Por Isaac Abda e José Vitor Rack
José
Vitor Rack – Referências a Ionesco (A Cantora Careca),
Fellini, ao materialismo... “Máscaras” é claramente uma novela que retrata
fielmente seu autor. Isso foi plenamente consciente ou foi involuntário?
Lauro
Cesar Muniz – Quando
fiz as contas de quantos anos eu teria na próxima novela cheguei à conclusão de
que “Máscaras” seria a última. Tenho feito novelas de dois em dois anos na TV
Record, logo, ao terminar a que está atualmente no ar, eu teria 75 anos. Mais
dois seriam 77! Com meus 74 anos atuais já estou bastante desgastado logo no
início do trabalho, o que poderia acontecer aos 77?
Então resolvi fazer citações em
Máscaras das minhas paixões literárias, dos meus filmes cults, das peças
teatrais. De uma forma orgânica, ou seja, sem gratuidade. Por isso criei
algumas tramas e citei algumas obras primas como “E La Nave vá” de Fellini, “A
Cantora Careca” de Ionesco, “Quem tem medo de Virgínia Woolf” de Edward Albee,
“Profissão Repórter” de Antonioni, sempre de forma jocosa, distorcendo as bases
originais.
José
Vitor Rack – A verdadeira história de Nameless se cruza
com a de Otávio Benaro ou se trata de um encontro armado pelo destino mesmo?
Lauro
Cesar Muniz – Nada
é armado pelo destino nessa história. Trata-se claramente de um encontro
marcado com objetivos claros. Nameless (depois batizada como Eliza) por uma
organização internacional, tem uma clara missão de atravessar na vida de Martim
Salles, mas acaba, sem saber se ligando a Otávio Benaro, que assumiu a
identidade do cunhado Martim.
Isaac Abda – Há um mês sendo
exibida, além da audiência abaixo do esperado pela emissora, “Máscaras” tem
sofrido críticas pela ousadia/sofisticação do texto, que em determinados
momentos parece confuso, ao menos para alguns. Imagino que um autor experiente
saiba lidar com diferentes possibilidades de resposta do telespectador,
prevendo-as inclusive. Qual a sua análise sobre a novela? Acredita que o
produto esteja sendo injustiçado? De que modo você pretende alcançar também
esse público que ainda não “comprou” a proposta da novela?
Lauro Cesar Muniz – Muitas
vezes se confunde a palavra texto com diálogo. Texto é o conjunto da criação
escrita, com idéia, temas, estruturas, rubricas e até diálogos.
Eu
quis evitar fazer um diálogo plano que apenas levasse à ação dramática, então,
com todo o cuidado para não generalizar os temas, mas ligá-lo com clareza aos
personagens, me propus a discutir assuntos candentes do momento como ideologia,
religião (de forma cuidadosa), estética, sempre em função da vida dos
personagens. Nunca impondo regras ou fechando questões sobre qualquer tema. Uma
espécie de levantar a bola para discussão. Para isso eu precisaria ter atores e
atrizes com pleno domínio desses temas, o que não aconteceu. Quando um ator emite uma opinião sobre um
tema que desconhece parece uma frase descosida, um elemento estranho, sem vida,
decorado.
Eu
acho que me empolguei demais em criar uma trama policial cheia de mistérios e
cometi o grave erro de abrir esses mistérios sem fechá-los em pouco tempo. Isso
deu a sensação de trama sem clareza. No ar, a maioria das respostas está sendo
dada, mas talvez seja tarde. O público tem pressa. Como eu não tinha quando
escrevi – a novela ainda não estava no ar – eu perdi essa perspectiva. Foi o
erro mais grave que eu cometi.
Meus
diálogos são simples e realistas. Se, dão a alguns a impressão de serem
“literários” (no mau sentido) é porque a direção da novela se equivocou no tom,
dando aos atores certa solenidade. Por mais que eu alertasse, no início, não
obtive a atenção dos diretores, pois estavam envolvidos com uma gravação
dificílima em um navio. Ao voltar havia um atraso considerável e as reuniões
não sanaram este problema.
Não
me sinto injustiçado, não. Ao contrário me sinto “justiçado” – cometi um erro
grave e estou pagando por isso. É uma pena que eu tenha errado em minha última
novela. “Máscaras” vai para meu rol de equívocos como “Os Gigantes”. Eu gostaria de acordar desse pesadelo.
Isaac Abda – Se em ‘Poder
Paralelo’ sobraram críticas elogiosas à direção do Ignácio Coqueiro, o mesmo
não acontece com o seu atual trabalho na emissora. ‘Máscaras’ é sempre discutida
nas redes sociais, e há quem defenda a tese de que a novela é boa, mas mal
realizada. Certamente que você assistiu aos primeiros capítulos antes de a
novela estrear. E o que tem ido ao ar tá dentro do desejado por você? Caso haja
necessidade, existe a hipótese de mudança na direção geral da novela, tal qual
aconteceu em Cidadão Brasileiro?
Lauro Cesar Muniz – Eu
jamais mudaria o diretor de minha novela, como não fiz isso em “Cidadão
Brasileiro”. Corre uma idéia de que em “Cidadão” fui eu que troquei o diretor.
Engano. Fui o último a aceitar a idéia da troca. Admiti o clamor geral quando
não havia mais condições. O diretor estava sendo muito cobrado e reagia de
forma desequilibrada.
O
Ignácio Coqueiro, diretor de Máscaras, encontrou muitas dificuldades durante a
produção. Gravar no navio foi extremamente difícil. Na volta havia atrasos na
produção e ele nem teve tempo de reunir seus diretores para dar um tom bem
definido como qualquer novela exige. Até hoje não acertaram o passo e a cada
dia os problemas se agravam mais. A novela poderia ter tido muito mais tempo
para a preparação. Entreguei o projeto ainda em 2010.
Isaac Abda – Óbvio que sendo uma obra aberta, estando
apenas no início, tudo é passível de alterações. O que vem por aí em “Máscaras”?
Lauro Cesar Muniz – Estou
lutando mais para corrigir os muitos erros cometidos por mim, pela direção e
pela produção, do que olhar para o futuro próximo. Tenho uma boa trama e o
público, amante de policiais, vai seguir daqui para frente, desde que sejam
sanados todos os erros. É possível. Já perdi grandes sucessos que estavam em
minhas mãos e me surpreendi com novelas que começaram equivocadas e depois
encontraram seu caminho, até recordes de audiência. Minha carreira é longa e
seria exaustivo nomear exemplos aqui.
Foi
ótimo poder desabafar em um blog de boa qualidade como este.
Posso Contar Contigo? – Nós
nos sentimos honrados por tê-lo mais uma vez como entrevistado. Obrigado pela
deferência. Saiba que torcemos pela resolução de todos os problemas envolvendo ‘Máscaras’,
e que isto ocorra em tempo hábil.
Imagens: Portal R7.com
Tb torço por Máscaras...
ResponderExcluirTorço pelo sucesso do Mestre Lauro! Excelente entrevista. Parabéns!
ResponderExcluirAdorei a entrevista e os esclarecimentos do Lauro!
ResponderExcluirParabéns Lauro e equipe do Posso Contar Contigo!
O Lauro é admirável! Reconhece os erros, torço para q ele consiga corrigi-los. Parabéns ao blog, entrevista MARAVILHOSA.
ResponderExcluirmuito boa a entrevista! O Lauro esta seguro de si!!!!
ResponderExcluirA novela é excelente, pena que o público gosta de textos burrinhos - aqueles que pensam pelo público, tipo a mulher sofrida que deu a volta por cima ou de um homem que roubou a namorada do outro-
ResponderExcluirNo Brasil há poucos inteligentes!
nossa, que franqueza..acabou com os atores da novela, mas tem alguns que estão péssimos mesmo. Agora não entendi qto à trama realista...só se for a do sequestro, mas com essa incursão da klux klux klan achei meio patético.Uma pena, pois estava esperando uma grande novela, mas ainda vejo e acho que mudanças virão..quem sabe um terremoto ou algo parecido?
ResponderExcluirPARABÉNS ISAAC pela exclusividade do desabafo de Lauro César Muniz!
ResponderExcluirSHOW!
Nunca assisti nem um minuto da novela, mas pela entrevista percebe-se que o texto é uma pretenciosa colagem de referências cult que deixaram a direção da novela perdidinha da silva.
ResponderExcluirSó acho estranho que quem critique referências cult esteja com a foto de Clockwork Orange em seu avatar... No mínimo contraditório.
ExcluirAcompanhei alguns capítulos pelo Youtube, e percebi um cero arrasto nas cenas e o didatismo nas falas de algumas personagens ou na inflexão dos atores, porém a trama me chamou bastante a atenção, o clima policial, a mãe que supostamente teria tentado contra a vida do filho, a ama de leite que não está acima de qualquer suspeita (por hora, vi apenas três capítulos)...enfim. Lauro continua fiel ao seu estilo. Bem sabemos que uma novela não depende apenas de seu autor e que corrigir erros a medida que se escreve capítulos não é uma tarefa fácil. Mas como telespectador posso dizer que a trama é interessante, mas teve um começo dífícil... Essas teorias de conspiração, que constam no enredo, me lembram outra obra do autor, O Salvador da Pátria, que vim a realmente gostar à época de sua reprise, ou seja, ainda há tempo pra renascer uma nova novela.
ResponderExcluirAnálise mais do que coerente do LCM.
ResponderExcluirUma pena o Lauro se despedir dessa forma... com uma de suas piores obras.
ResponderExcluirAgora me surpreende a Record, que teve UM ano pra produzir de forma digna, fazer ás pressas a novela...
Parabéns pela entrevista!
Show de entrevista,
ResponderExcluirLauro é um grande autor, e parece estar sabendo lhe dar muito bem com as criticas e a baixa audiência da trama. O importante é ele reconhecer que errou, e tentar consertar da melhor forma possível esses erros. A novela tem uma proposta boa, e pelo que tenho lido, os conflitos estão muito bem armados e construídos, falta desenvolve-los da melhor maneira possível. Torço para que ele encerre sua carreira com um grande sucesso.
Parabéns pela entrevista.
Lauro é um autor inteligentíssimo, digno de todas as honras em razão da qualidade de seu texto e suas nada convencionais e sim vanguardistas novelas como O Casarão e Espelho Mágico.
ResponderExcluirMas não há texto excelente que se mostre interessante em telenovela quando uma direção por vezes amadora e inconsistente o transforma em cenas equivocadas. E esse, infelizmente, é o caso de Máscaras.
Parabéns à equipe do Posso Contar!
Entrevista excelente. O melhor é a capacidade do Lauro de reconhecer seus erros. Máscaras é uma boa novela, apesar dos equívocos. Torço pela sua guinada na audiência. Abraços!
ResponderExcluirValeu pela audiência e comentários, rapazes. Abraço!
ResponderExcluirDesde de quando esse senhor é humilde assim? será porque sua obra desce ladeira abaixo, pouco antes da estreia de sua novela, falou barbaridades contra o publico alvo, contra a Globo e João Emanuel Carneiro e agora se faz de vitima? Não nego q ele tenha feito obras maravilhosas, O Salvador da Pátria foi a melhor, mas não justifica ele se banhar da arrogância do veiculo que ele trabalha e seguir a cartilha da Record, humildade nunca fez mal a ninguém e pra mim não colou essa entrevista, me passa a imagem de tentativa de limpar o nome.
ResponderExcluirLauro não é arrogante, posso assegurar.
ExcluirFosse ele este grande autor, como se acha, é óbvio q a Globo jamais teria permitido sua saida de lá. Lauro tem um texto arrastado, chato mesmo. Tentei acompanhar Cidadão Brasileiro e achava um saco. Fora que a emissora que ele trabalha que se acha a BBC do Universo ainda é precária nos quesitos, iluminação, cenografia, figurinos... E ainda contam com um elenco risível, boa parte atores que faziam, salvo algumas raras exceções, coadjuvantes na Globo. A Record é o típico exemplo de que com dinheiro não se compra tudo.
ResponderExcluirUma vez alguém escreveu que o SBT era uma TV medíocre porque o negócio deles era vender carnê do Baú. Enquanto a Record ficar nessa obsessão angariada pelo seu presidente, o tal bispo, de se vingar da Globo ela ficará nessa categoria de TV medíocre também. Tivessem seguido o propósito de só simplesmente fazerem TELEVISÃO já teriam chegado a liderança.
Enquanto isso a Globo, com todos os seus defeitos, ainda continua nadando de braçada diante da incompetência das suas concorrentes.
Parabéns Isaac por esta bela entrevista com o Lauro Cesar Muniz.Ela repercutiu bastante entre os blogs como o do Mauricio Stycer do UOL através do link: http://mauriciostycer.blogosfera.uol.com.br/2012/05/19/lauro-cesar-muniz-ve-mascaras-como-equivoco-e-pesadelo/ .
ResponderExcluirUm abraço,
Obrigado pela sua audiência. Não sabia do texto do excelente jornalista Maurício Stycer, comentando a entrevista. Ótima dica, fico contente e agradecido por isso!
ExcluirOlá!
ResponderExcluirCheguei ao blog por meio do link disponibilizado pelo post do Mauricio Stycer. Gostei muito da entrevista! Acho o Lauro César Muniz um bom roteirista. "Poder Paralelo" foi a melhor novela que ele fez na Record e, na minha modesta opinião, da carreira dele.
O que falta em "Máscaras" é um colorido, um bom núcleo de humor, um núcleo com uma trama mais popular e uma organização da história principal. Assisti os três primeiros capítulos e achei tudo muito confuso, o público não tinha para quem torcer, não conseguia criar identificação. Não entendi como o Lauro e a direção da Record deixaram isso ir ao ar.
O primeiro capítulo não apresentou a novela, e sim uma das tramas principais que mais parecia de núcleo secundário. Lauro está sendo arrogante de querer pensar em mudar só depois do capítulo 40.
Na segunda semana ele já tinha que ter reunido todo o elenco e falar: vamos começar do zero. Janete Clair fez isso quando pegou uma novela para escrever que estava mal das pernas. O roteirista tem que está consciente que a novela também é do público, não pode apenas satisfazer o seu ego.
No mais, parabéns pela entrevista e pelo blog.
Abraços,
http://cafecomnoticias.blogspot.com
Torçamos para que ele encontre a tão desejada solução pros problemas da novela. Valeu pela visita, Wander!
ExcluirSou fã do Lauro Cesar Muniz! O que eu acho é que ele tem uma certa dificuldade em trabalhar com humor. E essa novela peca por isso. Suas outras obras tb foram assim. Cidadão Brasileiro foi excelente, adorei, principalmente a primeira fase. O meio, ele se perdeu. Mas se encontrou no final, mostrando brilhantemente a Guerrilha do Araguaia, aliás, escreveu uma das mais emocionantes cenas de novela, a morte da Eleni (Mayte Piragibe) com a brilhante interpretação de Luiza Tomé, segurando a filha morta nos braços! Mas Cidadão tb carecia de humor. Em Poder Paralelo, ele teve dificuldade em criar um núcleo popular, que era de uma pensão. Tanto foi, que pouco aparecia. Agora em Máscaras, ele tenta fazer humor com um casal esquisito (Barbara Bruno e Roberto Bontempo). Sinceramente, eu não entendi qual é a desse casal. E porisso não me faz rir. Acho eles chatos demais. E as Damas da Távola Redonda, não seria um aproveitamento de personagens de um projeto de novela que ele apresentou a Record a alguns anos atrás, que tinha o título de "AS LOBAS"? No mais,continuo aconpanhando a novela e espero que ela reverta a situação. Aliás, temos vários casos, como o de Bela, a Feia, que de 5 pontos no incio, fechou com 18. Parabéns pelo blog, que eu nao conhecia e parabens tb pela excelente entrevista. Abraços a vcs e ao Lauro Cesar.
ResponderExcluirNão gosto dos textos dele, mas ñ creio ser esse o motivo do desastre.
ResponderExcluirA produção é fraca, pra não dizer tosca.
Tudo é muito primitivo, amador.
É de uma disparidade assustadora.
O elenco até que é bom, mas tudo é meio perdido e anovela não tem nada que chame atenção.
Ao menos positivamente.
Nossa, que honra para este blog ter sido o escolhido para esse desabafo. E tirei o chapéu pro autor, pois é difícil vermos um novelista admitindo problemas em tramas que estão no ar.
ResponderExcluirParabéns, Isaac e José Vítor pela entrevista! Fantástica essa transparência do Lauro César. Difícil encontrar isso nos novelistas. Assumir dificuldades é tão nobre quando relembrar os sucessos. É uma prova de humildade, e de preocupação com o trabalho e com o público.
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