Por Eduardo Vieira
É chover no molhado dizer que os seriados americanos, erroneamente ainda chamados no geral por alguns desinformados de enlatados, justamente por serem dos Estados Unidos, estão num momento excelente.
Há seriados para todos os gostos. É bom diferenciá-los das minisséries, com começo, meio e fim e ainda dos sitcoms, os quais exibem como os seriados, temporadas, mas diferenciam-se desses por serem sempre em cenários mais marcados e como diz o nome, apresentar elementos da comédias de costumes, do modo de vida americano, ainda que um tanto esteriotipados, salvos algumas exceções, desde os geniais Mary- Tyler- Moore até o presente e popular Two and a half men.
Geralmente, os seriados sofrem com o fantasma da audiência: um seriado medíocre pode cair nas graças do público e perdurar por cinco ou mais temporadas, enquanto outros interessantes, dependendo da política da emissora que o transmite às vezes não passa de uma primeira.
Venho falar de um veiculado pelo canal HBO, que vem se mantendo pelo enorme prestígio e qualidade, pois foge, por conta de seu ritmo mais lento, da audiência de um House ou um Prison break, por exemplo, dois grandes sucessos (merecidos) da telinha.
É o caso de Mad Men, que ganhou um subtítulo desnecessário de “Inventando Verdades”, que acaba por reduzir a proposta do seriado. Esses homens do título, loucos ou mais propriamente a meu ver, “insanos”, são o motor da sociedade do pós guerra, nos anos 60, nos Estados Unidos, em que bens de consumo estão em uma crescente mudança assim como a sociedade que os consome.
O autor do seriado, Matthew Weiner, foi também responsável pela escrita de alguns episódios de A Família Soprano, e muito inteligentemente, traça um panorama social por meio dos adventos dos produtos que vêm suprir a carência de pessoas que se comunicam por meio de valores materiais, pois os morais são via de regra varridos para debaixo do tapete.
É curioso como os roteiristas conseguem construir dois textos: ao que estamos assistindo e aquele que está nas entrelinhas dos atos dos personagens que vivem suas vidas por meio de chavões, piadas misóginas e pela visão (até hoje atual) da população como uma massa ávida por ter. Aliás, ter significa ser, sem culpas em curto prazo.
No seriado, vemos a figura do personagem principal, Don Draper (Jon Hamm, ator que é a encarnação do papel), ele mesmo ironicamente, uma figura inventada, pois só nós sabemos de seu passado que ele prefere encobrir para ter uma vida perfeita com sua também perfeita esposa, Birdie, a linda atriz January Jones (nome que combina com a personagem pois aparentemente ela está sempre em órbita, tentando ser a mulher linda, zelosa mãe e esposa, mas lutando com algo que não sabemos o que é). Até que a ela é sugerida uma visita a um psicanalista, ideia também que deve que ser vendida, a fim de que as pessoas ao redor não pensem que só perturbados mentalmente procuram esse tipo de profissional, ou seja, entende-se que cada americano médio é o espelho do outro e ser diferente custa muitíssimo.
O galã, apesar do casamento aparentemente dos sonhos, trai a mulher com qualquer rabo de saia sem nenhuma aparente culpa. Há em todo o seriado um machismo e uma misoginia que são alternadas ao bel prazer dos homens da história, que exibem relações conflitantes entre o que são na essência e o que devem aparentar uns para os outros. (Na verdade, de lá para cá tal ponto não se alterou tanto assim, relativamente falando, é claro!)
Contudo, surge um personagem feminino que foge aos padrões da forma com que são concebidas as personagens ditas “respeitosas” da sociedade americana; pois, sim, vemos mulheres interessantíssimas, como por exemplo a amante do galã, que vive com artistas e sabe muito bem de sua condição feminina, porém estas acabam sendo marginalizadas pela sociedade organizada na época.
A tal personagem que consegue essa proeza é Peggy (Elizabeth Moss), secretária de Don, que mostra talentos extra burocráticos, pois às secretárias, cabe o papel único de serem graciosas, atenciosas, insinuantes, e serem chamadas por nomes pejorativos como sweetie, dear, candy, ou seja nomes genéricos que não dão a mínima identidade a essas mulheres. Peggy consegue submergir nesse mundo, pois ela entende que seus atributos não são a sensualidade nem tampouco o senso comum. Ela age por instinto, errando , deixando por vezes ser humilhada na condição de minoria, mas muitas vezes também acertando, e o inteligente e sobretudo prático Draper nota isso, pois ele não a enxerga absolutamente como uma mulher, mas como uma mulher que pensa, quase um homem, na visão estreita da época.
Dito assim pensa-se que se cai no clichê dos homens serem personagens tipos, esteriotipados, mas não; eles demonstram fraquezas, em diferentes situações, quando estão doentes, bêbados, ou seja, vulneráveis, muitas vezes dentro do seio familiar, contanto que o vizinho ou o colega do lado nunca possa vir a desconfiar. Cabe à mulher (mãe, amante ou esposa), tida como sexo frágil, silenciosamente dar as cartas desse jogo social.
É ótimo notarmos que não há aquela profusão de referências para nos lembrar que estamos na década de 60... elas aparecem normalmente no contexto dos episódios, há menções que vão desde filmes como Marty, Se meu apartamento falasse, canções que vão do popular até o cool jazz e livros coqueluches da época como o então polêmico O Amante de Lady Chatterley, o qual as secretárias leem de modo um tanto histérico.
Também é bem divertido notar para pessoas como eu que amam a indústria cultural, de onde vem o passado consumista e cultural que nos atrai até hoje. Pela mente desses homens e pela observação da sociedade, vemos surgir produtos, slogans e é inevitavelmente cômico com o olhar contemporâneo que temos hoje assistir a essas contínuas “invenções da roda” que perpassaram credos, sentimentos, opiniões políticas, tabus e outros elementos que acompanham a chamada evolução da sociedade, sociedade a qual a aparência era o elemento motor e a essência um simples adorno que fazia com que as pessoas pensassem ter sentimentos e as fizessem sempre comprar.
Fotos: Google Imagens
Vídeo: You Tube
Med Man é uma das melhores séries de TV que ja vi, reune grandes atores, personagens, musica, direçao de arte...e por ai vai, rsrs
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ResponderExcluirÉ uma pena que eu não tenha escolhido Mad Man prá acompanhar. Isso sempre foi um problema prá mim: existem tantas séries sendo exibidas e tantas estréias, que eu acabo escolhendo 3 ou 4 prá assistir e depois fico sabendo que deixei de lado uma coisa ótima como essa! Outra coisa que me desestimula é que as vezes uma série muito boa, como a falecida Carnivale, da qual eu era fã, sai do ar subitamente e me deixa órfã. É péssimo ter que ser refém do mau gosto alheio e isso me irrita profundamente. Sinceramente, suas considerações me deixaram com vontade de comprar os DVDs de todas as temporadas! Parabéns pela escolha do assunto! (e cacildis,esse Jon Hamm é muuuuito gato)
ResponderExcluirEsse show é demais, mesmo. Em cada detalhe. A princípio eu ficava bem irritada com o machismo dos personagens, mas aos poucos fui percebendo a perfeição com que recriaram a época e todo o sarcasmo com que retrataram as relações pessoais e os hábitos americanos da época. Quero mais e fico aguardando ansiosamente pela nova temporada - que aliás, já DEMOROU. :)
ResponderExcluirA série é impecável em todos os aspectos. Infelizmente, não fui "fisgado" pela trama e assisti apenas alguns episódios. O mesmo ocorreu com Boardwalk Empire e Dexter. Não encontrei nada para criticar em nenhuma dessas séries, mas elas simplesmente não me cativaram. Em compensação, me tornei dependente de outras imperfeitas, como True Blood e Fringe. Meu maior vício, no entanto, é a premiada série britânica Downton Abbey, que estréia em breve no canal Globosat HD. Viciante e impecável.
ResponderExcluirEu realmente não conheço o seriado. Já tinha ouvido falar vagamente. Mas vc falou tão bem que me deu até uma curiosidade em ver.
ResponderExcluirMuito legal mais essa dica de entretenimento. Valeu Eduardo!!!
Esta é uma das séries que muito me interessam da leva recente, e Eduardo merece os parabéns pelo texto que desperta tanto o interesse de quem não conhece a série quanto satisfaz aos que já a acompanham.
ResponderExcluirO Edu e suas dicas preciosas não podem faltar por aqui, pois aí está mais uma importante análise sobre uma série até então não "sabida" por mim.
ResponderExcluirValeu, meu caro, té os próximos posts!!!
"Mad Men" é demais. Vários seriados tentaram vir no vácuo dele -- "The Playboy Club", "Pan Am" -- mas nenhum vingou. Até porque nenhum desses tinha roteiristas tão brilhantes e subtextos tão cativantes quanto "Mad Men". Só um detalhe: ele não é da HBO, e sim da AMC. A HBO possui apenas os direitos para exibição internacional. Mas os caras da HBO não se conformam em ter tido suas ofertas esnobadas pelos produtores de "Mad Men". Tanto que gastaram um fortuna com "Boardwalk Empire" só para mostrar poder e tenmtar roubar alguns prêmios Emmy prometidos para "Mad Men"...
ResponderExcluirGrande Edu, ótimo texto, parabéns!
ResponderExcluirnunca soube mesmo Chico...quem sempre me falou dessa série foi o Alfredo e eu via sempre alguns episódios descontinuados, até que veio essa coisa maravilhosa chamada download...por meio do qual pude ver vários seriados...não sabia dos bastidores, Chico...só tu mesmo! kkkk Bom saber... tomara que sirva pra vcs gostarem mesmo, pessoa, porque é uma delícia de se ver!
ResponderExcluirNa sociedade das aparências, que o mundo dos publicitários cria sem o menor pudor, a série vai fundo nos temas polêmicos e no vazio daqueles personagens.
ResponderExcluirTexto esclarecedor e bastante oportuno pra mim, pois acabei de comprar o box da primeira temporada e agora já vou ter um norte a seguir. Estava acabando de acompanhar a terceira temporada de "Damages", série que sou absolutamente fascinado, e já assisti ao primeiro episódio de "Mad men" e realmente a atmosfera é exatamente essa que vc descreveu. Minhas expectativas são as melhores. Parabéns, Edu, pelo excelente texto.
ResponderExcluirÓtimo texto! Os seriados realmente fizeram (e fazem) uma revolução na minha vida. Explico: não tinha o hábito de acompanhar novelas - tirando aquelas em que tinham no elenco Natalia do Vale ou Claudia Abreu - porque nunca tive paciência para acompanhar dia após dia a trama por longos meses. O que curto nos seriados é justamente eles serem menores e mais objetivos. Mad Men ainda não vi, mas Dexter, Good Wife, Downton Abbey, Walking Dead, Six Feet Under, Brothers and Sisters, Weeds... pois é, virei um fanático por todas elas.
ResponderExcluirE eu não iria passar uma proposta incrível, eu sou um seguidor de Mad Men não vou perder por nada os últimos capítulos do 25 de abril de 2015. Vai ser maravilhoso ver seus últimos capítulos.
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