaque à parte como Pérola. A direção de Ivan Zettel, no entanto,
continuou abusando de efeitos já vistos em Rebelde,
que tornavam os capítulos engraçadinhos demais.
Quanto
à Pecado Mortal, resta torcer pelo
seu sucesso. O elenco é bom, o autor melhor ainda, e a direção de Alexandre
Avancini promete boas sequências. Que tudo sejam flores nesta nova produção. A
dramaturgia da Record e o mercado de trabalho para autores, diretores, técnicos
e atores agradecem. O público, mais ainda!
Duh, muito obrigado pela solicitude. Texto excelente!
Duh
Secco é fisioterapeuta. Atua na área, mas tem paixão mesmo é pelos roteiros. É
colunista do blog Agora é Que São Eles, em parceria com Guilherme Staush. Sobre
as novelas da Record, escreveu análises em seu blog, que você pode conferir logo
abaixo.
Murilo Pitombo, um amigo apaixonado pela novela Alta Estação, é o nosso blogueiro convidado. Desde já o agradeço. Vamos relembrá-la?!
No
dia 17 de abril de 2006, um pouco depois das seis da tarde, estreava na tela da
TV Record, a primeira novela solo da roteirista Margareth Boury. A primeira produção
da emissora, voltada para os jovens. Alta Estação (que seria “E aí?”) estreou
cheia de expectativa, com a missão de levar o público jovem para a Record, e
também com a função de revelar novos nomes para a dramaturgia do canal.
Margareth
chegava ao canal, para reforçar o banco de autores, depois de anos na TV Globo
e com vários trabalhos colaborando com o rei das sete, Carlos Lombardi. Dona de
um diálogo sagaz e com uma forte pegada de humor, Margareth soube mostrar para
o que veio, com essa novela feita para um público, o qual ela conhece muito
bem.
Alta
Estação foi uma novela divertida, com gente bonita e que falava a mesma língua
dos jovens. Estrelada por Ariela Massoti, Lana Rodes, Andréia Horta, Daniel
Aguiar, Vergniaud Mendes e Guilherme Boury, a novela trazia as dúvidas,
intrigas e situações rotineiras comuns na vida dos seis jovens, que acabam se tornando
amigos inseparáveis. O humor permeava toda a trama. Impossível não ri com as
trapalhadas do Caio e seu bordão “meu querido”; As loucuras da Flávia, que
quase sempre aparecia com um novo namorado/ficante; As paranoias da Renata e a
difícil relação entre Eduardo, Bárbara e Ricardo. O elenco contava também com
Cláudia Alencar, André Mattos, Eliete Cigarini, Roberto Pirilo, Cassia
Linhares, Fábio Lago, Nathália Rodrigues, Rocco Pitanga, Jorge Pontual, Norma
Bengell, João Vitti, Lucas Cotrim. Participações de André Bankoff, Bruno
Gissoni, entre outros.
Recordo
que muitos amigos meus, que nunca tinham assistido novela em outro canal,
acabaram mudando para ver Alta Estação. Até hoje me lembro de várias cenas,
entre elas, uma em que Renata, interpretada pela brilhante Andréa Horta, está
bêbada por conta de uma desilusão amorosa e começa a chorar e cantar, sentada
em uma escada. Dona Regina, síndica do prédio onde moravam as garotas, foi uma
das inúmeras personagens que ganharam destaque no decorrer na trama. As cenas
entre ela e William, foram brilhantes e recheadas de humor.
Alta
Estação estreou com a previsão de ficar quatro anos no ar, porém foi exibida
por apenas nove meses. A baixa audiência foi um fator que ajudou no precoce cancelamento
da novela. Mas há que se dizer, as constantes mudanças de horário e a
intervenção da direção da emissora, nos rumos de algumas tramas, contribuíram para
afastar os espectadores que acompanhavam a trama. Quando os diretores do canal
resolveram deixar a autora trabalhar como ela realmente havia planejado, já era
tarde. A novela não conseguiu reconquistar o público perdido e foi bruscamente
encurtada.
Vários
dos protagonistas da novela seguem como atores bem sucedidos, tanto na Record
quanto em outros canais.
Mesmo
com o “fracasso” de audiência de Alta Estação, Margareth Boury não perdeu
prestigio junto à emissora e anos depois escreveu a adaptação de Rebelde, que
obteve maior êxito em faturamento e audiência. Porém, também sofreu com as
constantes mudanças de horário. De 14 pontos no ibope, caiu para 3.
É muito bom poder relembrar aquela novela solar, vibrante, jovem... Alta Estação!
Murilo
Pitombo é estudante de Comunicação Social – Rádio e TV, na UESC. Ator e escritor. Fã dos
autores Lauro César Muniz, Margareth Boury e Manoel Carlos.
Pedi ao querido Bruno Fracchia que evidenciasse as suas impressões sobre o capítulo de estréia de Joia Rara. Ele topou. Desde já o agradeço. Confiram!
Não bastasse contar no elenco com as musas da
minha vida (Cláudia Ohana, Letícia Spiller e Mariana Ximenes), as lindas e
envolventes chamadas de “Joia Rara” me levaram a me programar para estar em
casa em condições de assistir ao primeiro capítulo da novela. Não me arrependi.
Quem estuda a telenovela brasileira, sabe que há alguns “marcos zeros”: 24599 Ocupado” , “Beto Rockfeller”, “Guerra dos
Sexos”, “Pantanal” são alguns exemplos. Sem receio do equívoco, tenho convicção
de que “Joia Rara” entra para esta seleta lista.
“Marcos zeros” evidentemente são conceitos
didáticos para facilitar estudos e que, em geral, são o ápice de uma construção
que já se desenhava: antes de “Beto Rockfeller”, por exemplo, a novela “Antônio
Maria” já apresentava personagens populares em papel de destaque e linguagem
cotidiana. Mas o que se desenhava explodiu na mítica novela da TV Tupi. Logo,
“Marcos zeros” são mais do que necessários e contém seus méritos únicos.
Da mesma forma, em “Avenida Brasil” e “Cordel
Encantado” a imagem televisiva próxima da estética audiovisual, com primoroso
trabalho de luz e enquadramentos fora do habitual já foram utilizados. No
entanto, este primeiro capítulo de “Joia Rara” (não por acaso obra com direção
geral da diretora de “Avenida Brasil e “Cordel Encantado” e escrita pela dupla
de autoras da segunda trama) potencializou demais este recurso, dando condições para que esta obra seja considerada um novo marco zero!
O que vimos no primeiro capítulo de “Joia Rara”
foi o maior exemplo já visto na televisão brasileira de hibridização de
linguagens (É cinema? É vídeo?), ficando firmemente “terreno na
desterritorialização” de linguagens.
Os estudos acadêmicos e críticas bem
fundamentadas sobre telenovelas felizmente vem aumentando. No entanto,
desconheço algum que trate da evolução da imagem na telenovela e da análise do
trabalho da direção. Que alguém num futuro breve se atreva a esta tarefa!
Através de enquadramentos já existentes em
“Avenida Brasil” e também apresentados no capítulo de hoje, Amora Mautner se
afirma como uma diretora da linhagem de um Walter Avancini: ambos trabalham num
produto “fabricado em série”, mas nem por isso deixam de imprimir marcas
autorais!
Os anos 80 testemunharam o retorno da telenovela
aos estúdios, deixando pouco espaço para a linguagem imagética. Já os anos 2000
viram a quase total exclusão dos temas políticos. “Joia Rara” em seu primeiro
capítulo aponta com força e esperanças para esta saída da camisa de força dos
estúdios, a revitalização da linguagem plástica do produto televisivo e a volta
dos temas políticos (através da existência de personagens inseridos no
Movimento Operário do início do século).
Gênero não se reinventa Gênero se renova. Na
televisão, assim como no cinema e no teatro, tentativas pretensiosas de reinventar os gêneros sempre fracassam quando partem para a ignorante negação de
tudo o que já foi feito. Nega-se uma estética anterior a um dado período, por
exemplo, mas retornando a conceitos de períodos ainda mais antigos para se
propor algo novo (no sentido de revitalização). Desta dialética necessária é
que poderá surgir uma síntese a apontar para o futuro: a fotografia e a direção
de pouco valeriam se não houvesse no ar uma trama com elementos clássicos de
telenovela (tanto que os olhos deste escriba lacrimejaram quando o casal
protagonista – Bianca Bin e Bruno Gagliasso (nosso Al Pacino brasileiro – pelo
tamanho e pelo talento) se encontraram.
Falando em hibridizações, a última novela das
18h com potencial para às 21h foi “Força de um Desejo” (há 13 anos).
“Joia Rara” rasga também esta divisão, necessária comercialmente, mas do ponto
de vista estético empobrecedor. Um elenco de horário nobre (Marcos Caruso,
Nelson Xavier, Reginaldo Faria, José de Abreu, Nicete Bruno e Ana Lúcia Torre,
entre outros, estão entre os melhores intérpretes do país) numa trama com
história e imagem para ocupar o posto do produto mais visto da televisão
brasileira.
Por fim, saindo do formalismo das análises críticas, “Joia Rara” me lembra aquelas novelas que me fizeram ter vontade de ser ator e sonhar em estar no casting. Falando em casting, Letícia Spiller como uma verdadeira “Ingrid Bergman” dos trópicos é para hipnotizar qualquer um. Não quero nem ver quando Mariana Ximenes entrar no ar. Ou melhor, quero ver sim! Vida longa a “Joia Rara” (que, desde já, aposto que será estendida). E a todas as novelas que trilharem o caminho inaugurado com competência por esta preciosidade.
Bruno Fracchia é ator, dramaturgo, produtor, mas antes de tudo isso,
noveleiro. Formado em Artes Cênicas pela Universidade de São Paulo, estudou com
Aguinaldo Silva, sendo um dos criadores da sinopse da telenovela "Fina
Estampa". Atualmente, Fracchia está em cartaz com o espetáculo
"Algumas Histórias", obra-homenagem ao ator Paulo José, escrita,
produzida e interpretada por ele.
*Postado hoje (16/09, às 22:58), mas com data retroativa, por questões de programação.
Há muitas pessoas ignorantes, preconceituosas contra toda e qualquer teledramaturgia fora da Rede Globo. Fato lamentável. No entanto, com felizes exceções.
Pedi ao querido Pedro Arthur que relembrasse a novela Paixões Proibidas. Ele prontamente aceitou o convite. Desde já o agradeço pela solicitude. Confira!
A
teledramaturgia não é o ponto forte da Band. Uma prova disso é ver que,
atualmente, a emissora não disponibiliza nenhum horário para produções de
novelas, minisséries ou seriados próprios. No entanto, houve uma época em que a
emissora produziu várias novelas de qualidade, principalmente na década de 80,
como “A Deusa Vencida”, “Meu Pé de Laranja Lima”, “Os Imigrantes” e “Ninho da
Serpente”. Em 1983, todavia, a emissora abandonou esse filão após estrear duas
novelas no mesmo dia – Braço de Ferro e Maçã do Amor – e ambas apresentarem
baixa audiência.
A
Band iria retornar na década seguinte com “A Idade da Loba”, uma co-produção
com a TV Plus, com Betty Faria no elenco. O projeto também não deu certo e
outras dos anos 90 como “O Campeão” e uma novela versão de “Meu Pé de Laranja
Lima” também ficaram aquém do esperado. Nessa época a emissora era considerada
o canal do esporte, então as novelas destoavam do restante da grade de
programação.
Na
década de 2000, o canal de Saad resolveu voltar a apostar em teledramaturgia e
com uma parceria com a RGB produziu com relativo sucesso a novelinha teen “Floribella”,
em 2005. No ano seguinte, a emissora surpreendeu ao exibir chamadas da reprise
de “Mandacaru”, uma novela da extinta rede Manchete. A emissora pretendia,
nitidamente, alcançar o mesmo êxito que o SBT obteve com a reprise de “Xica da
Silva” - também da Manchete – e conseguiu. Mandacaru era uma novela forte e com
cenas ousadas de sexo, por isso a Band resolveu resgatar um projeto engavetado
e investir em uma trama adulta para substituí-la.
O
projeto era uma adaptação do livro Amor de Perdição, escrito pelo autor
português Camilo Castelo Branco. O diretor Herval Rossano havia sido contratado
em 2005 e ele deu início a este trabalho, mas não foi adiante por causa de um
desentendimento com a roteirista da adaptação, Ana Maria Moretzsohn. Foi em
2007 que a Band retomou o projeto, dessa vez com o diretor Ignácio Coqueiro e
com o autor Aimar Labaki. Além de Amor
de Perdição, Aimar resolveu incluir mais duas obras de Castelo Branco para
sustentar a história: Mistérios de Lisboa e O Livro Negro de Padre Diniz. Então
nasceu “Paixões Proibidas”.
Antes
da estreia oficial, numa terça-feira, a Band apresentou uma pré-estreia, com os
bastidores da novela, uma bela amostra de que seria uma produção pomposa. E
realmente foi. A estreia foi marcada com um capítulo ágil, direção segura,
cenografia realista e atores que mesclavam novos talentos com veteranos
consagrados.
Merece
um parágrafo à parte para o texto, afiadíssimo e muito bem amarrado, resultado
de um bom trabalho de Aimar Labaki e dos seus colaboradores Mário Viana e Fabio
Torres. Como pequena demonstração, logo no primeiro capítulo, por exemplo, o
mocinho da história, Simão, foi apresentado em uma caliente cena de sexo com
uma espanhola, e após ser flagrado por
Mateus, seu melhor amigo, ele falou: Isso são horas?! Não pode mais um homem
gozar... de um pouco de privacidade? E quando o Mateus contou-lhe que veio para
contar que o poeta Bocage havia falecido, Simão soltou: Tão pouca gente de
valor nesta terra, e morre logo um poeta!
Isso
era só o começo! Não poderia deixar de destacar, também, as cenas incríveis que
envolviam a duquesa de Ponthieu (São José Correia) e Alberto/Leopoldo (Felipe
Camargo). Eu considero a cena em que um desmascara o outro na frente de toda a
corte portuguesa uma das melhores da teledramaturgia brasileira.“Este
homem, senhoressss, é um pãrata!". E que baita atriz portuguesa, hein?
Ao lado dela, Felipe Camargo teve a chance de fazer o seu melhor papel nas
novelas. A propósito, a mistura de sotaques de portugueses e brasileiros dava
um charme delicioso à trama.
Apesar
dos elogios apresentados aqui, Paixões Proibidas fracassou. A escolha para o
dia da estreia, por exemplo, só comprovou que a Bandeirantes, apesar de ser uma
das mais emissoras mais antigas da TV brasileira, entendia pouco de estratégia
de programação. A novela foi ao ar às 22h e, neste mesmo horário, a Record
apresentava os últimos capítulos de Cidadão Brasileiro. O resultado do primeiro
capítulo, então, foi decepcionante: 3 pontos de média, ante os 7 pontos
esperados. Uma pena porque o texto era muito bom e alguns atores deram um show
à parte (casos de Virgílio Castelo, Suzy Rego, Flávio Galvão, Antonio Grassi,
Julianne Trevisol, Erom Cordeiro). E o que dizer do personagem de Marcos Breda,
Baltazar? Até hoje ainda não vi um personagem sarcástico em telenovela tão bem
escrito e interpretado de forma espetacular.
Com
isso, após a decepção com o resultado da estreia, a BAND, misteriosamente,
largou mão da novela. Não existiam chamadas na grade, os atores não
participavam dos programas da casa como forma de divulgação e o pior de tudo: a
trama não era exibida às quartas-feiras por conta do futebol! Devido à baixa
audiência, mais uma estratégia mirabolante foi lançada pela emissora: a novela
foi remanejada para o horário das 17h30. Isso mesmo! Uma trama forte e com
potencial, teve que ter seu texto adaptado para o novo horário, sem cenas de
sexo e violência.
Contudo,
mesmo com tantos erros de estratégia de programação, “Paixões Proibidas”
conseguiu ser uma excelente novela, provando que pode ser feito um trabalho de
qualidade fora da Rede Globo. É sempre bom lembrar que audiência e qualidade
nem sempre caminham juntos. Apesar da novela
não ter sido sucesso aqui no Brasil, obteve uma boa aceitação em Portugal e já
foi vendida para diversos países. No You Tube, para quem se interessar, a
novela está na íntegra com áudio em espanhol e também está disponível no canal
NOW da NET. Vale a pena conferir!
* Pedro Arthur é formado em Ciência da Computação pela UESC.
Fã de carteirinha do SBT, o moço é um dos responsáveis pela manutenção do site SBTpédia.