por José Vitor Rack
1981.
O ano em que nasci. O ano que, no
Brasil ao menos, teve como grande hit nas rádios a xarope Bette Davis Eyes, de
Kim Carnes.
Vim ao mundo em Setembro. Fim do
inverno paulistano, primavera que anunciava a meus pais o começo de uma nova
vida. Na TV Globo terminava o megassucesso Baila Comigo e começava a apagada Brilhante,
por coincidência no mesmo dia, mês e hora em que minha própria vida neste
planeta começou.
Meses antes da minha estreia nesse
planetinha de expiações e provas, a TV vivia um momento de agitação na
dramaturgia. Lauro César Muniz havia sido demitido da TV Globo por conta de uma
entrevista dada a um jornal. Sua novela Os Gigantes havia tido problemas de
toda ordem, incluindo-se audiência. A entrevista de Lauro ao jornal Shopping
News deu à emissora o argumento de que precisava para demiti-lo.
E a Globo não perdeu a
oportunidade. Mandou Lauro César Muniz, dramaturgo prestigiado e dedicado à
telenovela, plantar batatas. Por telefone.
Já demitido, Lauro convocou uma
coletiva em sua casa onde deu detalhes à imprensa sobre a mutilação de sua
novela, dos problemas que teve de enfrentar e, de modo furioso, sobre sua
própria demissão.
Walter Avancini, diretor de
teledramaturgia da TV Bandeirantes, não perdeu tempo e convocou Lauro a
escrever sua primeira e única novela para o canal.
Tupi recém falida, SBT ainda não
operante, Record desprestigiada... A Band era a vice-líder de audiência e
contava com novelas das seis, sete e oito, como a Globo. Lauro vinha para tocar
um projeto inovador, algo que foi anunciado com estardalhaço pela emissora e
replicado pela mídia: a primeira novela feita totalmente em externas e locações
de nossa TV. E mais: feita fora do eixo Rio-SP.
A história da novela era simples.
Mostrava a luta de Rosa (Nancy Wanderley), matriarca centralizadora e decidida de uma família com sete
filhos onde uma cadeira estava vazia: a do pai, Edmundo Lua Nova (Rafael de
Carvalho), ex-cangaceiro que corria o mundo. Padre Cícero em pessoa havia abençoado a união dos dois, interrompida pelo abandono do lar praticado por Edmundo.
A volta do pai depois de vinte anos marcava o começo da história. O patrocínio generoso da Petrobras permitiu ao autor uma aventura de
pesquisa criativa muito interessante, gerando a ambientação da novela em campos
petrolíferos na Bahia. Haviam cenas gravadas ainda em Aracaju e Manaus. Toda essa geografia era praticamente inédita na TV.
Os filhos de Rosa se envolviam em
diversas confusões, amorosas principalmente. Lauro foi por este caminho e,
pouco a pouco, o merchandising do petróleo foi sendo
deixado de lado.
Como dito anteriormente, a novela foi lançada com estardalhaço. A Globo chegou a se armar, prevendo um possível êxito da Bandeirantes. No dia anterior à estreia, anunciou na Folha de São Paulo em quase meia página que o Barão Von Strauss (Jardel Filho) seria atirado acorrentado ao mar no sensacional capítulo de Coração Alado na segunda-feira.
Lauro percorreu programas de sucesso da Bandeirantes, como o de Hebe Camargo, e o ainda existente Canal Livre. Nesta entrevista aliás, ele disse que desejava "limpar a telenovela sujando-a com o suor de um povo".
No sábado anterior à estreia, houve uma pré-estreia muito proveitosa em termos de IBOPE. Porém, conforme os capítulos foram se sucedendo, a audiência foi minguando. Problemas técnicos, principalmente relacionados à captação de som em locações e externas, causavam muita estranheza no telespectador. Era difícil se acostumar com um padrão de som e imagem tão diferentes do habitual. Na época os recursos eram muito limitados e a simples passagem de um ônibus na rua estragava uma sequência difícil de ser repetida.
Não deu certo.
Rosa Baiana pagou o preço do pioneirismo. E nem levou a fama de pioneira. Pantanal (que tinha muitas cenas gravadas em estúdio) e A História de Ana Raio e Zé Trovão são sempre lembradas quando se fala em "teledramaturgia outdoor".
Esta foi a última novela de Rafael de Carvalho, que morreu sem concluir este trabalho.
Em 2012 estive com Lauro César Muniz, em sua casa. Perguntando a ele sobre Rosa Baiana, vi brotar em sua face um sorriso muito sincero. Ele acredita não ser mais possível fazer algo como aquilo hoje em dia, queixou-se das dificuldades que a inexperiente equipe da Band teve para produzir a novela, mas guarda boas lembranças da experiência, das pessoas que entrevistou para aprender as expressões, apreender um pouco da baianidade que suas personagens precisavam ter. Havia carinho da parte dele por essa lembrança preta do petróleo e picante como o bom acarajé.
Lembrança do bate-papo com Lauro César Muniz em 2012
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