Por Rafael Montoito
Meu sobrinho fará três anos em outubro. Ele
se chama Vitor e nasceu quando estava passando o remake de Tititi. Lembro de pensar que, por conta da exibição da novela, se
ele estivesse na escola, seguramente os colegas estariam pregando peças nele e
chamando-o de Victor Valentin. Minha
irmã garante que foi apenas uma coincidência, que ela apenas achava o nome
bonito – e eu acredito, até porque ela estava se preparando para ter uma
menina, cujo nome já tinha escolhido. Três meses depois, foi ao ar o último
capítulo de Passione, e ele ficou
sentadinho no bebê-conforto, enquanto nos reuníamos para assistir ao desfecho
da trama. Surpreendentemente, ele nos deu folga do seu choro o capítulo
inteiro, coisa que era bem rara naqueles dias. Quando o capítulo terminou, eu
pensei: “será que ele vai guardar alguma lembrança disso?” e estendi meu
pensamento para “será que ele vai lembrar-se da briga entre costureiros e
pensar que, da novela, derivou seu nome?”. Provavelmente não. Mas durante a
exibição de Insensato Coração – com o
desenrolar da trama, ele foi desenrolando-se também: começou a se virar no
chão, a querer engatinhar etc – qualquer coisa que ele estivesse fazendo,
parava quando tocava a música da abertura, e se sacudia todo à voz da Maria
Rita, e seus olhinhos buscavam a TV, acho que para entender de onde vinha
aquele sambinha. Não sei se ele vai lembrar-se de tudo isso, mas eu vou.
Essas recordações me fizeram voltar para a
minha história. Quando meus amigos criticam o gênero novela – eu não brigo com
quem não gosta ou se acha intelectualmente superior às tramas apresentadas –,
sempre respondo com uma brincadeira: “Não consigo fugir! Sou noveleiro de pai,
mãe, avó, tia, prima... Todo mundo lá em casa vê novela. Cada um está fazendo
uma coisa diferente, mas quando começa a novela das oito (pra mim vai ser
sempre das oito, mesmo que o horário
tenha mudado), o primeiro que escuta o ‘Boa noite’ do William Bonner grita ‘Vai
começar a novela’, e aí todo mundo corre para a sala e se amontoa no sofá, como
em Os Simpsons para assistir ao
capítulo do dia”. Realmente eu e minha irmã fomos educados na propaganda das
novelas das oito (porque durante o capítulo é proibido conversar, regra que eu
mesmo faço cumprir até hoje) e, para todos aqueles que dizem que a TV desagrega
a família, que as novelas só ensinam valores inadequados, digo-lhes que eu e
minha irmã somos pessoas de bem, com bons e firmes valores morais.
Quando eu era pequeno e tinha mais tempo, assistia a todas as novelas. Não sei se minha mãe me embalava enquanto assistia as tramas da época, ou se meu pai me fazia dormir com um olho em mim, e outro na TV. Motivos, seguramente, não lhes faltavam: em 1978, quando nasci, passava Maria Maria às seis, Te Contei? às sete, O Astro às oito e O Pulo do Gato às dez. À novela da Janete Clair, seguiu-se Dancin' Days. Eu cresci ouvindo meus pais – na verdade, meu pai sempre se mostrou mais noveleiro que minha mãe – falarem do Herculano Quintanilha e da Júlia de Souza Matos. Conclusão: se dei tanto trabalho nos primeiros meses quanto o meu sobrinho, roubei-lhes muitos capítulos das novelas das oito.
Quando eu era pequeno e tinha mais tempo, assistia a todas as novelas. Não sei se minha mãe me embalava enquanto assistia as tramas da época, ou se meu pai me fazia dormir com um olho em mim, e outro na TV. Motivos, seguramente, não lhes faltavam: em 1978, quando nasci, passava Maria Maria às seis, Te Contei? às sete, O Astro às oito e O Pulo do Gato às dez. À novela da Janete Clair, seguiu-se Dancin' Days. Eu cresci ouvindo meus pais – na verdade, meu pai sempre se mostrou mais noveleiro que minha mãe – falarem do Herculano Quintanilha e da Júlia de Souza Matos. Conclusão: se dei tanto trabalho nos primeiros meses quanto o meu sobrinho, roubei-lhes muitos capítulos das novelas das oito.
Mas as minhas primeiras lembranças de novelas
são de alguns anos mais tarde. Em 1983 eu pedi pra minha mãe me fazer um
sanduíche em forma de coração, porque eu queria comer igual àquele da abertura
de Pão Pão, Beijo Beijo. Engraçado
que minhas primeiras memórias das novelas de outros horários, são um ano mais
antigas: lembro da abertura de Elas por
Elas (1982), com aquela música gostosa que me fazia dançar, e de algumas
cenas esparsas de Sol de Verão
(1982), inclusive da notícia da morte do Jardel Filho e dos meus pais
comentando sobre “o que será que irão fazer para levar a novela até o fim?”.
Não entendo o funcionamento da minha memória,
pois nas novelas que seguiram a essas, em 1983 e 1984, inverteu-se a
intensidade de minhas recordações. Tenho recordações muito vívidas de Amor com Amor se Paga (1983): perguntei
para o meu pai se existiam mesmo “passagens secretas” e, como na casa de uma tia
minha, lá havia um relógio-cuco, toda vez que ele ia cantar a hora certa, eu e
meus primos corríamos para ver se alguma coisa iria acontecer.
Lembro bastantes
coisas também de Guerra dos sexos (1983),
principalmente dos quadros que se mexiam e do final – que dessa vez não foi ao
ar – da Veruska se transformando na Mulher Maravilha e, principalmente, da
última cena, quando ela e o marido da Renata Leoni cozinham num caldeirão do
inferno. No mesmo ano, quando no horário nobre passava Champagne, eu olhava a abertura, estarrecido, e pensava: “como um
piano pode voar?”, o que era uma pergunta estupidamente infantil, pois todas as
coisas “voavam” à voz do Ritchie, mas somente o piano me incomodava.
Penso que,
talvez, pela inventividade dos autores e por toques mais “surreais”, as novelas
das 18 e 19 horas tenham chamado mais a atenção da criança que eu era e, por
isso, ficaram mais gravadas na minha memória. Eu tinha um robozinho (colega do Falcon, um boneco que todo garoto queria
ter) que eu fingia ser o robô de Transas
e Caretas (1984) – diga-se de passagem, a Estrela pecou em não lançar esse brinquedo –; queria morar num
vagão de trem, como o Pardal de Livre
para Voar (1984); misturava, com água, pasta de dente, pedaços de sabonete
ou qualquer outra coisas que tivesse cheiro bom para criar o meu próprio Vereda Tropical (1984). Eu era uma
criança que brincava com as coisas
que via nas novelas. Às oito horas as tramas eram mais adultas, mas tenho
memórias também de Partido Alto (1984)
e Corpo a Corpo (1984). Resumindo:
meus pais nunca (o exagero é proposital. Óbvio que sendo criança eu brincava e estudava como as demais) me tiraram da frente da TV.
Hoje, quando olho para trás, muitas vezes
associo à novela que estava vendo, quando algo importante aconteceu em minha
vida. Às vezes não lembro em que ano foi, em que mês foi, mas o ritual “ver
novelas” é tão forte na minha família, em mim, na minha genética, que elas são
como “carimbos” na minha vida. Em 1985, quando entrei na primeira série,
passava A Gata Comeu, Tititi e Roque Santeiro. Mesmo sem ver as reprises que se sucederam, sempre
guardei muitos acontecimentos dessas novelas na memória: quis fazer com meus
amigos um clube semelhante ao Clube do
Curumim, queria comer carne de macaco, perguntei pra minha mãe se ela tinha
um batom Bokaloka, e lembro que ia
para a escola caminhando com alguns colegas de classe e comentando o capítulo
de Roque Santeiro, com direito a sacudir o pulso e perguntar de vez em quando:
“To certo ou to errado?”. 1985 é meu ano favorito, quando penso em novelas.
Quando estava passando a última semana de Barriga de Aluguel (1990), eu e outro
amigo batemos de casa em casa, prancheta em mãos, para perguntar a quem nos
atendia se preferia que o bebê ficasse com a Ana ou com a Clara; em 1991, esse
mesmo amigo fez 15 anos e nós organizamos uma festa Vamp: os convidados tinham que vestir somente preto e a decoração
não tinha nenhuma outra luz além de velas acesas; Renascer (1993) estreou um dia antes da minha primeira aula de
física no ensino médio (lembro disso porque um colega estava incomodando durante
a aula e o professor disse que iria pendurá-lo numa árvore e tirar-lhe a pele );
quando saí de casa e fui morar sozinho pela primeira vez, para fazer estágio do
meu curso técnico, todo mundo assistia a Anjo
Mau (1997); quando voltei a morar com a minha família, para começar a
faculdade, as discussões eram em torno da troca de bebês de Por Amor (1997); daí acabei a faculdade,
e nessa época O Clone (2001) era um
estrondoso sucesso. Paraíso Tropical e
Desejo Proibido (ambas de 2007)
tiravam o tempo que eu devia dedicar aos meus estudos do mestrado. Hoje eu saio
do trabalho às 23hs e corro para chegar em casa, torcendo para Saramandaia atrasar alguns minutos.
Não posso afirmar que depois de
crescido o meu sobrinho Vitor vai lembrar-se das primeiras novelas que viu. Não
sei nem se vai gostar de novelas, pois hoje a TV passa o dia no Discovery Kids (até Amor à Vida começar, obviamente). Mas, se ele gostar, acabará me dando
subsídios para duas teorias não-científicas que defendo: ver novelas não faz
mal a ninguém e, sim, o gosto e o hábito de acompanhá-las são geneticamente
partilhados na mesma família.
Parabéns, Rafael Montoito... por tudo que a tua memória registrou, pelas belas e lindas mensagens elogiando o gênero e, principalmente, por compartilhar com toda equipe este tipo de entretenimento... nunca houve a intenção de educar e sim de distrair... distraindo acabamos prestando a atenção no desenvolvimento humano perante a sociedade, conceitos, preconceitos, sensações, emoções, e, por conseguinte, acabamos assimilando e aprendendo formas e formas de comportamento... obrigado, você estimulou, com certeza, a feitura de tantas e tantas estórias... Mauro Gianfrancesco
ResponderExcluirParabéns pelo texti perfeito , Rafael ! Eu também costumo gravar bons momentos da vida com as tramas no ar da época !
ResponderExcluirBelo texto...Viajei no tempo com as suas memórias
ResponderExcluirO texto me comoveu porque eu concordo com a opinião do autor. Minha familia toda adora novela..e eu cresci vendo minha mãe comentar sobre. Me identifiquei com algumas coisas no texto. Minha filha tem sete anos e só não assiste porque eu não deixo. Mas ela se interessa e aprende o que pega nos comerciais. Aprendi muita coisa vendo novela e ainda aprendo. Acho uma delícia sentar no sofá ,se acomodar gostoso e esperar aquela história que a gente adora começar.
ResponderExcluirDany Frever
Lindo texto...chorei lendo ele, por ter passado várias lembranças na minha cabeça.....também sou noveleira assumida e essa herança recebi de minha mãe, q faleceu há quase 3 anos quando passava Passione, jamais vou esquecer...ela estava adorando a novela e só pode assistir aos dois primeiros meses dela. Bem, uma das primeiras novelas que me lembro é de Cuca Legal (1975), pois foi quando me tornei fã do Michael Jackson e sua One day in your life, que sou apaixonada até hoje, logo depois amei Estúpido Cupido (76/77) com suas músicas dos anos 60 de Cely Campelo. Essas foram novelas das 7, das 8 a primeira q me lembro bem, claro é Dancin Days (78) e com ela a moda da melissinha, das meias soquete e tantas outras modas q foram lançadas por novelas....mas a novela q mais me marcou foi uma das 6 hs q se chama Marina, lembro-me q tinha 13 anos e chorei demais quando essa novela terminou, novela com o meu inesquecível e amado Lauro Corona, lembro também que fiquei numa expectativa esperando essa novela reprisar e nunca foi...lá se vão 36 anos e se o canal Viva um dia reprisar tenho certeza que chorarei só de saber....rssssss.
ResponderExcluirSimone Ramos
Eu nasci em 1996, e a única novela que eu lembro, mas antiga, era algumas partes de "Torre de Babel". Quero te parebenizar pelo texto. Sua vida foi praticamente, dedicada as novelas. ^^ Repetindo: muito bom mesmo o texto. Parabéns
ResponderExcluirQUE TEXTO ESPETACULAR!! OTIMO VIAJEI ENGRACADO Q TENHO UMA HISTORIA QUASE PARECIDA COM A SUA O QUE ACONTECE E QUE SOU DE FAMILIA EVANGELICA DESDE CRIANCA MEUS PAIS NAO SAO RIGIDOS QUANTO A RELIGIAO MAS NUNCA FORAM FANS DE NOVELAS OU ACOMPANHARAM QUALKER OUTRA COISA A NAO SER JORNAIS ... A PERGUNTA E... DE QUEM EU HERDEI ESSA MANIA? SERIAM DAS BABAS QUE ME CUIDAVAM ? POIS DESDE DE MUITO CEDO ASSISTO NOVELAS E CURTO SUAS TRILHAS LEMBRO QUE ERA ASSIDUO EM TODAS DA MINHA INFANCIA TAMBEM CONCORDO O ANO DE 1985 FOI TOP OTIMAS NOVELAS CURTI MUITO ATE 1996 DEPOIS FUI FICANDO MAIS EXIGENTE E SELECIONADOR CONFESSO Q ALGUMAS NOVELAS PASSARAM POR MIM DESPERCEBIDAS COMO: GENTE FINA ARAPONGA SALOME O DONO DO MUNDO ESSAS NAO SEI EXPLICAR O QUE ACONTECEU POIS NAO LEMBRO DE NADA TALVEZ NAO TENHA VISTO POIS VIAJAVA MUITO MAIS GOSTARIA DE VER ALGUM DIA OUTRAS EU MESMO FIZ QUESTAO DE NAO ASSISTI-LAS COMO :CABOCLA REMAKE COMO UMA ONDA O PROFETA REMAKE NEM A ORIGINAL EU VI ETERNA MAGIA DESEJO PROIBIDO TRES IRMAS MAS EM FIM SOU ALUCINADO POR NOVELAS E TAMBEM ASSOCIO CQDA MOMENTO DE MINHA VIDA COMO UM PERSONAGEN ATE HOJE EU AINDA ME SINTO UM POUCO FLAMEL DE FERA FERIDA SONHO EM VOLTAR AO INTERIOR E MOSTRAR AS PESSOAS O QUE ELAS SAO RS RS RS ... HJ JA QUE TRABALHO DE MADRUGADA ME SINTO O PROFESSOR ARISTOBULO DE SARAMANDAIA REMAKE GOSTO MUITO DE NOVELAS... OBRIGADO PELO TEXTO
ResponderExcluirBOM SABER Q NO MUNDO EXISTEM PESSOAS QUE PENSAM DA MESMA FORMA Q EU ABRACOS