segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Um homem, duas mulheres: o clássico triângulo à la Nelson Rodrigues


Por FÁBIO COSTA

O último capítulo de Terras do Sem Fim, adaptação de três romances de Jorge Amado por Walter George Durst, foi ao ar no horário das 18h da Rede Globo no sábado, 27 de fevereiro de 1982, e para a segunda-feira, dia 1. de março, estava marcada a estreia de O Homem Proibido, outra adaptação literária dando prosseguimento à orientação da faixa das seis, desta vez com base numa obra de Nelson Rodrigues, assinada por ele com o pseudônimo Suzana Flag na década de 1950. No entanto, a Censura interveio e adiou a apresentação do primeiro capítulo da novela em um dia, preocupada com os rumos que poderia ter num horário tão assistido por crianças e jovens uma história baseada em Nelson Rodrigues e que trazia em seu elenco figuras frequentes nas chamadas pornochanchadas do cinema nacional, como David Cardoso e Alba Valéria. A solução encontrada pela emissora, além de garantir que a novela não ultrapassaria os limites determinados para as novelas das seis, foi reprisar um especial de fim de ano de Roberto Carlos. A estreia da novela ficou para o dia seguinte, terça, 2 de março.

Capa da trilha sonora nacional da novela.
Mas a novela nada tinha de mais, nada que o horário não permitisse. Uma simples história de amor, contada ao estilo dramalhão do adaptador Teixeira Filho - que assinara, entre outras, Ídolo de Pano (Tupi, 1974/75), Um Dia, o Amor (Tupi, 1975/76) e Ciranda de Pedra (Globo, 1981). As protagonistas eram duas primas, criadas como irmãs: Sônia (Elizabeth Savalla) e Joyce (Lídia Brondi). Uma ligação muito forte de amor une as duas jovens, e pela primeira vez a relação é ameaçada quando o médico Paulo Villani (David Cardoso), o "homem proibido" do título, se envolve com elas. Ele se apaixona por Sônia e esta por ele, mas Joyce encasqueta com o rapaz e decide conquistá-lo, ignorando o amor que Carlos (Edson Celulari), um rapaz de origem humilde, tem por ela.

Lilian Lemmertz, que viveu Flávia.
Joyce é sobrinha dos pais de Sônia, Dr. Dario Rodrigues (Leonardo Villar) e Flávia (Lilian Lemmertz), e foi criada por eles em razão da morte de sua mãe, Senhorinha Pereira Santiago (Mira Palheta), irmã de Flávia, e do desaparecimento de seu pai. Na juventude, Senhorinha e Flávia disputaram o amor de Dario e a segunda levara a melhor; agora, anos depois, Sônia e Joyce, oficialmente primas e irmãs na prática, repetem a história em relação a Paulo. Dario trabalha como advogado no escritório que herdou do pai. Simpático e íntegro, tende a defender os mais fracos e por isso perde clientes. Gosta muito da sobrinha, ao contrário de Flávia, que enxerga na menina uma nova versão de Senhorinha sem tirar nem pôr e por isso a trata com hostilidade. De família aristocrática e orgulhosa do luxo e da ostentação em que sempre vivera, Flávia procura reconquistar os clientes do escritório perdidos por Dario, e para tanto faz-se figura fácil em quaisquer eventos a que a sociedade carioca compareça.

David Cardoso, o "homem proibido" Paulo Villani.
Paulo, por sua vez, é filho de Antônio Villani (Castro Gonzaga) e Sulema (Cleyde Blota), que também são pais de Rogério (Marcelo Picchi). Conhece as duas primas quando tem de atender a um chamado em lugar de seu tio Valdir (José Augusto Branco), e desde o começo divide seu interesse entre as duas, sem que consiga decidir de qual delas gosta mais. Carlos, apaixonado por Joyce e frustrado a cada tentativa de conquistá-la, trabalha como bancário e é filho da costureira Cláudia (Aracy Cardoso) e de Getúlio (Milton Moraes), motorista dos Villani. Para conquistar Joyce, menina rica, ele decide esconder sua origem, mas ela se mostra cada vez mais interessada em Paulo, mostrando-se como vilã da história desde o princípio e chegando mesmo a passar-se por cega após sofrer um acidente de automóvel, apenas para afastar o médico de Sônia. Ou seja, para separar o casal e tirar a prima do caminho Joyce demonstra ser capaz de qualquer coisa. Uma trama paralela interessante envolvia Rogério e Arminda (Narjara Turetta), dividida entre o amor pelo rapaz e a vocação que acredita ter para ser freira.

Lídia Brondi em cena da abertura da novela.
O desenrolar da história revela que na verdade Paulo é filho de um irmão de Antônio, o mau caráter Alberto Villani (John Herbert), e de Amélia (Maria Pompeu), com quem Alberto vivera um romance no passado. Amélia é assassinada e Paulo é apontado como o principal suspeito do crime; Joyce, que a essa altura está se passando por cega, vê quem comete o crime, (Alberto), mas caso revele a verdade coloca em xeque sua própria posição. Outra surpresa é o aparecimento de Jocemar (Gilberto Martinho), o rancoroso pai de Joyce, que extorque dinheiro da família Rodrigues em nome da manutenção de seu silêncio acerca de assuntos do passado. Ao final, com Joyce deixando de fingir ser cega, a verdade sobre o passado dos Rodrigues colocado em pratos limpos e a opção de Paulo entre as primas, as duas jovens enfim fazem as pazes, resolvem as diferenças e se casam na mesma cerimônia: Sônia com Paulo e Joyce com Carlos, que enfim consegue conquistá-la.

Capa da revista Amiga com Elizabeth Savalla e David Cardoso ao final da novela.
Publicado pela primeira vez no jornal carioca Última Hora em 1951 em formato folhetim, o romance O Homem Proibido não dava sustentação a uma telenovela, que dura meses e exige diversos personagens e situações. Assim, Teixeira Filho desenvolveu outros personagens e tramas para "rechear" a história principal do triângulo amoroso entre as primas e o médico e a nebulosidade do passado de Flávia, Dario e Senhorinha. O personagem Carlos e seu núcleo são alguns exemplos de criações de Teixeira. Uma curiosidade é que a Rede Globo exibira outra novela com o mesmo título, mas sem nada mais a ver com esta, em 1967. A primeira O Homem Proibido tornou-se conhecida fora do Rio de Janeiro como Demian, o Justiceiro, e tinha como protagonistas Carlos Alberto e Yoná Magalhães. Passava-se na Índia e seu herói, Demian, era uma espécie de Zorro do Oriente. Uma das rocambolescas criações da cubana Glória Magadan. Outra curiosidade diz respeito ao tema de abertura, a bela "Queixa", de Caetano Veloso. No decorrer da novela a abertura passou a apresentar não mais a versão cantada pelo baiano, mas uma gravação instrumental em seu lugar.

O último dos 146 capítulos de O Homem Proibido foi ao ar em 20 de agosto de 1982. Dirigida por Gonzaga Blota, Reynaldo Boury e Ary Coslov e tendo em seu elenco ainda as presenças de Stepan Nercessian, Nelson Dantas, Ana Lúcia Torre, Monah Delacy, Sônia Regina, Nestor de Montemar, Cleston Teixeira, Alzira Andrade, Solange França e Rita de Cássia, entre outros, foi a última atração do horário na linha contínua de adaptações literárias adotada desde sua implantação em 1975. Se por acaso fosse revisitada hoje em dia, aproveitando-se o clima rodrigueano e o conflito que envolve as duas primas (e também a geração anterior da família), poderia resultar numa interessante minissérie, quem sabe.

2 comentários:

  1. nossa, Fábio, meus parabéns...eu vi a novela, mas só lembro de poucas coisas, a cegueira de Joyce, meu personagem predileto..não lembrava dos outros personagens, só do casal feito pelo Stepan Nercessian e a Alzira Rodrigues, ótimos os dois...

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    1. Esta novela teve grandes atuações como: Lídia Brondi,Elizabeth Savalla,Leonardo Villar,Mílton Moraes,Alzira Andrade, Castro Gonzaga e a inesquecível Líllian Lemmertz. O David Cardoso foi um bom galã. Abertura com música linda do Caetano. E o autor Teixeira Filho,depois da belíssima Ciranda de Pedra,nos presenteia com uma trama moderna e bem amarrada. Saudade dos bons tempos. Palmas para a novela O Homem Proibido. Palmas para o talento.

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