quarta-feira, 7 de março de 2012

Novelas históricas ou a História na telenovela?



Por Fábio Leonardo

Já é uma das propostas primordiais da teledramaturgia, desde que ela estreou, e foi de sua antecessora, a radionovela, e de seus antecessores, os folhetins de jornais, o retrato de contextos de época. Enquanto no século XIX, muitos romances buscassem retratar a aura da Idade Média, essa tendência se manteve quando o gênero migrou pro rádio, e também nos primeiros anos da televisão, quando departamento de dramaturgia da Rede Globo esteve liderado por Gloria Magadan. As tramas novelísticas se passavam na Espanha medieval, na França de capa-e-espada ou no mundo árabe. Eram histórias dramalhonescas, com diálogos empostados, e contextos que em muito se distanciavam da realidade nacional do Brasil daquela época.


Muita coisa mudou com a revolução causada por Beto Rockfeller, a contemporaneidade, o dinamismo do Rio de Janeiro do século XX, os diálogos coloquiais e próximos da realidade. Mesmo assim, com o predomínio de tramas contemporâneas e dinâmicas, permanecem nas emissoras os trabalhos de época. Em geral, tais novelas contêm uma produção e direção de arte mais bem elaborados, um estudo responsável acerca do período retratado, exercícios de prosódia, figurino bem trabalhado, etc. É fato que a nova formatação dada aos trabalhos de época em muito se diferenciam daquilo que era praticado nos anos 50 e 60: fica nos autores e diretores o desejo de tratar um período, com seu contexto, seus hábitos e, em alguns casos, fatos históricos reais. Nisso, é possível destacar trabalhos memoráveis como as duas versões de Sinhá Moça, as minisséries A Muralha, Os Maias, A Casa das Sete Mulheres, Anos Dourados e Anos Rebeldes, bem como o trabalho mais recente, a novela Amor e Revolução, no SBT, marcada por estabelecer um retrato incômodo do Regime Civil-Militar no Brasil.


Na verdade, assisto às novelas com três olhares diferentes: o de espectador fanático, o de roteirista amador e o de historiador em processo de formação, o que me permite uma gama de análises a respeito do gênero. Como historiador, tento gestar em mim uma compreensão da telenovela como um artefato de criação ficcional de uma realidade, de uma invenção de hábitos e de costumes, como um híbrido influenciador e influenciado pelas descontinuidades observadas no nosso mundo, seja nos aspectos macro – a política, a sociedade e a economia – seja na micropolítica – os desejos, os sonhos, o imaginário e o cotidiano. Nesse sentido, me surge uma indagação que tento responder nesse texto: qual é a diferença entre as novelas históricas e a representação da História na telenovela?

Vejo que é uma relação tênue. Comumente, as novelas históricas (ou seja, aquelas de época, com contextos diferentes daqueles vividos no presente) buscam aproximar-se, ficcionalmente, do período retratado. É comum que os autores leiam bastante sobre a época, quando possível, entrevistem pessoas que viveram o momento retratado, pesquisem em documentações oficiais, observem usos e costumes, hábitos, vestimentas, etc. Obviamente, tudo isso respeitando a licença poética com a qual são agraciados os ficcionistas.

No entanto, apenas as novelas de época têm o status de retratarem a História na telenovela? O tempo presente, o momento vivido, não teria, também, uma posição de História, uma possibilidade de leitura histórica de uma época? Na verdade, é possível, aos olhos de hoje, estabelecer uma leitura do mundo através do que passa na televisão. Foi assim no final dos anos 80, e início dos anos 90, onde novelas como Vale Tudo e Rainha da Sucata denotarem, subliminarmente, as transformações no cotidiano brasileiro à luz da redemocratização, as mudanças culturais e de hábitos. Da mesma forma, tramas como Fina Estampa, que retratam a nova classe C, ou A Vida da Gente, com sua leitura sobre a família contemporânea, nos ajudam a pensar nosso tempo, o que fazem dessas novelas produtos históricos em potencial.


Dessa forma, defendo que existem diferenças entre as novelas históricas e a inserção da História na telenovela. Necessariamente, as novelas históricas inserem a História no mundo dramatúrgico, mas não são as únicas. Todas as produções subjetivam valores sociais e culturas de uma época e, por esse motivo, estão plenos de historicidade.

Fotos: Google Imagens
Vídeos: You Tube 

Um comentário:

  1. Fábio Léo,

    eu gosto dos dois aspectos, a história na novela e novela histórica... as de época são memoráveis, e algumas outras, tais como Rainhas da Sucata, marcaram época.

    Que venham os próximos, meu querido!

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