Por Isaac Santos
Assisti
a exibição original da novela Felicidade quando ainda era criança, e atualmente
acompanho com assiduidade os capítulos reprisados pelo Canal Viva. Em
Felicidade, dentre os tantos personagens “humanos”, tão característicos das
obras do Manoel Carlos, destaco a Ametista, vivido com tamanha propriedade pela
saudosa Ariclê Perez.
Ariclê
era dona de uma das atuações mais sensíveis da teledramaturgia brasileira. Emanava
vivacidade em tudo a que se propunha fazer. O que para mim pareceu totalmente
contraditório à notícia de sua morte. Tão chocante, lamentável, deprimente, como
costuma ser quando pessoas queridas nos deixam de modo tão prematuro, obscuro. Em
setembro próximo, ela faria 70 anos.
Sendo
mais artista e menos [ou em nada se caracterizando] celebridade, no sentido
banalizado da palavra, pouco se falava da vida pessoal da atriz. Portanto
qualquer observação sobre o perfil real da Ariclê seria inapropriada. Ficaram
as tantas suposições sobre o que teria de fato acontecido, motivações, enfim. Embora
tais posicionamentos dos familiares, amigos e colegas mais próximos dela, sejam
absolutamente compreensíveis, o que há de concreto a ser considerado é a falta,
o vazio deixado pela mesma. Mas aqui não quero falar de seu trágico falecimento, e
sim reverenciar todo o seu talento.
Talento
pode ser aperfeiçoado, mas o dom nasce com a pessoa. Ariclê tinha uma presença
marcante quando atuava. Poucas atrizes têm a postura cênica que lhe era peculiar.
Cresci pensando que ela tinha formação em balé, mas não, a sua base vinha mesmo
do teatro. Era atriz... Verdadeiramente atriz.
com Bibi Ferreira e Flávio Rangel |
Foi
casada com Flávio Rangel, diretor de teatro, e também falecido. Este a dirigiu
em muitos espetáculos teatrais ao longo de uma trajetória iniciada em 1967. E
embora a carreira televisiva da atriz tenha mesmo deslanchado a partir de sua
participação na novela Meu Bem Meu Mal [1990], há quase 40 anos que ela estreou
na telinha, na novela Canção para Isabel,
exibida pela extinta TV Tupi de São Paulo. Na mesma emissora participou também da novela
Como Salvar meu Casamento [1979], que teve a sua exibição interrompida pelo
fechamento do departamento de teledramaturgia do canal, que já dava sinais de
falência. Vale ressaltar que esta novela [estréia do jovem/inexperiente Carlos
Lombardi como autor de telenovelas] alcançava bons índices de audiência,
chegando a liderar em São Paulo.
Em
1989, na Globo, integrou o elenco da minissérie Sampa, de autoria do também saudoso Gianfrancesco Guarniere.
Foi
pro SBT, onde fez Cortina de
Vidro. Novela de autoria do Walcyr Carrasco, com grande elenco.
Mas
voltou pra Globo logo em seguida, em 1990, pra interpretar a Rosa Maria/Maria Helena, numa trama [uma
de minhas novelas favoritas do horário das oito, Meu Bem Meu Mal] irreverente do memorável Cassiano Gabus Mendes,
com colaboração de Maria Adelaide Amaral entre outros.
Não
parou por aí, emendou noutra novela, e nesta parecia viver o ápice de sua
carreira. Manoel Carlos lhe confiou a complexa personagem Ametista. Drama
humano dos bons. Super vale a pena acompanhá-lo na novela Felicidade [1991]. Confesso que em alguns momentos me sinto amargurado
como se houvesse na Ametista um
pouco da Ariclê da vida real. Ora, mas se nem conheço detalhes de sua vida fora
da telinha, acredito que seja sob uma ótica influenciada pelo trágico desfecho da
atriz.
Na
década de 90 fez duas minisséries, a polêmica Decadência, de Dias Gomes, e Memorial
de Maria Moura, de Carlos Gerbase e Jorge Furtado.
Habituada
aos tons extremamente dramáticos de suas personagens, Ariclê surpreendeu
positivamente na bem humorada Salsa e
Merengue [1996], novela de Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa. Como
bem define o Julinho Martins: “a Gilda
da Ariclê fazia “escada” pras cenas sérias da personagem da Cristiana Oliveira
e também pras cenas cômicas da personagem da Laura Cardoso.”
Em
sua última novela [Anjo Mau, 1997],
ratificando a bem sucedida parceria com Maria Adelaide Amaral, Ariclê interpretou
a classuda Elisinha Jordão.
Óbvio
que não apenas por ser queridinha da Maria Adelaide, mas Ariclê foi uma das atrizes
mais atuantes em produções da autora. Esteve em Os Maias [2001], quando interpretou a Maria da Gama.
Foi
a Madre Cecília da Purificação em A Casa das Sete Mulheres [2003]
Soberba
como a Madame Claire em Um Só Coração [2004]
E em
seu último trabalho, fez a personagem Júlia
Kubitschek, mãe de Juscelino, na minissérie JK [2006], que por uma infeliz coincidência morre no último capítulo.
Não podemos
contar com a grandiosidade da Ariclê Perez em novos trabalhos, já não temos a
sua presença entre nós, mas a sua contribuição à dramaturgia nos basta como lembrança
viva.
Ariclê sofria de depressão e segundo laudo pericial, suicidou. |
Grande atriz,tinha porte na vida e nos papéis que fazia...
ResponderExcluirBonito texto Isaac!
bom te ver por aqui, Rodrigo... volte outras vezes!
ExcluirPensei que a conhecia, pelo menos, um pouco... diante do ocorrido, percebemos, todos nós, que era bem pouco ou nada... o que tínhamos de certeza, era a dimensão enorme e contagiante de seu talento de atriz... este sim era infindável... o senso profissional, impecável... isto a define como uma atriz com a maiúsculo e a ela rendemos glórias...
ResponderExcluirMeu caro Isaac Abda, que belo texto... você abordou com toda a sutileza e sensibilidade os traços marcantes da querida Ariclê Perez!
Mauro Gianfrancesco
obrigado pelas palavras, Mauro. Volte mais vezes!
ExcluirExcelente post, Isaac Abda. Sabes que yo también pensaba que había sido bailarina, maravillosa actriz?!
ResponderExcluirIsa Muñoz-Nájar
Obrigado pela leitura, Isa. Quero vê-la mais vezes por aqui.
ExcluirAdorando revê-la em Felicidade
ResponderExcluirAna Paula Aquino
somos dois, Ana Paula. Bom te ver por aqui. Venha mais vezes
ExcluirPARABÉNS PELA MATÉRIA DE ARICLÉ PEREZ, UMA GRANDIOSA ATRIZ QUE DEIXOU SAUDADES E VALE A PENA LEMBRAR...
ResponderExcluirDANIEL POZZI
Daniel, querido, bom vê-lo aqui. Venha mais vezes!
ExcluirEla era o supra-sumo da classe e elegância,não freqüentava muito o meio das atrizes,mas era querida na high-society tanto paulista quanto carioca,grande perda ...
ResponderExcluirAssistindo pelo globo play a novela felicidade. Que trabalho maravilhoso. Atriz fantástica.
ResponderExcluirEstou revendo Felicidade e fiquei impressionada com algumas cenas em que ela está deprimida e os outros atores: Helena e Ataxerxes estão preocupados com medo da Ametista se suicidar. Acho que ela vivia seus personagens muito profundamente. Era uma atriz maravilhosa.
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