Por Daniel Pilotto
Eu sempre costumo questionar o que faz uma novela ser
sucesso ou não. Quase sempre as tramas obedecem a um molde pré-concebido que
possivelmente pode transformá-las em sucesso. Às vezes são romances
arrebatadores, vinganças do passado, vilões ambiciosos ou mocinhos que dão a
volta por cima, enfim, basicamente os mesmos temas desde que novela era apenas
um romance nas mãos de uma mocinha ingênua do século XVIII.
Mas e quando os autores olham além, mais precisamente para o
futuro e para as fronteiras que nós ainda não conhecemos? Quando resolvem
discutir em suas tramas o moderno mundo tecnológico ou a vida fora da Terra?
No Brasil, isto nunca resultou em boa audiência.
E o que será que faz com que o público brasileiro rejeite
sempre as novelas que utilizam a chamada “ficção científica” em suas tramas? Talvez
fosse necessário um estudo sociológico da alma do brasileiro, seus medos, seus
temores. Pois este mesmo povo é um dos maiores consumidores deste tipo de
história vinda do cinema americano, em filmes como E.T. O EXTRATERRESTRE,
INDEPENDENCE DAY, 2001 UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO, EU ROBÔ, O HOMEM BICENTENÁRIO,
BLADE RUNNER, as séries de tv ARQUIVO X, V-A BATALHA FINAL ou SUPER VICKY entre
outros.
Nas novelas, me parece que o buraco fica mais embaixo.
Em 1968, para aproveitar a repercussão da primeira viagem do
homem à lua, Ivani Ribeiro escreveu OS ESTRANHOS para a TV Excelsior. A trama
contava a história de alienígenas do planeta Gama Y-12 que vinham para a Terra
passar férias e ao chegar encontram um planeta envolvido em guerras e
conflitos. Pensando em ajudar os seres humanos eles travam contato com um
escritor, um papel inusitadamente interpretado pelo então jogador de futebol
Pelé. Entre os alienígenas estavam Cláudio Correa e Castro, Rosamaria Murtinho
e a namoradinha do Brasil, Regina Duarte.
Era muita modernidade junta, e a novela, apesar de bem feita
não conseguiu alcançar seus objetivos e nem tampouco os telespectadores.
Logo após, em 1971 a Globo ousava com a trama de Janete
Clair O HOMEM QUE DEVE MORRER. Ali vários assuntos polêmicos foram tratados, e
a história que aparentemente teria uma base mais mística sofreu bastante a
repressão da censura. O personagem de Tarcísio Meira que seria uma espécie de
novo Messias acabou sendo mesmo revelado no final como um extraterrestre. Neste
caso o tema foi bastante pertinente para explicar uma trama que teve diversas
mudanças em sua sinopse original.
E anos se passaram até que se pudesse falar novamente em
alienígenas na tv.
O autor Antonio Calmon parece ser um fã desta temática e já
a utilizou algumas vezes. Inicialmente de maneira discreta e descontraída em
ARMAÇÃO ILIMITADA (1986 a 1988) onde a personagem Ronalda Cristina (Catarina
Abdala) tinha uma filha com um alienígena, a engraçadinha Zeldinha.
Em 1988 Calmon, junto com Euclydes Marinho e Daniel Filho
elaboraram o seriado TARCÍSIO E GLÓRIA, onde a protagonista era Ava (Glória
Menezes) uma alienígena do planeta Aurora que vinha para a Terra em busca de
sêmen masculino para repovoar seu planeta. A série tinha diversos elementos
interessantes, pois além da temática extraterrestre discutia valores sociais e
a política praticada por aqui. Infelizmente a série também não cativou o
público, e num dos episódios Ava rompia com seu planeta arrancando um chip de
sua cabeça e se tornando um ser humano aparentemente normal. Tudo isto ao som
da deliciosa “Alô, Alô, Marciano” com Elis Regina.
Em 1989 ele abordou rapidamente o assunto em TOP MODEL com a
personagem Belatrix (Rita Lee) que voltava depois de anos para visitar seus filhos
a bordo de um disco voador. Tudo muito sutil, tudo num clima mais bem humorado
como era o tom da novela.
Em 2004 o autor voltou à tona com o tema em COMEÇAR DE NOVO.
Na trama a personagem Márcia Anita (Luma Costa) aparentemente era uma
alienígena que vinha para a ficctícia cidade de Ouro Negro com seus estranhos
pais. Para Pepê (Pedro Malta) uma das crianças do lugar ela aparecia sob sua
verdadeira identidade, uma princesa de um planeta distante, a bordo de sua nave
espacial. Os pais dela que se apresentavam na cidade como dois professores
amalucados, na realidade eram dois andróides. Mais uma vez o tema passava pelo
viés da comédia, dentro de uma trama com temática mais séria.
Entretanto numa das pesquisas feitas para discutir a
audiência da novela, este núcleo foi bastante criticado. Assim, a trama dos
alienígenas foi esquecida e Márcia Anita se transformou numa garota “normal” e
seus pais aos poucos foram sumindo da trama.
Outra novela a discutir a vida fora da Terra foi O AMOR ESTÁ
NO AR de 1997. Escrita por Alcides Nogueira a trama contava a história da
problemática Luísa (Natália Lage), uma jovem que vivia alguns conflitos com sua
família e que tinha uma obsessão por OVNIs. Em determinado momento da trama ela
é abduzida, aliás, o grande destaque da novela era justamente fazer com que o
público ficasse na dúvida, se realmente ela tinha sido levada por
extraterrestres ou se tinha apenas fugido de sua realidade.
Mais uma vez o público (desta vez, do horário das seis)
rejeitou o tema. Recordo que por grande parte da trama não se falou mais sobre
o assunto e as outras histórias foram ganhando destaque.
Outra temática complicada é a da vida artificial, ou se
preferirem robôs e andróides.
O público brasileiro tem uma resistência grande ao tema e
isto ficou evidente em 2011 numa das últimas novelas das sete, MORDE E ASSOPRA
de Walcyr Carrasco. E como se não bastasse ter um andróide interagindo com os
personagens a história ainda contava com a possibilidade da presença dos
extintos dinossauros.
Na trama Ícaro (Mateus Solano) desesperado com a morte de
sua esposa resolve ir até o Japão em busca de tecnologia necessária para a
criação de um andróide semelhante à sua mulher. É criada então Naomi (Flávia
Alessandra) um andróide que se comporta e age como um ser humano, gerando todos
os conflitos possíveis, inclusive com a audiência que rejeitou logo de cara a
temática. Quando os dinossauros apareceram, inicialmente nos sonhos da
paleontóloga, Júlia (Adriana Esteves) que passou a vida a acreditar que eles
ainda existiam, a crise se estabeleceu de vez. Rejeição estranha para um país
que deu tanta bilheteria a filmes como JURASSIC PARK.
O resultado desta mistura toda é que após os famosos grupos
de pesquisas e diversas reformulações, a história focou em outras tramas. A
Naomi verdadeira voltou e a robô foi desligada.
Aqui cabe um adendo, desligada, mas não esquecida. No final
ela volta, inclusive para resolver um assassinato da história. Ela e um mundo
subterrâneo repleto de dinossauros (sacada de mestre do autor que não desistiu
de sua idéia inicial, apenas a adiou), a novela já era sucesso e agora podia
tudo.
Em 2010 foi a vez do mega computador inteligente, Frank em
TEMPOS MODERNOS. São Paulo, um edifício está sendo inaugurado, nas entranhas de
sua construção um computador, um verdadeiro cérebro eletrônico comanda tudo, e
ainda tem tempo de ser um psicólogo e confidente de seu criador, Leal (Antonio
Fagundes).
E aí temos mais um ingrediente indigesto para o público: o
computador que fala!
Mais uma vez mudanças se fizeram necessárias. Depois de uma
crise no melhor estilo 2001 UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO a criatura voltou-se contra
o criador e aí então desligaram de vez o que incomodava, e as outras histórias
tiveram que ocupar a trama. Como a novela se baseava muito nisto, na
modernidade de nossos tempos, todo o resto ficou bastante comprometido e
confuso. Há quem diga que até a personagem Deodora (Grazzi Massafera) tinha a
possibilidade de vir a ser um andróide. Se foi verdade ou mentira, invenção de
algum maldoso sobre a interpretação da atriz, jamais saberemos.
Voltando mais no tempo, mais precisamente em 1984, o público
travou contato pela primeira vez com o mundo cibernético e com um robô na nossa
tv. Quem foi criança na época, como eu, deve também amar o simpático robozinho
Alcides da novela TRANSAS E CARETAS, e o impacto que ele causou nas telinhas.
Não que ele tivesse sido responsável pela falta de sucesso
da história, muito pelo contrário, acredito que ali ele tenha sido uma das
coisas mais interessantes apresentadas. E como não comprometia, era apenas um
elemento de criatividade, de humor, ficou até o final da novela. Tal e qual o
Zariguin da já citada MORDE E ASSOPRA. Robozinho engraçadinho pode!
Será que nesta época éramos menos críticos, ou aceitávamos
mais as inovações?
Enfim, não poderia acabar de discutir o tema sem lembrar de
uma produção que uniu tudo isto e muito mais. Uma novela (ou deveria chamar de
macrossérie?) que juntou dinossauros, andróides, extraterrestres e ainda por
cima toda a sorte de mutantes e monstros inimagináveis até mesmo para o cinema
americano.
De 2007 a 2009 a Record levou ao ar a trilogia CAMINHOS DO
CORAÇÃO/MUTANTES. Uma verdadeira saga pelo universo da ficção científica.
Descontando os exageros e a pouca sofisticação do texto do autor Tiago
Santiago, devemos considerar esta a maior obra sobre o gênero na televisão
brasileira. Neste caso a novela teve índices de audiência consideráveis,
oscilando entre o sucesso e o fracasso à medida que a ia sendo esticada.
Como podem ver o tema é controvertido. Ou o público não
curte ficção científica em terras brazucas ou então até agora não apareceu um
autor que soubesse trazer para as telinhas este tema tão fascinante.
Muito engraçado mesmo o mundo das telenovelas tão ficcional nunca dar certo quando fala desse assunto. Eu acredito que no cinema dá mais certo, principalmente no americano pois há melhores efeitos especiais desde sempre, desde um contatos imediatos até um minority report da vida.Não conhecia essa trama de Os Estranhos, mas sempre ouvi falar....devia ser engraçado, pois como no Jornadas nas estrelas o futuro tem cara dos anos 60...uma coisa Jetsons. Adorei o texto, gostoso, educativo, crónológico do jeitinho que eu amo....parabéns, querido....adoro podermos trocar figurinhas por aqui também!!! Klaatu Barada Nikto kkkk
ResponderExcluirKKKKKKK
ResponderExcluirAMEI teu comentário Edu!!!!!
Que bom que gosta dos meus textos, sabe como sou, meio Lauro Cesar Muniz, um memorialista!!!!! KKKK
Abração!!!!!!!!!!!!!!
Saudações. Em minha opinião, o que ocorre é o seguinte. A ficção científica no Brasil é abordada da maneira errada, Atores e autores, se empolgam exageradamente, fazendo com que o resultado final seja sul real. Forçado. As novelas de grande sucesso são aquelas que abordam nosso dia a dia, crenças, medos, temores, tabus... O trabalho é juntar tudo isso em uma boa trama.
ResponderExcluirValeu pelo comentário Valdragon!!! Concordo contigo, me parece que os americanos fazem isto com uma naturalidade que ainda não adquirimos, parece que nós mesmos não acreditamos no tema, por isto fica impossível passar uma verdade!!!!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluire teve também Olho no Olho né que apresentou uma trama sobrenatural e também não agradou a audiência...
ResponderExcluirVc não citou O sexo dos Anjos, novela em que Felipe Camargo e Bia Seild interpretava anjos. Eu amei a novela, mas o público nem tanto.
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