segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Arbitrário Folhetim - 7º capítulo

De Isaac Santos

Capítulo 7

Cena 1. Casa de Telma. Cozinha. Interior. Dia.

Telma está jantando. Para por um instante, temerosa.

Telma – Tomara aquele ebó mal despachado não apareça na vida da Clotilde nunca mais... A menina tá tão bem.

Cena 2. Cine Glória. Sala de Projeção. Interior. Noite.

Alexandro aproveita cada momento para sentir Clotilde mais de perto. Ela está tão fascinada pelo filme que não se incomoda. Aos poucos vai cedendo... Ele lhe rouba um beijo tímido.

Clotilde – Assim eu vou perder o restante do filme, Alexandro.
Alexandro – Eu não resisto aos seus lábios.

Cena 3. Casa Branca do Engenho Velho. Templo. Interior. Noite.      

Comemoração de 1 ano de feitura (nascimento no santo) de um Yawo. Cantigas invocam os orixás. Olga, num canto, assustada, tentando disfarçar o seu estranhamento ao ritual, enquanto Davi, ogã, fica como um dos alabês responsáveis pelo som dos atabaques.   

Cena 4. Rua Chile. Exterior. Noite.

Alexandro e Clotilde passeiam por ali. Ela admirando as vitrines das lojas. Ele ansioso por outro beijo.

Clotilde – Eu nunca tive uma noite tão agradável.
Alexandro – Eu tô começando a gostar muito de você, Clotilde.

Clotilde para de andar e fixa o olhar em Alexandro

Cena 5. Casa Branca do Engenho Velho. Templo. Interior. Noite.

Orixás manifestados. Alguns Iaôs já em transe. Olga começa a se interessar.

Cena 6. Rua Chile. Exterior. Noite.

Alexandro (olhos nos olhos de Clotilde) – Falei alguma besteira?

Clotilde continua muda, mas abre um sorriso de menina sapeca e beija Alexandro com paixão. Vai passando por ali uma mulher de aparência descuidada, desequilibrada, mas inofensiva. Ela se veste de roxo da cabeça aos pés, num traje que lembra paramentos de freira, e um cordão no pescoço pendurando um grande crucifixo prateado.

Mulher de Roxo – Tá certo isso? (e segue andando, admirando as vitrines)

Alexandro e Clotilde interrompem o beijo por um riso involuntário.

Cena 7. Casa de Davi Valério. Banheiro de Olga. Interior. Noite.

Olga lavando o rosto na pia, pára, se olha no espelho.

Olga – O que é que tá acontecendo com você, mocinha? (começa a chorar)

Cena 8. Casa de Telma. Cozinha. Interior. Noite.

Clotilde vindo do banheiro, coloca a janta pra esquentar e se senta. Entra Telma, vestida de pijama. 

Telma – (puxa uma cadeira e se senta) Me conte...
Clotilde – Ah, Telma! (suspiro apaixonado)

Cena 9. Casa de Telma. Banheiro. Interior. Noite.

Clotilde escovando os dentes. Telma em pé na porta. 

Telma – Adorando saber que tá tudo se encaminhando bem. Mas eu tenho uma coisa chata pra te contar...

Cena 10. Casa de Telma. Quarto de Clotilde. Interior. Noite.

Clotilde preparando a cama pra dormir.

Clotilde – Ela também te viu?
Telma – Não. Eu dei um jeito de me esconder.

Cena 11. Casa de Davi Valério. Quarto de Davi. Interior. Noite.

Davi está preparando a cama para dormir. Olga entra.

Olga – Davi, posso dormir aqui contigo?
Davi – Ainda tá com medo é? (ela diz que sim) Claro que pode, sua boba. 

Cena 12. Casa de Telma. Quarto de Clotilde. Interior. Noite.

Telma – Eu não devia ter te contado. 
Clotilde (interrompendo) – Sem problema. Desejo apenas que ela também esteja bem. 
Telma – Já imaginou se essa menina aparece justo agora que as coisas estão se arrumando? Às vezes a vida apronta dessas com a gente... 

Fusão para

Cena 13. Antiga Casa de Telma. Sala. Interior. Noite.

Flashback

Carlos (43), branco, alto, garboso, está sentado no sofá, escutando a resenha esportiva no rádio. Telma está com 24 anos, grávida de Cristina. Ela entra, serve um cafezinho ao marido e se senta ao lado dele.

Carlos – Meu atlético mineiro tá bem, amor... acho que ganha esse campeonato.
Telma (sorrindo) – Tu ainda tá com o pensamento de daqui a uns anos a gente ir morar lá em Minas?
Carlos – Eu amo minha terrinha, mas por enquanto ainda não dá...
Telma – Por causa do velho Antero, né?
Carlos – Já que você tocou no assunto... O velho pediu que pra eu dar um salto em Nova Iorque, resolver umas pendências, uns negócios dele... 
Telma – E quando é isso?
Carlos – Início do mês...
Telma (contrariada) – E eu sou a última a saber... Só espero que você já tenha voltado na hora do parto.
Carlos – Claro, amor...  

Cena 14. Fazenda Princesa do Sertão. Casarão. Sala principal. Interior. Dia.

Todos chocados. Neuza (60), senhora amável, delicada, é consolada por Antero, seu marido. A criada serve chá aos dois. O chofer chega com Telma, que entra desesperada.

Telma (chorando) – Eu quero meu marido... Eu quero meu marido, ouviram bem?!
Neuza – Nós sabemos da sua dor, Telma... Nossa filha, nosso neto e nosso genro também estavam vindo no mesmo voo. (choro angustiante)
Antero – Essa dor também é nossa.

Neuza abraça Antero com todas as forças. A criada tenta acalmar Telma. Clima de mal estar, tristeza absoluta.

Cena 15. Antiga Casa de Telma. Sala. Interior. Dia.

Antero e Neuza estão sentados no sofá. Telma serve suco. Estão em conversa avançada.

Neuza – Por isso que meu marido e eu resolvemos te buscar pra passar uns tempos lá na fazenda. 
Antero – Você é nova, já viúva e com uma criança de colo...
Telma (chorando) – Às vezes eu olho pra ela, tão inocente, tão pequenininha... Isso tudo acabou comigo.

Fim do flashback

Cena 16. Casa de Telma. Quarto de Clotilde. Interior. Noite.

Telma – Morei lá quase 2 anos. Depois comecei a abusar da rotina. Mas eu nunca ia poder dar aquela vida pra minha filha. Os velhos gostavam muito dela. Eu resolvi voltar e deixei a Cristina com eles. O velho comprou essa casa pra mim. Dona Neuza morreu 1 ano depois que eu deixei a fazenda. 

Cena 17. Rua. Exterior. Dia.

Amanheceu. Leiteiro passa de bicicleta por ali, buzinando.

Cena 18. Casa de Davi Valério. Quarto de Davi. Interior. Dia.

Davi ainda está dormindo. Olga entra. Ela está vestida pra sair.

Olga (fala baixinho, cutucando) – Davi, (ele desperta) deixei café pronto, leite fresquinho, fiz cuscuz...
Davi – Pode falar normal, já me acordou, né fofura? (pega um cigarro na mesinha de cabeceira e acende) E se fez cuscuz vou levantar logo porque detesto comer cuscuz requentado. 

Cena 19. Pousada Em Família. Exterior. Dia.

Olga, frustrada, com olhar fixo na placa que anuncia a venda do imóvel.

Cena 20. Casa de Davi Valério. Cozinha. Interior. Dia.

Davi está preparando o almoço. Olga está sentada. Conversa adiantada.

Olga – Parece de propósito, sabe? Dói muito aqui dentro. E se eu nunca mais encontrar com ela? 
Davi – Minha amiga, se ajeite comigo e dê graças a Deus.
Olga (não consegue segurar o riso)  Só tu mesmo pra me fazer rir...
Davi – Vai tomar um banho geladinho. Depois do almoço a gente vai lá na casa daquela minha amiga.
Olga – Nem me lembra disso...
Davi – Antes a gente dá uma passadinha lá na Rua Chile. Eu tenho que ver o Alexandro. 

Cena 21. Fazenda Princesa do Sertão. Casarão. Exterior. Dia.

Antero (para os criados) – Atenção em tudo aí, ouviram? (para Cristina) Trate de se alimentar direitinho, mocinha. E nada de ficar só trancafiada no quarto. Chame a Dora e vá dar um passeio pela fazenda. (para a criada) Certo, Dora?
Criada – Pode ficar tranquilo.
Cristina (abraçando Antero) – Vai com Deus, padrinho. Diz pra minha mãe que to morrendo de saudade.
Antero (para Augusto) – Vamos? (Augusto abre a porta do carro para Antero)

Cena 22. Hotel Palace. Antessala da Gerência. Interior. Dia.

Sofás ocupados por algumas mulheres. Telma e Clotilde estão em pé. A secretária abre a porta da gerência, uma mulher sai e outra é chamada. Telma aproveita e se aproxima da secretária.

Telma – Ele sabe que a gente tá aqui?
Secretária – Daqui a pouco ele vai falar com vocês. 
Telma – Obrigada. 

Telma volta pra perto de Clotilde e cochicha.

Telma – Devem estar concorrendo pra vaga de camareira, né?
Clotilde – Mas tem umas bem abusadas. Repara naquela da esquerda... que blusa mais chamativa.
Telma – Tu acha que ele faz questão de conversar com todas elas por quê?
Clotilde – Ai que maldade, Telma!

Cena 23. Rua Chile. Loja Duas Américas. Exterior. Dia.

Olga e Davi caminham pelo passeio e param na frente da loja Duas Américas.

Davi (apontando pra dentro da loja) – Tá vendo lá a escada rolante? Vai lá conhecer como funciona. Eu vou dar um pulinho ali no hotel.
Olga – E eu não posso ir junto?

Cena 24. Hotel Palace. Antessala da Gerência. Interior. Dia.

A porta da gerência se abre, sai mais uma entrevistada. A secretária chama Clotilde e Telma para entrar. Davi chega.

Davi – Boa tarde! O Alexandro está?
Secretária – Ó, ele tá um tanto ocupado agora. Tá vendo essas moças? (Davi olha discretamente) Estão sendo entrevistadas por ele.
Davi (interessado) – Não sabia que estavam com vagas...
Secretária – Uma única vaga pra camareira. 
Davi – Vou dar um pulinho ali e já volto. 

Davi sai apressado.

Cena 25. Rua Chile. Hotel Palace. Exterior. Dia.

Augusto para o luxuoso Sedan-53 na entrada do hotel, desce e abre a porta do carro pro seu patrão. Davi vai saindo do saguão, vê Antero, hesita, mas decide cumprimentá-lo. Um mensageiro se encarrega da única bagagem de Antero. Augusto continua por ali, sem demonstrar interesse pela conversa.

Davi – O senhor por aqui?
Antero – Pois não?! (com frieza) Desculpe a franqueza, mas não me recordo de onde possamos nos conhecer?
Davi – Faz muito tempo que não nos falamos. (dissimulado) Eu sou o Davi, filho do saudoso Germano Ferreira Bastos. O senhor chamava ele de mano.
Antero – Sim, lembro sim. Seu pai era um amigão meu. Eu fiquei muito sentido na época de seu falecimento. 
Augusto (interrompendo) – Com licença! (se aproxima de Antero) O senhor ainda vai precisar de mim por aqui?
Antero – (para Davi) Só um minuto. (para Augusto) Não. Caso o carro precise ficar lá por mais tempo, você liga na recepção do hotel. Mas não deixe de ligar.

Cena 26. Loja Duas Américas. Interior. Dia.

Passada a empolgação com a escada rolante.

Olga – Mas que demora do Davi... 

Cena 27. Loja Duas Américas. Exterior. Dia.

Olga sai da loja, avista Davi conversando com Antero, e Augusto entrando no carro e partindo. Ela começa a se sentir mal.

Olga – Mas não é possível... meu Deus, não é possível!

Olga está desnorteada. Davi olha pro lado, percebe que Olga está estranha, andando lentamente, quase paralisada, sem se dar conta de que está no meio da rua. Um carro se aproxima em alta velocidade. O motorista, afobado, prevê o inevitável. As pessoas param, atônitas. Algumas gritam.

Antero (se esforçando pra ser ouvido) – Para o carro, parem esse carro.
Davi (desesperadamente) – Olga! (corre para tentar salvá-la)

Olga se assusta. Olga é atropelada.  

Corta para

Fim do 7º capítulo.

Confira o 8º capítulo aqui.

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2 comentários:

  1. Como diria um conhecido telenovelista:"Agora é que deu-se a melódia!"

    Adorei o capítulo. Recheado com romance,sedução,mistério...amei a fala do Davi: "minha filha, se ajeite comigo e dê graças a Deus."

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    Respostas
    1. kkkk advinha de onde surgiu essa fala do Davi?

      Valeu, moço!

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